ENTREVISTAS
Lee Ranaldo
Se um dia entramos no elevador e lá encontramos Lee Ranaldo...
· 27 Set 2003 · 08:00 ·
Um dos pratos fortes da bienal Experimenta Design 2003 consistiu na presença de Lee Ranaldo, co-fundador dos Sonic Youth, para uma sessão especial enquadrada no ciclo Designmatography. Ranaldo complementou a exibição de algumas películas representantes do cinema experimental norte-americano, extraindo da sua guitarra a redoma perfeita para o pleno desfrutar de cada filme.
Nem todas as entrevistas são planeadas, antecipadas, estudadas. Às vezes a hipótese cai-nos nas mãos, e a última coisa que faríamos ao encontrar Lee Ranaldo, acabado de levantar as malas no aeroporto e de despejar as tralhas no hotel, seria enjeitar a oportunidade de, informalmente, trocar algumas palavras com ele.
Consegues dizer quantas vezes já estiveste em Portugal?

[pausa para pensar]...seis? Acho que foram seis. Se não me engano, a primeira foi em 1993... No ano passado actuei na Gulbenkian, e em... Serralves.

Isso foi suficiente para conhecer alguma coisa? Lisboa, pelo menos?

Desta vez estou cá para uma passagem muito breve. Mas sim, desde que cá cheguei já me deparei com algumas coisas familiares, que recordo de estadias anteriores. No ano passado estive cá com a minha esposa. Gosto muito de Lisboa; embora não conheça com profundidade tenho uma impressão muito, muito positiva. É muito agradável.

Lembras-te do concerto deste ano, dos Sonic Youth, cá em Lisboa? Foi brilhante, e toda a gente que lá esteve diz o mesmo.

Sim!! Viémos à Europa para apenas dois concertos, Barcelona e Lisboa. Foi mesmo fantástico, uma daquelas noites em que, simplesmente, tudo corre bem. Sentimos logo que isso tinha acontecido, estávamos com tanto entusiasmo e desfrutámos tanto que o resultado acabou por reflectir isso mesmo. É incrível como, depois de quinze ou vinte anos a tocarmos juntos, continua a acontecer esse tipo de... celebrações! É muito gratificante. Além do mais, o espaço era belíssimo...

Que estão a fazer os Sonic Youth, neste momento?

Estamos a trabalhar no próximo álbum...

Esta pergunta era quase desnecessária, ou não fossem os Sonic Youth uma das mais prolíficas bandas rock...

[risos]...bem, é verdade... um álbum em cada ano e meio/dois anos, tem sido esse o nosso ritmo. E vai manter-se, pois o álbum estará pronto antes do próximo Verão. À parte disso, todos nós temos os nossos projectos pessoais e raramente estamos parados. Digamos que trinta por cento daquilo que cada um de nós faz é para os Sonic Youth.

Depois de Murray Street, que tipo de disco é legítimo esperar?

É claro que o próximo disco não será uma cópia do Murray Street, mas não será uma coisa drasticamente diferente, até porque não seria ao fim de tanto tempo que definiríamos a nossa personalidade, o nosso som.

Tenho a impressão que o Murray Street acabou por ser um pouco subvalorizado por alguma crítica. Como se cada álbum vosso posterior a 1992 fosse um parente pobre de clássicos como Sister, Daydream Nation... Alguma vez tiveste esta impressão?

O Murray Street teve uma aceitação globalmente muito positiva, parece-me. Agora, acho que acaba por ser normal que as pessoas permaneçam um pouco “agarradas” aos álbuns que referiste... Já são muitos álbuns, muitos anos, e é natural que certo momento e certo disco prendam a preferência de cada pessoa.

O Murray Street é, decididamente, um dos meus preferidos. Parece-me um disco sólido e uno como há muito não conseguiam fazer...

Hmm... Sim, concordo.

E o Jim O’Rourke terá algo a ver com isso, não?

Claro, a partir do momento em que ele passa a ser, plenamente, um membro do grupo, aquilo que nós fazemos tem o dedo dele. Tem uma parte dele, tal como tem uma parte de todos os outros. Penso, essencialmente, que o disco é o fruto de um bom trabalho, de um trabalho unido e inspirado.

E o Lee Ranaldo, individualmente, tem-se dedicado a quê?

Neste momento tenho um livro de poesia prestes a ser lançado... Tenho trabalhado com de tudo um pouco, tentando explorar o máximo possível várias vertentes distintas e compatibilizando-as, mesclando-as em algo concreto. Música, escultura, vídeo... [pausa] Ah! E tenho jogado ténis! [risos]

As actuações acabam por transparecer essa tua vertente exploradora? Ou seja, todas essas ocupações têm uma correspondência directa naquilo que fazes em palco?

Sim, acontece. Também no que toca às actuações, não existe um padrão fixo e estabelecido... ou melhor, existem vários. Spoken word... improvisação... por exemplo, naquela ocasião em que estive na Gulbenkian toquei com o Rafael Toral. A minha esposa costuma acompanhar-me, também...

Amanhã vais improvisar sobre alguns filmes. Conhece-los bem, tens um projecto daquilo que farás?

Sim. Tenho uma ideia mental suficientemente definida de como será... das ligações, da abordagem aos momentos chave e de como complementar. Ou seja... improvisado, mas nem tanto... [risos]

Carlos Costa

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