DISCOS
Faris Nourallah
Near the Sun – Best of
· 27 Jul 2006 · 08:00 ·
Faris Nourallah
Near the Sun – Best of
2005
Green Ufos / Ananana


Sítios oficiais:
- Faris Nourallah
- Green Ufos
- Ananana
Faris Nourallah
Near the Sun – Best of
2005
Green Ufos / Ananana


Sítios oficiais:
- Faris Nourallah
- Green Ufos
- Ananana
As estratégias da indústria musical chegam a ser de tal modo suspeitas, que se torna difícil avaliar o real propósito de Near the Sun, prematura compilação de êxitos centrada no aparentemente enigmático songwriter Faris Nourallah. Isto porque apenas quatro discos serviram à vindima da distribuidora espanhola Green Ufos, incumbida de extrair a partir daí sumo vitaminado pela produção mais solarenga e alegre da figura nómada que abandonou o lar ainda jovem para ser músico de estrada. Quase sempre este tipo de compilações surge com o intuito de angariar aceitação e reconhecimento para quem cumpriu uma primeira etapa em obscuridade ou culto reduzido - ainda este ano, por exemplo, Mary Ann Meets the Gravediggers and Other Short Stories servira para recapitular o passado à excêntrica Regina Spektor. Near of the Sun surgiu para resolver carências que pode suscitar o facto da Western Vynil ser uma label relativamente pequena e insuficiente na exportação do talento dos irmãos Nourallah (Salim edita também pela WV). Contudo, o mais certo será alguém ter procurado formar aqui um complemento ao micro-fenómeno que gerou o bem simpático King of Sweden no ano transacto.

Não se julgue no entanto que este é um objecto meramente oportunista. Iliba dessa acusação o critério temático das escolhas e um mais que suficiente e perceptível esforço arquivista (evidente na recuperação de duas faixas a um álbum conjunto dos irmãos Nourallah datado de 2000). A base temática respeita à faceta mais risonha de alguém que admite ser uma personalidade instável, um ser cuja estabilidade emocional é tão flutuante como a taxa de juros nacional. Por isso, há que ter cautela com o tropeção a que se arrisca quem encadear o uptempo vívido de “Fantastic!†com o existencialismo pintado a guache por xilofone e piano boémio de “Downâ€. Temporalmente, Near the Sun reúne parte representativa dos últimos cinco anos de produção dispendidos no aperfeiçoamento da justaposição de guitarra maioritariamente acústica, uma voz à partida pouco atraente e toda uma série de instrumentos de recurso (o kitsch abunda nos teclados de uma “Let’s get married†que podia ser arquitectonicamente viável à voz de Nel Monteiro, e isso não é necessariamente desprezível.)

Não é apenas o título a sugerir Near the Sun como um disco funcionalmente meteorológico. A forma como aproxima uma melancolia difusa de um optimismo levianamente tolo produz descomprometidamente uma variedade de coloridos própria do arco-íris. Tão variada que se torna estimulante e imprevisível. “Start a revolutionâ€, apesar de ideologicamente vazia, tem um brio unitário semelhante ao que se escutava aos hinos de Plastic Ono Band, o colossal disco que serve de cume à carreira a solo de John Lennon. “She’d Walk a Mile†deve um hambúrguer de tofu a Brian Wilson e vale a Nourallah o direito de cobrar divindendos ao sucesso obtido pelos The Thrills com "Big Sur" (que lhe é póstuma). "I'm Falling" incide tão desavergonhadamente nas malhas sintetizadas dos anos 80 que se lhe cheira laca e hálito a Green Sands. Soa quase a uma paródia que escreveria Robert Smith dos Cure se num dia das gravações de Faith fosse cagar à mata. Mas King of Sweden - desequilibradamente representado por aqui - não inclui apenas piadas de circunstância e a prova disso será a antagónica "Far from the Sun" que sabe exactamente como fundir uma voz exasperante e umas guitarradas fingidamente robustas que arranharia Eric Draven (O Corvo) se imigrasse de Detroit para o campo.

Este é, portanto, um aglomerado de canções cuja natureza e finalidade é de prognóstico quase impossível. Near the Sun mantém em actividade intermitente o magnetismo da excentricidade limada de Faris Nourallah. Ele que se sabota a si mesmo ao ceder à tentação que representa um bom momento anedótico ou, simplesmente, por puro desleixo. A verdade é que não serão necessárias mais que as escutas que conta uma mão para colher a este songbook dois pares de músicas geniais e sem vestígios de pretensiosismo em torno da sua aura. Ao abrigo de uma falta de lógica Baby TV, pode-se até entender a produção de Faris Nourallah como a que solta uma rampa de lançamento de pratos a alvejar: uns quebram-se no chão da indiferença, outros racham por efeito de caprichos humorísticos, os que realmente importam permanecem como diamantes ao lado de um sol tão luminoso e inspirado quanto eles. Quando - cego a factores externos - Nourallah acerta na mouche da excelência, faz-se jus ao título escolhido para esta compilação.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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