DISCOS
The Locust
Safety second, body last EP
· 03 Abr 2005 · 09:00 ·
The Locust
Safety second, body last EP
2005
Ipecac


Sítios oficiais:
- The Locust
- Ipecac
The Locust
Safety second, body last EP
2005
Ipecac


Sítios oficiais:
- The Locust
- Ipecac
Os Locust habitam um lugar ligeiramente mais acastanhado que a Terra do Nunca e para esse ermo de imundice sempre remetem quem escuta. E é naturalmente penoso, variavelmente moroso e frequentemente doloroso o processo químico que permite ao aventurado curioso desenvolver imunidade à matéria repelente que o gafanhoto destila. Passa esse processo por uma familiarização junto do ruído que sempre serve de núcleo ao ataque frontal do insecto arruinador. Pelo meio e a ajudar à ambiência tóxica, existe um sem número de elementos pouco ortodoxos: edições limitadíssimas de vinil colorido à semelhança de sémen ou urina, a fama de cocainómanos que os persegue e o mito de praticarem um dos mais violentos espectáculos da actualidade. Sobra a certeza de que um estagnado hardcore pode encontrar por aqui via de sobrevivência. Depois, e caídos os órfãos na armadilha, repete-se a história do escorpião incapaz de contornar o instinto: “Porque me picaste?”. “Sou um escorpião. É essa a minha natureza.”

Termina o primeiro capítulo de O dia do gafanhoto - um tratado sobre a mecanização da ambição em Hollywood escrito por Nathanael West – com uma frase aplicável à praga vinda de San Diego: ”Escassas coisas são mais tristes que o verdadeiramente monstruoso.”. O peso absurdo da combustão sónica praticada pelos Locust visa sobretudo remeter a triste (por ser desprezível) acidez e podridão para o lado “glamour” da cerca que divide o estado da Califórnia. Trata o gafanhoto de agir como contraponto a uma Mariah Carey em constante transformação publicitária. Pó no nariz em vez de pó de arroz. A reputação de arruaceiros - honrada pelo caos que semeiam nos seus concertos – garante aos Locust o estatuto de ameaça que, nervosamente expectante, antecipa a melhor ocasião para devorar as crias (celebridades menores) ao viveiro Hollywood.

Mas, para que sejam admitidos no selecto meio, necessitam primeiro de maquilhar o rosto de forma a encobrir impurezas acumuladas durante um passado recente. O novo EP Safety Second, Body Last é uma nova pele. Os Locust atreveram-se a elaborar o mais desavergonhadamente electrónico dos discos por si lançados até hoje. Além disso, Safety Second, Body Last - composto por uma faixa única dividida em sete andamentos – surpreende pela sua altivez prog (está a voltar em grande) e por conservar a intensidade associada aos seus autores; desta vez, ao explorar com maior minúcia a via electrónica, que, no obrigatório Plague Soundscapes, surgia apenas como matéria a servir de interlúdio. Os papéis inverteram-se e passam agora as vocalizações sufocantes a ser dominadas pela camada de lava digital.

Safety Second, Body Last comporta a complexidade da anatomia. Não conduz a lado algum e só poderá ser devidamente interpretado na companhia do disco que lhe sucederá (?). Passa o gafanhoto a ser ganhafoto, perde-se a noção da direcção a tomar e não sobra outra solução que não voltar à casa de partida. O sustento alimentar passa a ser então o que está a mão: uma sova de electrónica capaz de cravar mais um par de pregos no caixão Linkin Park. Pela gastronomia que propõe, o convite dos Locust demonstra um honroso fair-play perante a espécie rival: "Comam merda. Milhões de moscas não podem estar enganadas.".
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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