DISCOS
Gaiteiros de Lisboa
Macaréu
· 25 Jun 2002 · 08:00 ·
Gaiteiros de Lisboa
Macaréu
2002
Aduf Edições


Sítios oficiais:
- Gaiteiros de Lisboa
Gaiteiros de Lisboa
Macaréu
2002
Aduf Edições


Sítios oficiais:
- Gaiteiros de Lisboa
Fechado o ciclo que os ligou a uma editora, onde lançaram em 1995 "Invasões Bárbaras", em 1997 "Bocas do Inferno" e em 2000 o CD ao vivo "Dançachamas", foi tempo de editar em política de auto-edição. Este "Macaréu" representa pois para os Gaiteiros de Lisboa uma nova fase de carreira.

A música tradicional é, cada vez mais e com tendência para piorar, mais mal tratada pelo público jovem. Esse tipo de público está cada vez mais virado para a música electrónica, estando assim a ignorar a música que resulta das histórias que o tempo em tempos desfrutou. Histórias que fazem parte do mundo rural e que acompanhavam as pessoas ou nas lides diárias, ou nos trabalhos que desempenhavam pelos campos, ou nas prezes religiosas, e que não merecem de forma nenhuma ser apagadas pelo tempo. Os Gaiteiros de Lisboa não fazem mais do que pegar nesses elementos tradicionais, transgredindo os seus limites apenas para os reinventar, de uma forma extraordinária. Transformações essas que se materializam em "Macaréu", um excelente disco.

"Macaréu" é constituído por catorze temas, todos de cariz tradicional, entre dez cantados e quatro instrumentais. Apesar de serem todos de cariz tradicional, em "Terra de Ninguém" há uma pitada de rap por Pacman. E de facto, a distância entre o Rap e a música tradicional até tem alguns pontos em comum, ambos têm uma filosofia de passagem mensagens e são autênticas. Assiste-se, pois, nesse tema a uma ligação entre o passado tradicional e algo que está vivo, o Hip Hop.

O álbum desenvolve-se entre temas com arranjos que, em todo o álbum, não conhecem a utilização de uma corda ou teclado. De facto, após a audição do álbum percebe-se que a utilização desses elementos poderiam tirar muito ao som dos Gaiteiros. Esse som tem assim uma sonoridade muito própria, até porque muitos dos instrumentos utilizados são produzidos e inventados pelos próprios músicos. "Ponteiro de smallpipe", "Túbaros de Orfeu" e "Guimbarda" são apenas alguns dos muitos instrumentos que demonstram a criatividade do grupo. Depois, juntando a tudo isto letras "nonsense" e cheias de grandes doses de humor, como o são os casos do tema inicial "Era Não Era do Tamanho de um Pardal", "Velha Bufelha" (este com origem popular) ou "Quando Judas Teve Sarampo" ficamos com uma colecção de temas muito consistentes e singulares. Nesse tema inicial, esclarece-se que macaréu não é, como consta no dicionário, uma onda de arrebentação que, junto à foz pouco profunda de certos rios, por ocasião da maré montante, irrompe de súbito em sentido inverso ao do fluxo das águas, mas antes, " os macaréus são umas ondas muito altas, da família das pernaltas e maiores do que um pardal, mas sem as penas nem as partes comestíveis, nem a caixa dos fusíveis, nem a corda do estendal". O humor dos gaiteiros ao melhor nível!

Pegando na primeira definição, percebe-se então porque é "Macaréu" o nome do álbum. O percurso dos Gaiteiros segue, de facto, contra a corrente dos acontecimentos que em Portugal marcam a música. "Macaréu" é pois um álbum que representa um pequeno oásis num país muitas vezes feito de má música. Demonstra uma grande criatividade, conjugando exemplarmente humor e arranjos com base em música tradicional.
Tiago Gonçalves
tgoncalves@bodyspace.net
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