DISCOS
Glenn Jones
Fleeting
· 14 Mar 2016 · 14:40 ·
Glenn Jones
Fleeting
2016
Thrill Jockey


Sítios oficiais:
- Thrill Jockey
Glenn Jones
Fleeting
2016
Thrill Jockey


Sítios oficiais:
- Thrill Jockey
A insustentável leveza do sonho.
E se te deitasses à sombra daquele carvalho? É belo e está só. Talvez precise de companhia, talvez precise de ti. E não te esqueças! Leva música, para embalar os pensamentos ou os sonhos, sei lá…leva música e pensa em não pensar.

- Música para sonhar? É isso?

Sim, porque não? Que sonho tinhas em mente, digo, que música tinhas em mente?

- Quero viajar até um dia de Primavera, um dia de Primavera na Primavera da minha vida. Quando tinha doze anos e corria pelo campo só porque me apetecia correr pelo campo, sem mais objectivo. Quero regressar a uma mente limpa, aquela paz de quem vê no castanheiro mais próximo um marco de uma vida, o longo e doce bocejo de um coração que antevê, num futuro próximo, paixões arrebatadoras de mel e pipocas.

Tenho algo para ti. A promessa do regresso às raízes, soa-te bem? Atenção, é uma promessa que se cumpre e vai, até, além do que tu pedias… Ainda queres?

- Claro!!! A saudade aperta…de mim…digo…

Toma, não estarás só. O carvalho aguarda-te…

- Se te posso perguntar, o que me vai dentro dessa caixinha musical? Música para sonhar é tudo quanto te posso adiantar. Agora vai, que ao sol das três da tarde o sonho que pretendes viaja melhor.

before sunset…

Foi boa a viagem?

- Foi absoluta. Nem sei por onde começar. Mal dei por mim lá estava eu no campo, naquele exacto campo onde corri milhares de vezes, onde me deliciei com o sumo daquelas laranjas sumarentas roubadas a uma das dezenas de laranjeiras que o povoavam. Era Primavera e estava a pensar em me apaixonar, mas havia algo diferente. Existia música, a minha corrida passava de lá em dó no dedilhado de uma guitarra acústica e era inebriante... como era inebriante... Sabes, sempre pensei que a vida seria melhor com banda sonora. Mas não uma banda sonora como as que acoplamos às fotos no Facebook. Seria música em directo acompanhando cada uma das nossas respirações, cada passo, cada paixão... E aconteceu. Foi isso que aconteceu.

E ficou-se por aí?

- Não, nem por sombras. Ultrapassou o campo, mas a ele voltou, como te explicarei mais à frente. Depois dessa fértil e verdejante Primavera de desejos campestre, voei… para mim. Era eu com 20 anos e uma febre de vida inexplicável. Estava de viagem pelo Sul em pleno pino do Verão. Dentro do carro onde seguia, o calor apertava e nem os vidros bem abertos, ar condicionado era luxo que não tínhamos, mitigavam o bafo do sol. Ia em direcção a Sines, para o festival de músicas do mundo e de repente ouvi…a música…lentos e saborosos pedaços de história árabe enredados nas seis cordas de uma guitarra Parlor que se transmutavam subitamente em praias sonoras do sul da Califórnia pontuadas por esvoaçantes escritos de Kerouac. Tudo lento, tudo tão doce e profundo que quase chorei, pois tinha sido o que, de uma outra forma, tinha sentido naquela tarde de estio.

E acabou…

- Pensava eu que, após os campos, o estio e passagens fugazes sobre momentos que julgava perdidos na memória, o sonho teria terminado e as raízes teriam sido, pelo menos as mais importantes e perdidas, tinham sido passadas a limpo até que… Do nada volto ao campo. Agora, era eu e a minha presente idade no momento em que te deixei antes de me sumir no tronco do carvalho. Lá estava eu e o campo do inicio. Parado, olhando-o como se fosse um regresso a casa. O Outono tinha caído, a paisagem apresentava-se pintada naquele castanho molengão e indeciso que balança entre o verde que foge e o negro que se avizinha. Assim estava quando a música recomeçou e tudo se começou a desenhar. O filho que terei, a casa de que cuidarei, a mulher que amarei, os sonhos concretizados e aqueles que aguardam na gaveta, a tristeza e a felicidade, temperos de um Futuro por finalizar... uma vida, uma totalidade… Então acordei, a noite espreitava por entre as folhas castanhas deste carvalho colonizado pelo Outono… Pelo que ouço foi uma viagem e pêras. Arrependido?

- Não, foi a viagem de uma vida, digo, a viagem pela vida nos seus pormenores que a fazem um pormaior. Uma última coisa. Em todos os cenários e nos objectos ou viventes mais inesperados existiam palavras “tatuadas”. Sabes do que se trata?

Penso que sim. Seria algo como

Flower Turned Inside-Out
In Durnace Vile
Cleó Awake
Mother’s Day
Gone Before
Spokane River Falls
Portrait Of Basho As A Young Dragon
Close To The Ground
Cleó Asleep
June Too Soon, October All Over

- Sim, era isso e no fim, gravado no tronco de um castanheiro estava escrita uma outra palavra, diferente das que me elencaste…

Fleeting, aconteceu-te Glenn Jones…
Fernando Gonçalves
f.guimaraesgoncalves@gmail.com
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