DISCOS
David Bowie
Blackstar
· 12 Jan 2016 · 01:35 ·
David Bowie
Blackstar
2015
Columbia / RCA


Sítios oficiais:
- David Bowie
- Columbia
- RCA
David Bowie
Blackstar
2015
Columbia / RCA


Sítios oficiais:
- David Bowie
- Columbia
- RCA
Apagou-se uma estrela, ergueu-se uma constelação.
Numa certa noite na Primavera de 2014, e por sugestão de Maria Schneider, David Bowie terá ido ao quase centenário 55 Bar para ver um concerto quarteto liderado pelo saxofonista Donny McCaslin. Dez dias depois, Bowie conviou McCaslin se o seu baterista Mark Guiliana para que juntassem a ele em estúdio. Primeiro para uma canção apenas. Depois para um disco.

Esse disco é o 25º álbum da carreira do eterno camaleónico. Mas Blackstar está muito longe de ser apenas mais um disco. O sucessor do algo conservador The Next Day é o disco mais aventureiro de que há memória na carreira de Bowie. É um disco que parece assumir em voz alta o distanciamento da música pop e do rock 'n' roll e a aproximação às linguagens mais experimentais.

Blackstar é naturalmente um disco de canções na sua essência. Mas está longe de ser um disco pop. Nos seus sete capítulos, este é um disco de liberdade, de extrema reinvenção. Algo que faz ainda mais sentido agora que sabemos que este era um disco de despedidas, de um eclipsar quase encenado, a narrativa de uma morte perfeita.

Do início ao fim, Blackstar é um caldeirão onde cabe jazz, música electrónica, krautrock e tudo o mais que possa coexistir entre esses mundos. O tema que abre o disco, "Blackstar", consegue ser tudo isso nos seus quase dez minutos de encriptação, estranheza e sufoco. Nada disto é Bowie e, ao mesmo tempo, tudo isto é Bowie - só que ainda não sabíamos.

Os singles foram escolhidos com sabedoria e conhecimento. Ao lado de "Blackstar", "Lazarus" é evidentemente uma das grandes canções do disco. Hoje, "Look up here, I'm in heaven" soa-nos ainda mais dramático do que da primeira vez. Mas também mais pacífico. Para lá das mensagens, "Lazarus" é brilhante na sua definição textural, na gestão da tensão, na libertação daquele quase-refrão, daquela espécie de libertação, de um reconfortante "está tudo bem". O seu final é como o final de Bowie: apoteótico, intenso, inimitável.

Mas há muito mais em Blackstar para alem da canção com o mesmo nome e de "Lazarus": há tempo para um clássico instantâneo "'Tis a Pity She Was a Whore" (a lembrar, ainda que por breves momentos, outros tempos) e o delírio electrónico pulsante de "Girl loves me". Acima de tudo isso, há uma coerência admirável criada por alguém que, até ao último dia, soube honrar a sua missão. Apagou-se uma estrela; mas, por sorte, iluminou-se toda uma constelação. Bowie, obviamente, é eterno.
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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