Chicago é cidade de muitas tonalidades no que diz respeito ao hiphop. Nela cabem a ambição e atrevimento de Kanye West, a violência declarada da "drill music" de Chief Keef e Lil’ Durk, o flow supersónico de Twista, a consciência social de Common, e ainda outros nomes como Lupe Fiasco ou The Cool Kids. O bem jovem (20 anos) Chance The Rapper não se vem propriamente juntar a nenhum destes campos, o que abona a seu favor, pelo menos para quem valoriza a originalidade no hiphop. Acid Rap é a sua segunda mixtape, e nela encontramos Chance num estado que se resume bem nesta citação de “Pusha Man”: "I’ve been riding around with my blunt on my lips, with the sun in my eyes, and my gun on my hip". Não sera o equivalente hiphop do cool jazz, mas é suficientemente lânguido para justificar um par de óculos escuros.

É possível que vos tenha passado pela cabeça o nome de Kendrick Lamar, e não estarão longe da verdade. Tal como o autor do extraordinário Good Kid, m.a.a.d. City, Chance, apesar de muitas referências a charros, ”lean” (vejam na Wikipedia) ou mulheres, procura levar a água ao seu moinho através mais dos jogos de palavras do que pelo impacto martelado das frases de um Rick Ross ou Chief Keef. Além de aludir muitas vezes à sua cidade, amigos, os que o apoiaram ou os que duvidaram dele, e pelo menos duas vezes a Michael Jackson. Chance é um MC de muitos e variados flows. A sua voz reflecte a sua juventude, com uma petulância agradável. Consegue ser brincalhão com as palavras, usando e abusando de jogos das mesmas, ou adoptando uma toada meio-cantada que lhe fica muito bem, pois, ao contrário de um Big Sean, não perde nunca o controle, nem sacrifica a imaginação das rimas. Por vezes é amanteigado, quase não se sentido as consoantes, outras vezes rima num hábil double-time, mantendo sempre a competência e a capacidade de cativar.

Acid Rap contém convidados da qualidade de um Ab-Soul ou Action Bronson, além de conterrâneos de Chance como BJ The Chicago Kid. Musicalmente, é um disco de sensibilidade orgânica, algo que, observando actuações ao vivo no YouTube, se reflecte em palco. Pianos, orgãos, baterias, guitarras eléctricas, baixos, beats etc, formam um todo com notórias doses de melodia, e um indisfarçável psicadelismo (o disco chama-se ”Acid Rap já se esqueceram?). Mas isso tudo seria irrelevante se nao combinasse tão bem com a voz de Chance. Acid Rap merece transpôr a cena de Chicago, e conquistar, de pleno direito, o estatuto de uma das grandes mixtapes de 2013. Não será o único a olhar o céu, mas será o único a vê-lo com estas cores.