DISCOS
Torres
Torres
· 25 Mar 2013 · 10:05 ·
Torres
Torres
2013
Ed. de Autor


Sítios oficiais:
- Torres
Torres
Torres
2013
Ed. de Autor


Sítios oficiais:
- Torres
Electricidade e vocalizações em simbiose apurada.
Ser o centro total das atenções, armado(a) apenas com voz e guitarra, tem as suas dificuldades inerentes. Quer esta seja acústica, quer eléctrica. Mackenzie Scott, a cantora/compositora que adoptou o nome artístico Torres, escolheu a segunda opção. O que significou, desde logo, que teria que competir com o ruído próprio da electricidade. E igualmente exibir uma introspecção que, desde há muito, nos habituámos a associar com as acusticidades. A primeira grande vitória deste álbum de estreia homónimo, é o de conseguir precisamente isso, o que não surpreenderá quem já tivesse visto actuações ao vivo ou em estúdio de Torres no YouTube. Mackenzie Scott é uma intérprete capaz de trazer à baila as boas memórias de Cat Power circa-”Moon Pix, ou de uma Shannon Wright. Embora consiga se colocar nem tão do lado trágico da primeira, nem da saudável violência da segunda. Exibe, isso sim, uma força interior e uma capacidade melódica tremendas, que nos orientam como uma bússola no meio de elementos capazes de desorientar os mais incautos.

O início de “Mother Earth Father God” é imediatamente “autobiográfico”. “I was born in bloody battleground” é desde logo uma boa frase para as dúvidas, desafios, confrontos e questões que se colocam a Torres ao longo das 10 músicas do disco. Não são precisas muitas notas na guitarra eléctrica. “Honey” cresce de intensidade a cada passagem, mas, tal como num Bill Callahan, é o talento melódico de Scott que se destaca. Sem dúvida mais “musical” na voz que o Ex-Sr. Smog, partilha com ele um certo intimismo expansivo. Uma mudança, um gancho que agarra onde outros seriam incapazes de captar interesse. “Jealousy & I” faz a mente vaguear por corredores e cantos, questionando um passado ou presente amante, incapaz de estar quieta. “November Baby” são 7 minutos minimalistas, onde Torres faz aquilo que no futebol se chama “carregar de piano”, prendendo o interesse sem necessitar de truques baratos.

A segunda metade do disco mantém o tom. “Chains” parece ameaçar algo, mas acaba só com voz e uma pulsação electrónica. “Moon & Back” exibe novamente a voz magnética de Torres, que centra em si todas as atenções, apesar do violoncelo e da batida que entra de rompante. Torres e a sua guitarra vivem da electricidade. Não da quantidade das notas. “Don’t Run Away, Emilie” talvez nunca vá pôr os espectadores de um concerto aos pulos. Mas decerto que que os fará olhar fixamente para o palco com medo de respirar alto demais. “Come To Terms”, o único exemplo de guitarra acústica no disco, volta a demonstrar que, com companhia reduzida ou um-pouco-menos-reduzida, Torres nunca perde o sentido de trabalhar em função da melodia imaginada para a canção. O fim, com a difusa “Waterfall”, pergunta se alguma vez saltámos de um lugar alto, e a meio pensámos que se calhar não o deveríamos ter feito. Um fim que encaixa bem com o principio de ”Torres”. O talento que Mackenzie Scott tem paulatinamente espalhado pela internet, e por este disco, podem ser o começo de uma história muito especial. Resta saber que caminho ela tomará para alcançar esse presumível objectivo. Para já, temos aqui, sem dúvida, uma das revelações do ano.
Nuno Proença
nunoproenca@gmail.com
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