DISCOS
Four Tet
Rounds
· 06 Jul 2003 · 08:00 ·
Four Tet
Rounds
2003
Domino


Sítios oficiais:
- Four Tet
- Domino
Four Tet
Rounds
2003
Domino


Sítios oficiais:
- Four Tet
- Domino
Four Tet (Kieran Hebden para os amigos) passou por Portugal em Julho do ano passado, incumbido da tarefa de entusiasmar o público de cinco concertos dos Radiohead distribuídos pelos coliseus de Lisboa e do Porto. Tentou fazê-lo com cinco vezes quarenta inesquecíveis minutos consagrados à arte de abanar a cabeça três graus à frente e à rectaguarda, entre arriscadíssimos e primorosos movimentos de mão direita sobre um mouse igual a esse.
Regressado ao quarto de dormir, Four Tet fabricou o prometido terceiro disco seguindo as ideias e as pistas sonoras deixadas na passagem por Portugal, provando que as cinzas de um espectáculo falhado podem cobrir música de rara beleza.

É indesmentível que Rounds não traz nada de novo. Pega em tudo o que os anteriores Dialogue e Pause já continham, apára as arestas mais agrestes e filtra o supérfluo, reafirmando as bases e regras norteadoras da construção de ambientes Hebdenianos. Four Tet já tem algum calo e sabe o que quer, pelo que não é de espantar a coesão e a harmonia que percorrem o disco do princípio ao fim. Recorrendo na medida exacta a loops de piano (“Winter”, de Tori Amos, ajuda a dar corpo a um dos momentos mais interessantes do álbum, “Unspoken”), a recortes de viola e às batidas hip-hop do costume, acaba por não ir mais longe do que porventura já tinha ido; contudo, o nem sempre fácil caminho até à esfera das emoções é percorrido com absoluto sucesso, como nunca antes havia sido.

A música de Four Tet sempre foi e continua a ser uma feliz aplicação do efeito-sinergia, ou como a soma destas cordas, daquela percussão e de um ou outro teclado vale infinitamente mais que a soma aritmética de todos os sons. A mais valia assenta na beleza – que outra palavra assentaria tão bem ao single “She Moves She” ou ao hipnótico e delicado “My Angel Rocks Back and Forth”? – dos dez temas de Rounds, beleza essa que justifica o absoluto encolher de ombros face ao método e ao processo; trata-se de um disco que estimula o peito e a pele, nunca o cérebro.

Sem lançar discos de charneira, e longe de ousar qualquer tipo de experimentalismo, Kieran Hebden vai granjeando a justa reputação de ser um dos mais prolíficos agentes da música electrónica, ao mesmo tempo que, paulatinamente, se torna mais e mais requisitado no universo da produção para outros nomes (Beth Orton, por exemplo).
É sabido que todas as fórmulas estão destinadas à obsolescência. Se Four Tet continuar de prego a fundo sem desvios no caminho que vem trilhando, é uma questão de tempo até se tornar um artista pouco interessante, qual Moby da indietrónica. Enquanto isso não acontece, continuaremos a ter deliciosos discos de Verão, muito menos sérios que a nossa vida.
Carlos Costa
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