DISCOS
M.I.A.
/ \ / \ / \ Y / \
· 31 Jul 2010 · 10:13 ·
M.I.A.
/ \ / \ / \ Y / \
2010
Interscope / XL Recordings / N.E.E.T.


Sítios oficiais:
- M.I.A.
- Interscope
- XL Recordings
- N.E.E.T.
M.I.A.
/ \ / \ / \ Y / \
2010
Interscope / XL Recordings / N.E.E.T.


Sítios oficiais:
- M.I.A.
- Interscope
- XL Recordings
- N.E.E.T.
Ganhou fama, mudou de continente, casou, acaba de ser mãe e ainda tenta digerir a pesada derrota dos Tigres Tamil no Sri Lanka, pelo que não se lhe poderia exigir muito melhor?
Mathangi 'Maya' Arulpragassam (nome de combate M.I.A. - sigla de "missed in action") nasceu em Londres, mas, logo aos 6 meses de idade, viajou para o Sri Lanka com a mãe Kala (título do seu segundo álbum, 2007) e os irmãos, em busca do pai Arular (título do seu primeiro álbum, 2005). Ali permaneceu durante uma década, sem contudo reencontrar o progenitor, ao que não serão alheias as correlações deste com uma célula dos Tigres Tamil, grupo de guerrilha fundado nos anos 70 (precursor do terrorismo pós-moderno, a par dos demais grupúsculos pró-palestinianos e das brigadas europeias de extrema-esquerda, nomeadamente a germânica Baader-Meinhof) com o intuito declarado de "libertar" o Tamil Eelam, região norte da ilha (ex-Ceilão), em confronto mortífero contra a maioria cingalesa (e respectivas tropas governamentais, que, recentemente, esmagaram por completo a resistência exercida pelos Tigres Tamil, para estertor de muitos bem-pensantes e pseudo-libertários que não conseguem sobreviver sem uma boa causa "independentista" e anti-"imperialista" para expiação dos demais complexos pós-coloniais).

Retornou depois a Londres, onde usufruiu de uma educação elitista mas num contexto urbano de "melting pot" que acabaria por instrumentalizar as suas origens "exóticas" enquanto factor de diferenciação e de afirmação pessoal e artística. Estudou cinema mas dedicou-se à música (num sentido mais lato, e contemporâneo, desta segunda linguagem, na medida em que não sabe tocar um único instrumento musical). Lançou dois discos que capturavam e exalavam como muito poucos o mais estimulante "esprit du temps", mescla explosiva de ingredientes marginais (dancehall, dub, hip hop, baile funk, kuduro, grime, crunk, etc.) sob letragens bélicas e revolucionárias, e, como não poderia deixar de ser, nesta época entre o i-pod e o i-pad, com uma forte componente visual. Não tardou até atravessar o caminho minado que dista entre as margens e o centro (vulgo mainstream) da criação artística e subsequente exposição pública, culminando na banda sonora do oscarizado "Slumdog Millionaire" (2008) de Danny Boyle, no casamento com o filho de um director executivo da Warner (de quem teve, há semanas, um rebento) e na partilha do palco dos Grammy com os burgueses Jay-Z e Kanye West.

É neste contexto que surge um terceiro capítulo, "/ \ / \ / \ Y / \" (2010), enriquecido pelas colaborações de, entre outros, Diplo e Switch (a dupla Major Lazer), Rusko, Derek Miller (dos Sleigh Bells) ou Blaqstarr. Mas não sem as mesmas novidade, urgência e brilhantismo, ora como que uma decepção parcial. Apenas parcial e não total porque M.I.A. tentou reinventar-se num momento de consagração em que lhe bastaria uma réplica dos álbuns anteriores para exponenciar a unanimidade. Há risco e coragem nesta nova aventura, a qual pecará sobretudo pelo (inerente) conceito de fragmentação que tende a impossibilitar a coerência do todo, uma espécie de força centrífuga no sentido da desintegração narrativa. Polémicas à parte (do videoclip de Romain Gavras à disputa, quão infantil, com a jornalista Lynn Hirschberg do "The New York Times"), a guerrilheira aburguesada parece desencontrar-se num período de transição, a meio caminho de algo que a resgate dos braços da mera redundância. Trasladada para a soalheira Los Angeles, talvez se comece a dar com Flying Lotus, ou a malta da Stones Throw, e ficamos com água na boca só de congeminar o resultado dessa putativa síncope criativa.
Gustavo Sampaio
gsampaio@hotmail.com
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