DISCOS
Charlotte Gainsbourg
IRM
· 03 Fev 2010 · 14:36 ·
Charlotte Gainsbourg
IRM
2009
Because Music / Warner


Sítios oficiais:
- Charlotte Gainsbourg
- Because Music
Charlotte Gainsbourg
IRM
2009
Because Music / Warner


Sítios oficiais:
- Charlotte Gainsbourg
- Because Music
Menina que virou mulher. Actriz que também é cantora. Com a ajudinha de Beck, Charlotte sabe agora o que quer e porquê.
Salta-nos de imediato à ideia o velho provérbio: filho de peixe sabe nadar. E é evidente, sendo filha de quem é, que a música corre-lhe nas veias a grande velocidade, mesmo que saiba pouco mais que cantar. Independentemente de também se dedicar à arte da representação, é de música que falamos quando nos deparamos com um disco que tem carimbado nos seus sons a memória mais íntima da amargura e do sofrimento da sua autora, que só uma inesperada doença podia ter provocado. É isso que está descaradamente presente quando se ouve e se sente esta música escrita (quase) na primeira pessoa, repleta de sentimentos contraditórios que tanto podem ir da transparente ironia à viçosa esperança num amanhã venturoso.

Com um primeiro álbum produzido pelo seu pai, editado em 1985 quando tinha 13 anos, IRM é o terceiro registo numa discografia de uma menina que virou mulher e que representa um passo de gigante de quem sabe agora o que quer do futuro e porquê. Que 5:55 de 2006 – erguido com a preciosa colaboração dos Air, Neil Hannon ou Jarvis Cocker – tenha sido uma mera consequência de um simples capricho de quem pode fazer música só porque lhe dá na real gana – e que pouco mais foi além da fasquia do interessante –, nenhum mal veio ao mundo quando o edifício da melhor pop não se sentiu minimamente estimulado por ele. Mas o mesmo já não se pode dizer deste novo trabalho em que Beck, enquanto produtor, é parte essencial da operação.

Se há certezas a retirar de IRM é que é um belíssimo pacote de grandes canções que não só recuperam o espírito provocador de Serge Gainsbourge e Jane Birkin, mas que conseguem também dar uma invulgar frescura a uma pop clássica amiúde constrangida com realidades que extravasam o seu código genético. Com Beck, constantemente presente, não será de estranhar a abertura de Charlotte e de IRM a estímulos que podem advir dos contactos que o pequeno prodígio norte americano tem com a sua realidade musical e que tem no blues, na folk ou no hip-hop algumas das alavancas criativas mais importantes.

Se é um trabalho que pode ser encarado como um disco de produtor, disso não há qualquer dúvida. Que Beck brilha quando toma as rédeas da escrita criativa e desafia o potencial vocal de Charlotte permitindo naturalmente que IRM se equilibre entre uma desafiada formosura que advém tanto da chanson française como da mais ousada e eloquente pop actual, também não parece haver grandes hesitações que ponham em causa a mais certa das certezas.

Entre o invernoso sentimento de tristeza, a fúria provocada pela frustração e a luminosidade da esperança outrora perdida na estreiteza, IRM é a confirmação da ambição de Charlotte Gainsbourg, que não obstante a grande necessidade de um produtor que lhe concretize os desejos e anseios, almeja brilhar sozinha no mesmo firmamento que os seus progenitores.
Rafael Santos
r_b_santos_world@hotmail.com
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