DISCOS
Why?
Alopecia
· 14 Abr 2008 · 08:00 ·
Why?
Alopecia
2008
Tomlab / Flur


Sítios oficiais:
- Why?
- Tomlab
- Flur
Why?
Alopecia
2008
Tomlab / Flur


Sítios oficiais:
- Why?
- Tomlab
- Flur
Pop idealizada à imagem dos céus sacode pegajoso fantasma da estética Anticon com eficiência média.
Não é de agora a facilidade que o hip-hop mantém enquanto linguagem altamente propícia à montagem de uma digressão verbal que progride como narrativa em espiral. Em conjunto, o stress, a insanidade e uma arma carregada que dispara em todas as direcções, formam combustível útil àquele tipo de MC com alma de bomba-relógio, que, enquanto não se cala, adia a explosão. A partir daí, qualquer tema de hip-hop que sustenha o dedo sobre o botão vermelho adquire geralmente o aspecto de dissecação do historial de uma ou mais feridas ou – se preferirmos outras palavras - o de prolongamento arrastado de um estrondo anunciado. Todos os sintomas descritos afectam também Yoni Wolf e, por arrasto, a sua extensão Why? que agora funciona como trio, sem nunca deixar de depender principalmente da vontade e inspiração do primeiro – até porque é por ele que passa todo o amortecimento que leva o último Alopecia a parecer-se muito com um irritadiço engenho hip-hop desactivado por tratamento terapêutico incidente numa pop onírica pronta a multicolorir os ouvidos. Isso é, ao mesmo tempo, bom e mau, como se esclarece de seguida.

Antes de mais, deve-se, porém, explicar qual é o peso do albatroz Anticon que Why? traz ao pescoço. Ou, de preferência, deixar que Alopecia identifique por si mesmo os tiques e marcas Anticon – colectivo e label – presentes na orientação que assume Why? durante um disco que pretende a custo ver esse estigma pelas costas. Quando vence nessa tarefa, durante sensivelmente um terço da sua duração, Alopecia dá-se francamente bem na renovação do desgastado fardo associado ao tal “hip-hop tão futurista que se tornou instantaneamente datado”: fá-lo essencialmente através de fortificadas melodias que rebatem quaisquer suspeitas e da apatetada despreocupação nerd que leva uma canção como “These Few Presidents” a servir como twee de qualidade (conforme canonizado pelos Beat Happening) para consumo de aficionados de hip-hop incapazes de renegar a doçura do seu passado indie.

Em termos líricos, Alopecia equilibra o ritmo respiratório de Yoni Wolf e permite que sejam também os momentos de recuperação de fôlego todos aqueles em que marca alegremente presença um protótipo indie – marcado pela convocação da guitarra e bateria - ou o cismar de pianos e samples agridoces e de antenas apontadas ao céu. Mesmo assim, isso não impede uma mente tão brilhante quanto perigosa de mergulhar de cabeça em digressões que, com a mesma acutilância, alvejam temas como o sexo em público, notas de Euro com destino incerto, a morte de Harvey Lee Oswald e a imagem de Cristo. Não se sabe se terá sido por causa dos Xiu Xiu terem tentado uma versão de “Yo Yo Bye Bye”, na versão americana do EP The Hollows, mas a verdade é que se descobrem indícios de retribuição na forma em como Yoni Wolf parece, por aqui, emular o estilo lírico de Jamie Stewart (vocalista de Xiu Xiu) com a variante de fazê-lo à velocidade da luz e sem a mesma carga neurótica.

Não há, porém, escape possível à gravidade Anticon que se encontra ainda escancarada num álbum que algumas vezes encontra o seu locutor entregue àquele flow alienígena que trespassa blocos sonoros que se movem como gigantesco corpos cósmicos. E é sabido que desde há muito que o beco sem saída onde foi parar a Anticon é agora um muro de lamentações que os presentes tentam ler de trás para a frente na esperança de impressionar – esse é um malabarismo engraçado, mas esgotou-se como a novidade do Blandi Blub ou de um yo-yo luminoso. Sim, é esta a idade adulta da Anticon, mas será que isso é bom? Não era melhor a Anticon ter deixado de o ser na altura certa para manter uma juventude eterna que a livrasse do sufoco que sofre em tudo o que não meta Subtle – o sobrevivente - ao barulho? Alopecia liberta uns quantos reféns e deixa outros tantos condenados às chamas da saturação.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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