A favor da sua integridade enquanto surpreendente executante de piano preparado, Anthony Pateras conta com a vantagem de demonstrar igual rigor e total entrega física ao instrumento, em disco tal como numa prestação ao vivo. Ou seja, o que se escuta a Chasms, estupenda estreia na Sirr exclusivamente incidente em piano preparado, não destoa tanto quanto isso do que se testemunhou no serão ocorrido recentemente na Fábrica Braço de Prata, espaço de descobertas em Lisboa, em que o australiano reproduziu – mesmo que tomando as devidas liberdades - grande parte do referido disco valendo-se de um piano alheio e dos parafusos, metais diversos e pedaços de cartão que “preparam” as suas cordas. Some-se o jetlag e o cansaço à condicionante imposta pelo piano pouco familiar, e torna-se difícil desmentir a capacidade sobre-humana de Anthony Pateras (que já havia deixado alguns boquiabertos ao passar pela ZDB). Mesmo assim, e para que não se colem os conceitos do que é Pateras em disco e em carne viva, aponte-se que Chasms, enquanto conceito que floresce, é tudo menos estático ou auto-reprodutor em relação às suas mais-valias.

Através do mínimo convívio com esta parcela do activo de Anthony Pateras, percebe-se que o termo “improvisador” pode soar a ofensivo quando aplicado no seu caso. As três peças incluídas em Chasms reservam, de facto, espaço a rasgos de improviso (coincidentes com uma mais impulsiva violentação das teclas do piano), mas a fundação destes universos encadeados assenta sobretudo numa acústica que aspira a transgredir todas as suas limitações, desafiando, por vezes, o humanamente possível e desenvolvendo-se através da repetição perturbada de padrões acelerados até ao ponto do ininteligível (obtendo, com isso, uma precisão técnica que a deixa mais próxima da electrónica mais labiríntica).

Além da mesma nacionalidade, Chasms conhece um certo paralelo estético no mais extenso (e fatigante) Wallpaper Music, que gravita em torno do piano preparado de Erik Griswold, nome mencionado por Pateras no interessante texto da sua autoria que acompanha o tomo lançado pela Sirr. Acreditando que o segundo serve realmente como música para papel de parede, Chasms mais será cortina rasgada por onde caiem aqueles caracteres estranhos da Matrix. Depois de Janek Schaefer, eRikm ou Éric La Casa, Anthony Pateras é mais uma contratação estrangeira que marca pontos no catálogo da portuguesa Sirr.