DISCOS
Talibam!
Buns and Gutter
· 06 Nov 2007 · 08:00 ·
Talibam!
Buns and Gutter
2007
Gaffer


Sítios oficiais:
- Talibam!
- Gaffer
Talibam!
Buns and Gutter
2007
Gaffer


Sítios oficiais:
- Talibam!
- Gaffer
A incerteza abre espaço ao furacão de formas incessantemente adulteradas por sintetizador, bateria e saxofone emergidos do inferno (e à solta por cá esta semana).
Grande parte do interesse gerado pelos Talibam! passa pela falta de razão clara que se sente aos descalabros musicais que ensaiam e aos títulos que usam para identificar os mesmos. Ao servir como nome ao disco que edita agora a francesa Gaffer, Buns and Gutter encaixa em trocadilho com a febril faixa “Guns and Butter”, incluída na digressão imparável de Ordination of the Globetrotting Conscripts, mas, como o ovo e a galinha, mantém incerta a ordem de chegada que se possa associar aos dois títulos. Embora pareça casual a permuta das posições que ocupam o b e o g, o jogo verbal resulta em contraste em ambos os títulos que, para mais, aliam um termo agradável a um outro mais tóxico: brioches e valetas, armas e manteiga. Talvez seja mesmo esse o instinto inconsciente que move Matt Mottel e Kevin Shea na provocatória missão suicida que os une enquanto Talibam!: cavar um fosso gigantesco que albergue o ego criativo de ambos, ampliando até ao ponto do grotesco a distância que separa os pólos explorados. Existe tanta soberba como categoria nessa atitude.

Convenientemente, essa mesma gestão de arsenal interno aplica-se também à música praticada que, este ano, foi já dispersa por uma quantidade de lançamentos (de menor escala) que rondará a dezena. Entre sobras de longas sessões e out-takes sortidos distribuídos por várias labels, Buns and Gutter calha à Gaffer como um fava especial pelas revelações que proporciona a quem possa estar interessado em observar o comportamento esquizofrénico dos Talibam! numa marcha de progressão asperamente lenta (como a mão de um carrasco indeciso).

“When the Saints Go Marching In”, o lado-A subversivamente imbuído da espiritualidade de lado-B, evolui através de pequenos e convulsos tópicos jazz, partilhados entre bateria, sintetizador (medonho) e saxofone barítono, para, quando alcançada a marca dos 17 minutos de deriva livre, justificar o título adoptado na sua passagem pelas deturpadas notas de sintetizador claramente identificáveis ao popular tema gospel tipicamente americano. A anterior descrição assenta apenas a essa arrastada jam de 34 minutos, já que “I Wanna Be Nawty Tonite”- em jeito de homenagem a “TV Party” dos Black Flag – serve, ao invés, para provar que os Talibam! podiam ser tão aceleradamente dançáveis e imediatos como os Need New Body. O terrorismo destes Talibam! passa por ressuscitar a desconfiança de que tudo pode acontecer quando se favorece o convívio entre pelo menos dois músicos com comportamento de risco. Guns and Butter assegura que tudo acontece mesmo quando estes patifes andam à solta.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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