DISCOS
Tiny Vipers
Hands Across the Void
· 01 Ago 2007 · 08:00 ·
Tiny Vipers
Hands Across the Void
2007
Sub Pop / Popstock!


Sítios oficiais:
- Tiny Vipers
- Sub Pop
- Popstock!
Tiny Vipers
Hands Across the Void
2007
Sub Pop / Popstock!


Sítios oficiais:
- Tiny Vipers
- Sub Pop
- Popstock!
Songwriter espiritual reafirma que a canção pode ser também o processo que evapora o conto através de metáforas várias.
Numa altura em que ainda mantinham uma muito celebrada relação amorosa, os prodigiosos autores de cinema Spike Jonze (Inadaptado) e Sofia Coppola (Lost in Translation) mantinham como hábito partilhar mutuamente a experiência vivida com o visionamento de um filme descrevendo, acerca do mesmo, pareceres vários, em forma de resumo alargado e filtrados à maneira de cada um contar a história. Alongavam-se nos relatos talvez porque a carga sintética de uma sinopse nada tem de romântico. Além disso, calcula-se que fosse complicado para Sofia limitar a poucas palavras o entusiasmo acerca dos seus filmes predilectos do realizador Michelangelo Antonioni.

Da mesma forma, compreende-se que Jesy Fortino, escritora de canções revelada com o nome de Tiny Vipers, possa também sentir dificuldade em simplificar a complexidade dos episódios fantasmagóricos que relata na sua música ou, por outras palavras, em armazenar num tempestivo copo de água os medos pré-adultos de uma Laura Palmer. Hands Across the Void, produto de amadurecimento através de vários cd-r e primeiro disco pela Sub Pop, serve também como espelho à dimensão ilimitada das sete histórias que inclui: é esparso em termos dos recursos musicais (voz, guitarra acústicas e texturas em espiral), mas narrativamente aberto e livre, embora um pouco reticente nesse último aspecto.

A verdade é que na era pós-YS, qualquer cançonetista com dotes vocais mais peculiares arrisca fatalmente a comparação a Joanna Newsom, tanto mais, se mantiver a duração das suas músicas muito acima da marca dos quatro minutos. Pois, se para sustentar as prolongadas fábulas evocativas de YS, Newsom dispunha de fôlego sinfónico, inspiração imensa e impar habilidade para o storytelling, Jesy Fortino – várias vezes posicionada além dos cinco minutos - depende essencialmente da sua intuição feminina e do minimalismo para cantar os cantos da floresta raramente atingidos pelo sol (embora a impulsividade de “On This Side” parece contrariar essa abundância obscura). Num registo intimo, mas camuflado, próximo do que se conhece ao precioso The Grotto de Kristin Hersh, a moça Tiny Vipers aparenta ter convivido durante meses com os hábitos dos morcegos, mas parece indisposta a descrever além do alegórico o que testemunhou.

Porém, nem tudo é secretismo e o ponto que se acrescenta ao conto (e aos mais tradicionais discos de songwriter) reside nas texturas, destabilizadoras das fundações mais próprias da canção, extraídas a uma guitarra eléctrica contorcida em feedback (em “Forest on Fire”) ou a uma acústica mais empenhada em preencher ambientes através de ressonâncias. Todos esses servem como valiosos apontamentos que foram sendo integrados nas músicas com a mesma fluidez – pouco preocupada com formalidades – que se conheceu ao igualmente assombrado Haunted de um Complicado que continua a gerar saudades. Ambos os discos rejeitam obedecer à mais fácil forma do verso-refrão-verso, mas, a versatilidade que tornava Haunted distinto entre as suas várias divisões, passa à condição de repetitivo e amorfo no caso de um Hands Across the Void que funciona como instrumento de hipnose e nem tanto quanto isso enquanto disco de corpo inteiro.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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