Johnny Cash 1932 - 2003
· 12 Set 2003 · 08:00 ·
Johnny Cash (1932-2003) cantou a América, através do country, como poucos. Deixou um legado de canções impressionante, mas a sua vida não se resumiu às músicas que compôs. Morreu o compositor, o homem vivido e uma das mais fortes vozes que o séc. XX conheceu. Vítima da diabetes que lhe retirou grande parte da sua saúde nos últimos anos e que lhe debilitava o organismo devido a uma neuropatia autonómica, Cash tinha 71 anos, menos dois do que June Carter aquando da sua morte em Maio, pouco tempo antes. O primeiro casal da música country abandonou definitivamente as nossas vidas corpóreas. Mas a memória, o bem que nos permite guardar para sempre aqueles que um dia entraram no seio da nossa existência, terá sempre uma palavra a dizer. Johnny Cash continuará presente na estrada dos afectos, das recordações que valem a pena preservar. Para sempre.

Nasceu a 26 de Fevereiro de 1932, no Arkansas, numa quinta onde os pais tinham uma plantação de algodão. Aos 12 anos começou a escrever as primeiras canções. Eram sobre o trabalho no campo, mas a morte de um irmão mais velho que o marcaria durante muito tempo seria um elemento fundamental nas suas composições. Actuou, mais tarde, em rádios locais, e em 1950 abandona a escola, para depois se alistar na Força Aérea e ir cumprir serviço militar durante algum tempo na Alemanha. Quando volta ao país, casa-se com Vivian Liberto, a sua primeira mulher. A relação acabaria por se perder no início dos anos 60, quando Cash teve alguns problemas com a polícia e chegou mesmo a estar perto de se suicidar. Antes, assinara pela Sun Records de Sam Phillips, onde escreveu algumas canções de excepção e com as quais atingira o estrelato. Temas como “Cry, Cry, Cry” ou “Folsom Prison Blues” ficariam no Top 5 de Singles (os álbuns ainda não existiam como os conhecemos hoje), e “I Walk the Line” tornou-se no primeiro grande êxito country.
Quando o fim esteve perto depois daquele desentendimento com a mulher, que quase lhe custou a vida, apareceu June Carter, que se apaixonou por Cash e o resgatou de um fim precipitado. Em pouco tempo seriam gravadas algumas das suas obras-primas, como o álbum ao vivo numa prisão americana “At Folsom Prison”, considerado, quase unanimemente, um dos seus melhores momentos. Continuaria a arrecadar êxitos, e números como os mais de 50 milhões de álbuns vendidos e a inscrição de 25 singles nas tabelas de country entre 1958 e 1960 são representativos de uma lenda.
O homem de negro, como ficou conhecido, regressaria a toda uma legião de novos e velhos fãs em 1994, altura em que lança “American Recordings”, disco produzido por Rick Rubin (co-fundador da Def Jam e produtor de dezenas de álbuns de gente tão diversa como Beastie Boys ou The Mars Volta). Era, também, da série “American Recordings” o disco em que Cash trabalhava actualmente. Infelizmente, não chegou a ser completado. Diz-se que depois da morte de June Carter, Cash estava mais prolífico do que nunca, mas pouco antes de partir para a Califórnia, onde pretendia prosseguir as gravações, uma crise respiratória acentuada pela diabetes impediu esse objectivo.

Johnny Cash, o homem que cruzou o afinco e ingenuidade das origens do rock com uma compostura honesta tradutória de um estado de espírito, a espiritualidade do gospel com a crença e dedicação profunda à história americana, abandonou-nos num dia triste de Setembro. O que foi não volta a ser.
Tiago Gonçalves
tgoncalves@bodyspace.net

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