António Contador no reino do MySpace
· 05 Mar 2007 · 08:00 ·

A pop torna-se num animal estranho quando é feita por António Contador, personagem único na música portuguesa. Como outros descobriu no MySpace (reino supremo da partilha de experiências) uma forma de mostrar o que faz e - talvez mais importante - conhecer outros como ele - foi graças ao MySpace que conheceu os Calhau!, parceiros no crime e igualmente fãs de máscaras. O Bodyspace convidou-o a partilhar os seus pensamentos sobre a popular comunidade virtual. 

Comecei com o myspace porque um amigo meu, o Davide Balula, me disse que a sua página lhe estava a dar prazer. Tinha feito amigos e podia expor as suas músicas facilmente. Eu tinha a minha página mas totalmente ao abandono. Um baldio. Há imensos baldios no myspace, uns de propósito (percebe-se que há uma intenção estética) outros são simulacros ou aproximações. É fácil mudar o rosto da página. É fácil mudar de identidade. É fácil tudo. Hoje sou de Antigua e Barbuda.

Não sei como distinguir falsas identidades, não me preocupo com isso. Também adorei esse potencial de ir ao encontro de pessoas já nossas conhecidas de outra maneira ou de discos comprados e “bater-lhes à porta à hora de almoço, sentarmo-nos à mesa e comermos juntos”. Depois há o fio à meada. O myspace são caminhos, possíveis, que conduzem ao acaso até becos muitas vezes. Outras fazem-me fome porque fico horas a querer amealhar cromos. É fácil distinguir um amigo de um não-amigo. Basta um olhar fugaz sobre as cores, a foto, o tipo de letra. Em 30 segundos não sobram hesitações. Ou é ou não é. Geralmente não é. Quando é, é mesmo.

Já fiz bons amigos de quem não conheço o rosto nem as doenças. Gosto muito disso. Não gosto da expressão “mundo virtual” e de toda a conversa mais ou menos científica sobre os benefícios e malefícios das relações que se estabelecem pela internet. Não há paciência para todas as ponderações que o Mundo comporta. E sobretudo não me apetece que aquilo seja outra coisa: não quero ver o rosto nem sentir o cheiro de todos os buddies da net. Nem aturar todas as conversas que uma relação de amizade fora da internet reclama. Esse espaço de manobra criado na realidade desses encontros é muito saudável porque permite ir ao essencial: a amizade. Ninguém manda ninguém à merda no myspace. Ninguém diz que a sua música é uma perda de tempo. Ninguém insulta ninguém.

Bem sei que as amizades podem ter interesse em ser mais do que isso, mas aqui fica o que se vê do iceberg, e todos acham isto suficiente. Há por isso uma ideia subjacente de “comunidade”: a partilha de um código implícito de comportamento, selecção e reprodução (que ultrapassa o código parvo que toda a gente aceita para poder ter uma página no myspace). Aqui a “selecção” é dos possíveis (identidades ou ‘profiles’, músicas, amigos, layouts, etc) e a “reprodução” das redes de relacionamento assentes na troca. Sendo que a troca traduz aqui um investimento – claro! - afectivo não forçosamente igualitário. Ninguém faz amigos no myspace tendo como critério o facto das músicas disponibilizadas serem downloadáveis. Ou serem quatro e não duas. Ou terem fotos ou desenhos a ilustrá-las. Fazem-se amigos por conveniência (‘tanx for adding me’) mas sobretudo por gosto, por excitação.

O meu próximo investimento é o Hi5.

Pedro Rios
pedrosantosrios@gmail.com

Parceiros