Festival New Sounds of Portugal
Parque Palmela, Cascais
18 Set 2004
Com tanta oferta na área de Cascais de concertos de entrada livre, tais como o de Rui Veloso no Casino Estoril, não é de estranhar que o Parque Palmela, onde se realizou o Festival New Sounds of Portugal (NSOP), estivesse às moscas no segundo dia do mesmo. Para quê ver novos valores da música portuguesa, dois dos quais a cantar e bem em português, quando se pode ver o velho Veloso a tocar as mesmas velhas canções, como sempre cantou?
O começo do segundo e último dia do festival foi marcado pelo atraso do baterista dos Le Divan, Cândido Guerra. Isto fez com que Nuno Prata, não acompanhado pelo seu amigo Nicolas Tricot, tivesse de abrir a noite. Nuno, baixista dos extintos Ornatos Violeta, no seu projecto Nuno, Nico, escreve canções que soam um pouco como algumas dos tempos iniciais da sua antiga banda. Fortemente influenciado pela bossanova, as suas canções são normalmente embelezadas pelos múltiplos instrumentos tocados por Tricot. Infelizmente este não estava presente, o que levou a que Nuno Prata estivesse um pouco destreinado para aquele registo. Para além do mais, o seu projecto não funciona bem em espaços ao ar livre, funciona melhor em registos mais intimistas. Mas lá foi ele com as suas belas canções, muito inseguro, a enganar-se algumas vezes, entre outras coisas. "É só mais um dia mau", já cantava Manel Cruz, o vocalista da anterior banda de Nuno. Mas mesmo assim, notou-se o gozo que deu a Nuno Prata quando alguns membros do público assobiavam uma parte de "Nada é tão mau", que normalmente tem a ajuda do multi-instrumentista francês. Esta canção, digo eu, devia ser single, quando for lançado o álbum.
Com isto, começaram os Le Divan. Ora se o baterista fez atrasar todo um festival marcado para as nove da noite, seria de esperar que este fosse uma parte importante da banda. Mas não. Limitou-se, durante todo o concerto, entre entradas fora do tempo, a marcar exactamente o mesmo ritmo 4/4. Os Le Divan são liderados por Peter de Cuyper, um belga que é conhecido por ser o "Repórter Belga" do programa Perfeito Anormal do canal SIC Radical da TV Cabo, ou por ser produtor de espectáculo. Um belga numa banda portuguesa a cantar em inglês. A isto sim, chama-se globalização. Fazendo um som perfeitamente ignorável, os Le Divan deambulam pelos sons electrónicos e por uma atmosfera cinematográfica, com baixos groovy, teclados etéreos, loops de piano, theremin e a voz filtrada de de Cuyper. Não fazem mal a ninguém, mas o que fazem até nem fazem mal.
Os Stowaways, depois de terem ganho o Termómetro Unplugged e do EP ...Why not you?, lançado em conjunto com os Alla Polacca na editora Bor Land, tiveram o seu single "Amputated Leg" a passar nas rádios com alguma frequência. Não sei quem disse que este single soa como Thom Yorke dos Radiohead bêbedo no Carnaval do Rio de Janeiro, mas essa descrição assenta que nem uma luva. No palco, Thom Yorke está, ainda, bêbedo a dançar a polka em Moscovo, ou mesmo nas ruas em Paris. E tudo isto de uma só assentada. Bons instrumentistas, os Stowaways dividem-se pelos devaneios instrumentais e pelas canções propriamente ditas. E às vezes misturam as duas coisas. Conseguem manter um espectáculo agradável. O vocalista continua a ligar-se muito ao registo de Thom Yorke (se bem que o baterista vá buscar ao estranho vocalista dos Radiohead muitos tiques), mas a música não podia estar mais longe de Radiohead.
Já lá para a meia noite e quarenta, entra em palco o Quinteto Tati. Antes do concerto, JP Simões, o vocalista e letrista deste sexteto dizia, enquanto pedia uma imperial: "Hoje não é para abusar.". Mas o "não abusar" de JP Simões não é o "não abusar" do resto das pessoas. Entre valsas, rumbas e devaneios jazzísticos, o Quinteto Tati não é uma banda normal. Cheio de músicos extremamente dotados e movido pelo carisma de Simões, um concerto do Quinteto Tati nunca poderá ser mau. Tudo o que o vocalista diz é para anotar. "Somos o Quinteto Tati, nós os seis." As letras absurdas de JP Simões e as composições de Sérgio Costa, nas teclas, bem como o que tocam óptimos instrumentistas que os acompanham, tornam o Quinteto Tati uma das melhores bandas portuguesas da actualidade. Estes têm a escola toda, e já no tempo dos Belle Chase Hotel aprenderam a entreter. Os temas do disco Exílio, deste ano, deram mote a este concerto. Gostava de poder dizer que se tornam melhores ao vivo, mas há momentos em que isso não é verdade. Especialmente em "Suor e Fantasia", o single, e "No Jazz", o único tema anglo-saxónico, "para relembrar os tempos em que eram americanos em Portugal", a falta da voz de Petra, dos Nobody's Bizness, faz-se sentir. Ainda assim, o Quinteto Tati impressiona ao vivo. E muito. Em "Rumba dos Inadaptados", mesmo que JP Simões esteja a encarnar uma personagem, a linha "Eu não tomo drogas / não sou alcóolico" ganha todo um novo significado quando cantado por um homem de cigarro numa mão e imperial noutro.
É de louvar a iniciativa da associação 100ideias de ter organizado este festival, que apesar de não ter tido quase nenhuma afluência, e de não ter sido tudo aquilo que podia ser, encheu algumas medidas aos poucos que lá foram. A dada altura do concerto do Quinteto Tati, JP Simões dedicou "Rumba dos Inadaptados" ao actual governo, e também ao anterior. Durante a administração do anterior governo, os horários da CP mudaram. Os últimos comboios passaram a sair à uma e meia da manhã, em vez das duas e meia anteriores. Por este facto, não me foi possível ver o final do concerto do Quinteto Tati. Tive de voltar a Lisboa. Pelo menos saí ao som da melhor faixa do disco para o regresso a casa, "Mais uma para o caminho". Cascais, ao contrário do que se pensa, não é Lisboa, e depois da uma e meia da manhã fica muito mais longe.
O começo do segundo e último dia do festival foi marcado pelo atraso do baterista dos Le Divan, Cândido Guerra. Isto fez com que Nuno Prata, não acompanhado pelo seu amigo Nicolas Tricot, tivesse de abrir a noite. Nuno, baixista dos extintos Ornatos Violeta, no seu projecto Nuno, Nico, escreve canções que soam um pouco como algumas dos tempos iniciais da sua antiga banda. Fortemente influenciado pela bossanova, as suas canções são normalmente embelezadas pelos múltiplos instrumentos tocados por Tricot. Infelizmente este não estava presente, o que levou a que Nuno Prata estivesse um pouco destreinado para aquele registo. Para além do mais, o seu projecto não funciona bem em espaços ao ar livre, funciona melhor em registos mais intimistas. Mas lá foi ele com as suas belas canções, muito inseguro, a enganar-se algumas vezes, entre outras coisas. "É só mais um dia mau", já cantava Manel Cruz, o vocalista da anterior banda de Nuno. Mas mesmo assim, notou-se o gozo que deu a Nuno Prata quando alguns membros do público assobiavam uma parte de "Nada é tão mau", que normalmente tem a ajuda do multi-instrumentista francês. Esta canção, digo eu, devia ser single, quando for lançado o álbum.
Com isto, começaram os Le Divan. Ora se o baterista fez atrasar todo um festival marcado para as nove da noite, seria de esperar que este fosse uma parte importante da banda. Mas não. Limitou-se, durante todo o concerto, entre entradas fora do tempo, a marcar exactamente o mesmo ritmo 4/4. Os Le Divan são liderados por Peter de Cuyper, um belga que é conhecido por ser o "Repórter Belga" do programa Perfeito Anormal do canal SIC Radical da TV Cabo, ou por ser produtor de espectáculo. Um belga numa banda portuguesa a cantar em inglês. A isto sim, chama-se globalização. Fazendo um som perfeitamente ignorável, os Le Divan deambulam pelos sons electrónicos e por uma atmosfera cinematográfica, com baixos groovy, teclados etéreos, loops de piano, theremin e a voz filtrada de de Cuyper. Não fazem mal a ninguém, mas o que fazem até nem fazem mal.
Os Stowaways, depois de terem ganho o Termómetro Unplugged e do EP ...Why not you?, lançado em conjunto com os Alla Polacca na editora Bor Land, tiveram o seu single "Amputated Leg" a passar nas rádios com alguma frequência. Não sei quem disse que este single soa como Thom Yorke dos Radiohead bêbedo no Carnaval do Rio de Janeiro, mas essa descrição assenta que nem uma luva. No palco, Thom Yorke está, ainda, bêbedo a dançar a polka em Moscovo, ou mesmo nas ruas em Paris. E tudo isto de uma só assentada. Bons instrumentistas, os Stowaways dividem-se pelos devaneios instrumentais e pelas canções propriamente ditas. E às vezes misturam as duas coisas. Conseguem manter um espectáculo agradável. O vocalista continua a ligar-se muito ao registo de Thom Yorke (se bem que o baterista vá buscar ao estranho vocalista dos Radiohead muitos tiques), mas a música não podia estar mais longe de Radiohead.
Já lá para a meia noite e quarenta, entra em palco o Quinteto Tati. Antes do concerto, JP Simões, o vocalista e letrista deste sexteto dizia, enquanto pedia uma imperial: "Hoje não é para abusar.". Mas o "não abusar" de JP Simões não é o "não abusar" do resto das pessoas. Entre valsas, rumbas e devaneios jazzísticos, o Quinteto Tati não é uma banda normal. Cheio de músicos extremamente dotados e movido pelo carisma de Simões, um concerto do Quinteto Tati nunca poderá ser mau. Tudo o que o vocalista diz é para anotar. "Somos o Quinteto Tati, nós os seis." As letras absurdas de JP Simões e as composições de Sérgio Costa, nas teclas, bem como o que tocam óptimos instrumentistas que os acompanham, tornam o Quinteto Tati uma das melhores bandas portuguesas da actualidade. Estes têm a escola toda, e já no tempo dos Belle Chase Hotel aprenderam a entreter. Os temas do disco Exílio, deste ano, deram mote a este concerto. Gostava de poder dizer que se tornam melhores ao vivo, mas há momentos em que isso não é verdade. Especialmente em "Suor e Fantasia", o single, e "No Jazz", o único tema anglo-saxónico, "para relembrar os tempos em que eram americanos em Portugal", a falta da voz de Petra, dos Nobody's Bizness, faz-se sentir. Ainda assim, o Quinteto Tati impressiona ao vivo. E muito. Em "Rumba dos Inadaptados", mesmo que JP Simões esteja a encarnar uma personagem, a linha "Eu não tomo drogas / não sou alcóolico" ganha todo um novo significado quando cantado por um homem de cigarro numa mão e imperial noutro.
É de louvar a iniciativa da associação 100ideias de ter organizado este festival, que apesar de não ter tido quase nenhuma afluência, e de não ter sido tudo aquilo que podia ser, encheu algumas medidas aos poucos que lá foram. A dada altura do concerto do Quinteto Tati, JP Simões dedicou "Rumba dos Inadaptados" ao actual governo, e também ao anterior. Durante a administração do anterior governo, os horários da CP mudaram. Os últimos comboios passaram a sair à uma e meia da manhã, em vez das duas e meia anteriores. Por este facto, não me foi possível ver o final do concerto do Quinteto Tati. Tive de voltar a Lisboa. Pelo menos saí ao som da melhor faixa do disco para o regresso a casa, "Mais uma para o caminho". Cascais, ao contrário do que se pensa, não é Lisboa, e depois da uma e meia da manhã fica muito mais longe.
· 18 Set 2004 · 08:00 ·
Rodrigo Nogueirarodrigo.nogueira@bodyspace.net
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