Ryoji Ikeda
Museu Nacional Reina Sofia, Madrid
12 Jul 2006
Sabe-se que Ryoji Ikeda é um dos nomes mais importantes e inovadores da electrónica experimental made in Japan, titulo que se pode igualmente ampliar para o panorama internacional. Somando-se uma actuação sua em Madrid – no fantástico Museu Nacional Reina Sofia – com o facto dos bilhetes serem gratuitos o resultado é uma procura brutal pela mágica entrada que desse acesso ao local do concerto. Cerca de uma horas antes do início da actuação já se amontoavam pessoas numa fila que cedo de desfez com o aviso de que já não haveria mais entradas. Os felizes contemplados, quando dentro da sala, viam-se sentados num anfiteatro e com várias colunas ao seu redor, em círculo, digamos, fechado (facto com certeza não inocente). Havia também quem ocupasse o palco vazio da sala, ficando assim virado de para o público e para Ryoji Ikeda, que apresentava-se nas costas da plateia, na ‘mesa de som’, como se se preparasse para conduzir o público por uma viagem. E assim foi.

A actuação acontecia com um propósito claro. A apresentação do fantástico Dataplex, o disco do japonês editado pela Raster-Noton em 2005. Ryoji Ikeda é conhecido por explorar a causalidade do som com a percepção humana, intenção que se torna ainda mais óbvia quando o japonês se encontra numa posição de transpor a sua música dos discos para os concertos – e as condições da actuação privilegiavam precisamente essa relação intima do som com os ouvintes. Há de facto uma certa matemática nas composições de Ryoji Ikeda, há realmente algo que provoca uma certa ausência de espaço e de tempo, um jogo cerebral entre aquilo que existe e aquilo que é criado artificialmente. E para isso Ryoji Ikeda apropria-se da geometria, da arquitectura, da projecção de representações imaginárias (a sala manteve-se escura do inicio ao fim), do minimalismo. Nada parece acontecer por acaso, nada acontece por acaso, nada pode acontecer por acaso.

Perto do final da actuação (que foi sublime em todos os sentidos), com duração prevista para 60 minutos, Ryoji Ikeda apresentou “Data.Matrix”, a peça central de Dataplex (com cerca de 10 minutos em disco), não só por pelo seu tamanho mas também por concentrar dois lados distintos e igualmente apreciáveis: por um lado a exploração de ambiências paisagísticas frias mas cativantes, e por outro a hipnotizante racionalidade das batidas e do ruído branco. Ao vivo tudo ganha uma nova dimensão: o que tem peso tem ainda mais peso, as camadas ganham diferentes formas, espessura e volume, e a certa altura alguns fragmentos vagueiam aleatoriamente pelo cérebro de quem escuta mais atentamente. Como resultado, eram bastantes aqueles que, em cima de palco, se deitaram de olhos fechados para apreciar melhor a viagem. A actuação de Ryoji Ikeda, sem ser convidativa a um sentimento ou experiência zen, foi quase terapêutica.
· 12 Jul 2006 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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