DIA 2 |
Josephine Foster © Ana Sofia Marques |
Sondre Lerche está apaixonado, é oficial. A outros escritores de canções e domadores de emoções ter-lhes-á feito bem, mas ao norueguês, e a julgar pelos temas que disse ter composto muito recentemente para o seu próximo disco, é possível que o tiro lhe saia pela culatra – afinal de contas escrever sobre amor sem se cair em lamechismos e pieguices não é para todos e Sondre Lerche devia saber disso. Mas o concerto não foi só um desfilar de amor e parentes próximos. Foi, no geral, um apresentar de canções com menos ou mais acentuação no rock, com guitarra acústica ou eléctrica; um concerto que mostrou que Sondre Lerche até é um bom guitarrista mas que é um escritor de canções mediano, sem grandes rasgos de talento – há, diga-se, exportações muito melhores vindas da Noruega. Esteve bem ao cantar em português (muitas vezes bem conseguido) uma canção de Milton Nascimento descrita pelo norueguês como sendo uma canção sobre a América e sobre chocolate. E com razão: “Coração americano / acordei de um sonho estranho / Um gosto de vidro e corte / Um sabor de chocolate / No corpo e na cidade / Um sabor de vida e morte / Coração americano / Com sabor de vidro e corte / A espera na fila imensa / E o corpo negro se esqueceu / Estava em San Vicente / A cidade e suas luzes”. É que ao que parece Sondre Lerche cantou com Milton Nascimento há cerca de um ano numa Igreja em Noruega e ainda se recordava da letra da canção de “San Vicente”. Do seu último disco - Two way monologue - saíram “Days that are over” e, já lá para o fim, a própria “Two way monologue”, que acabou por ser um dos melhores momentos do concerto – esse e a ocasião em que pegou numa canção de Elvis Costello.
Sondre Lerche © Ana Sofia Marques |
Patrick Wolf é uma criatura estranha e não é só pela forma como se veste; não é só por parecer saído de uma cena de A Lagoa Azul. É-o essencialmente por escrever canções que serpenteiam por vários géneros musicais e acabar sempre por se colocar à deriva dos mesmos. Patrick Wolf nasceu praticamente com a música - quer em termos pessoais quer em termos familiares – e com 23 anos é já senhor de dois discos, e o terceiro já está à vista. Veio a palco para sentar-se nos teclados mas mais tarde havia de pegar no violino (que pouco usou pois o arco não pareceu querer nada com as suas canções), ukulele barítono e ukulele soprano. A plataforma de partida para as canções constrói-se algures entre a folk, o rock e a música electrónica e ao vivo contou com a presença de um baterista. Mas para além de tudo isto, uma das coisas que mais chamam – e chamaram – à atenção é a voa de Patrick Wolf, ao mesmo tempo cristalina e excêntrica. Obviamente Wind in the Wires, o último disco do britânico, não foi coisa para ser esquecida: “Wind In The Wires” e lá para perto do fim “The Libertine” surgiu para alegria de alguns presentes que se manifestaram a preceito. O bom gosto de Patrick Wolf não é só na música pois havia de mostrar uma canção com palavras de W.B.Yeats, o seu poeta favorito. Mas ainda na música – e numa noite forte em versões – Patrick Wolf acabaria por trazer a palco Kate Bush com o tema “Running up that hill” onde às tantas se diz “And if I only could, I'd make a deal with God / And I'd get him to swap our places / Be running up that road / Be running up that hill / Be running up that building / Say, If I only could, oh...”. Feitas bem as contas, Kate Bush fazia e fez todo o sentido. Quanto mais não fosse para cimentar a actuação de Patrick Wolf como a melhor do segundo dia. Há muito mais por chegar vindo do britânico. É fácil perceber isso. E o mesmo se pode dizer do Festival Para Gente Sentada.
Patrick Wolf © Ana Sofia Marques |
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DIA 2 |