Super Bock Super Rock
Herdade do Cabeço da Flauta, Meco
17- Jul 2014
À vigésima edição, a maturidade e a direcção do Super Bock Super Rock continuam a ser questionáveis, mas há pelo menos uma coisa de que o festival se pode orgulhar: a destreza com que evitou o fim desolador, depois de sucessivos tropeções que levaram os Xutos e Pontapés a encabeçar este festival que andou por Vigo, Madrid, Porto e Luanda antes de renascer, com relativa certeza, numa herdade do Meco.

Esqueçam-se as questões relacionadas com o circo social que vai acontecendo no seio do festival, os assaltos sensoriais das dezenas de marcas que procuram tanto protagonismo como a música, ou o tempo que se perdeu em castings para encontrar as bartenders impecavelmente vestidas do festival e o primeiro dia do SBSR era um verdadeiro mimo. Seis horas ao som de Tame Impala, Massive Attack, Panda Bear e Disclosure.

Massive Attack © José Miguel Silva

Rola a bola no Meco e ao chegar, os Metronomy estão prontos para tomar o palco. Chegam adoravelmente alvos, rodeados de nuvens rosa e sempre prontos a acenar com a ladainha de “Portugal é o melhor país de sempre”. A lenga-lenga é tão inofensiva como a música dos Metronomy, ora açucarada e estriónica, ora forçosamente celebratória, mas que encontrou eco no meio do público. Aquecimento feito – e prontamente esquecido –, era hora de dizer olá a Kevin Parker e companhia.

Tame Impala © José Miguel Silva

Os Tame Impala preconizam uma geração pós hip-hop, que adopta o centralismo rítmico da melhor forma. Batidas e linhas de baixo redondinhas (“Elephants” e “Feels Like We Only Go Backwards” colam-se que nem uma lapa à cabeça) que, com a torrente de melodia ébria à mistura, fazem de todas as canções dos australianos verdadeiros hinos instantaneamente reconhecíveis. Mais que andar à boleia do revivalismo, os Tame Impala vão reiventando um género quase como quem não quer a coisa – e nós agradecemos com uma vénia sincera - mesmo que o som e a curta duração do concerto tenham impedido (ou atrasado) a comunhão total entre público e banda.

Tame Impala © José Miguel Silva

Sem reinventar – e sem interesse ou necessidade de reinventar – aquele que é o seu próprio som, os Massive Attack chegavam pela 15ª vez a Portugal. Quem os segue e conhece bem, garantia-me atempadamente que eles, ao contrário do festival, são como um whisky de 20 anos. E a verdade é que o colectivo de Bristol envelheceu com classe. Dos painéis de LED – fonte de distracção de tempos a tempos, mas essenciais para expor o lado activista da banda que até teve direito a uma referência ao BES -, à presença de Martina Topley-Bird a fazer esquecer quem é a verdadeira voz de “Teardrop”, ou Horace Andy a transportar-nos para um mundo nebuloso em “Angel” e “Splitting The Atom”. Sob a batuta de Robert Del Naja e Daddy G, os Massive Attack envolveram o Meco numa massa sonora com tanto de implacável, como de gentil. E nem quando surgiram a flirtar com o ruído e a tensão de “Future Proof” deixaram de ser capazes de nos conduzir numa gigante catarse colectiva.

À verdadeira tareia emocional, seguiu-se a rede de segurança e conforto ébrio de Panda Bear no palco EDP. Confirmou-se a aura de surrealidade que lhe denotámos no Lux (e que aqui foi agravada pela parca iluminação, os strobes intensos e as projecções impróprias para epilépticos) e a capacidade de variar suavemente entre o onirismo puro e temas dançáveis de ginga redondinha que fez dançar os poucos que quiseram embarcar com Noah Lennox nos seus altos voos.

Panda Bear © José Miguel Silva

Sabendo a pouco os vinte minutos de Panda Bear, não tendo dançado devidamente em Massive Attack, o SBSR estava literalmente a ressacar de dança e os Disclosure estavam ali para matar a traça. Puros entertainers, executantes exímios, os Disclosure aliviam desde logo toda a eventual pressão e expectativa ao arrancar com “F for You” e “When the Fire Starts to Burn”, ficando com caminho aberto para dominar aquela pista momentanea com tal pujança que, durante cinco minutos, nem o PA os segurou. Goste-se ou odeie-se, e num mundo em que a EDM parece ser real, é bom que seja a dupla britânica a ser escolhida para cumprir o propósito de festa. E embora nunca vá sequer sacar um disco deles, soube bem a rendição à dança fácil.
· 27 Jul 2014 · 20:02 ·
António M. Silva
ant.matos.silva@gmail.com
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