Rock in Rio Lisboa
Parque da Bela Vista, Lisboa
29-01 Jun 2014
A urbe desperta sobre as ruínas de uma final que não pedimos nem quisemos por aí além, tentando afogar o caos da invasão espanhola com a boa nova de uns poucos raios de sol, e com o rock, esse sentimento juvenil e eterno que hoje se apresenta aliado a "in Rio": é o primeiro dia do festival feito a pensar nas famílias, principalmente se forem brancas, heteronormativas, numerosas e de classe média. O caos e a invasão têm agora outros nomes, personificados pela atitude do polícia que se escusa a abrir uma das grades dispostas na avenida para que a imprensa possa ir cumprir o seu trabalho. Não que "trabalho" seja o nosso forte para hoje - até porque o nosso fotógrafo designado está ainda em Ponte de Lima a ouvir Smiths -, sendo que a oferta musical é escassa e a vontade de nos aventurarmos pelo enorme recinto desbravando o frio e cansando as pernas ainda menor.

Resta-nos uma sala onde álcool é mentira vã, e umas poucas incursões através das filas gigantescas almejando um pequeno pedaço plástico a que possam chamar recordação, com o logótipo Vodafone para que não nos esqueçamos que este é um festival feito e para grandes corporações. 61€ para esperar quatro horas por um bote de borracha ou uma fatia de pizza. Nada contra: cada qual que se divirta como queira. E divertem-se, e muito, cantando em uníssono "Princesa" ou "Sexta-Feira" quando Boss AC e Áurea inauguram o palco principal, eles que até cantaram "Happy" de Pharell Williams para capitalizar a popularidade de uma canção que até é boa (mas as pessoas não deixam de ser umas idiotas).

Trouxe o carregador para o caso de ficarmos sem bateria, ouve-se por aí, e pensamos que afinal ter ou não ter fotógrafo para hoje é absolutamente irrelevante num mar de selfies e dedicatórias com selo Instagram. Poucos são os que sentem a necessidade de um pouco de música, e poucos eram os verdadeiros fãs de SILVA dispostos em frente ao palco secundário quando este e sua banda aí começam o seu espectáculo, feito a pensar em editores de webzines que ninguém lê e não em quem acha que o brasileiro é simplesmente uma má versão de Roberto Carlos com pó indie espalhado na cuca e teclados Coldplay-maiores-do-que-a-vida.

E por falar em maior do que a vida, há um senhor que se não o é anda lá perto. A nossa credibilidade ficará manchada, mas cá vai: Robbie Williams apresentou-se ora em modo pop de estádio ora em modo swing (e, no que concerne a este último, infelizmente não tem jeitinho nenhum para a coisa embora bem tente) e proporcionou, se não um bom concerto, um belíssimo espectáculo. Dono e senhor do palco, mas não das canções, mesmo que inicie com "Let Me Entertain You" - e fê-lo, de forma exímia, durante hora e meia. Exibindo um fraque invejável e um leque de temas a relembrar os nineties, e não só, que puxaram à entoação e esbracejar do muito público presente (o que, num dia negro com a vitória da Frente Nacional em França, daria um estudo sociológico engraçado), Williams deu tudo ao público. I love both blondes and brunettes, canta ele, e pensamos que pelo menos nisso está errado porque a ruiva é *o* ser, mas perdoamos-lhe o cliché em matéria de gosto quando arranca em medleys ora de "We Will Rock You" / "I Love Rock 'n' Roll", ora de "Walk On The Wild Side" / "I Still Haven't Found What I'm Looking For", ora de "Wonderwall" / "Song 2"... um cardápio para todos os gostos de alguém que sabe como cativar uma audiência. E foi bonito ver milhares de pessoas a cantar "Feel" e "Angels", a fechar. Nós incluídos. Fossem todos os quarentões assim.
· 05 Jun 2014 · 23:14 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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