SEMIBREVE 2012
Centro Cultural Vila Flor, Guimarães / Theatro Circo, Braga
4-6 Out 2012
SEMIBREVE conseguiu a espécie de proeza que é encher salas com música de minorias, sem concessões, sem facilitismos. Em tempos como aqueles que correm, é obra. Em Guimarães, onde arrancou o festival em ano de Capital Europeia da Cultura, a sala principal do Centro Cultural Vila Flor esteve longe de esgotar mas nem isso impediu o SEMIBREVE de arrancar com o pé direito.

Com duas velocidades distintas diga-se. Se por um lado Pole transpôs para palco uma interpretação continuamente interessante daquilo que se passa nos seus discos, com a ajuda de baixos poderosos (e com os visuais de p.ma, como quem diz Pedro Maia, que soube muito bem ir buscar inspiração às capas dos discos de Stefan Betke), Vladislav Delay, com visuais de AGF, não foi sempre eficaz na hora de passar para palco o carácter mais exploratório do seu trabalho. O concerto do finlandês esteve longe de ser desinteressante, mas esteve sempre um pouco longe do impacto dos seus discos. Não deu para ver muito da actuação de Grischa Lichtenberger no Café Concerto do CCVF mas pareceu estar à altura da programação do festival.

© Adriano Ferreira Borges

Em Braga, no primeiro de dois dias de festival no Theatro Circo, já com a sala cheia e confortável, a noite reservava três concertos em tudo distintos. Uma enorme surpresa, um concerto acima da média e uma enorme desilusão. Comecemos pelo princípio. Roly Porter, com Flicker nos visuais, abriu a noite de sexta-feira com um enorme concerto, o melhor até então. A sua música, longe de ser directa e de fácil absorção, gerou momentos de verdadeira beleza pela sua qualidade textural, pela não cedência à ditadura do ritmo, e pelas cordas habilmente manipuladas entre paisagens densas e taciturnas. Um momento alto do festival.

Na sala secundária – chamemos-lhe assim – do Theatro Circo, acessível apenas aos que decidiram comprar o passe geral do festival, em tempo útil, uma proposta distinta no contexto do festival: a electrónica cerebral mas ao mesmo tempo física de emptyset, constantemente próxima do techno, suscitou o convite para um pé de dança que infelizmente esbarrou nas cadeiras da sala. Se não fossem os últimos vinte minutos de repetição de algumas formas previamente exploradas, a nota seria ainda mais positiva. Talvez no futuro se abra no SEMIBREVE uma porta para uma espécie de after mais dedicado à dança.

A fechar a noite, uma enorme desilusão. O concerto dos Mouse on Mars teve mais momentos desinteressantes do que atractivos e a proposta da dupla pareceu sempre bastante desfasada em relação à restante programação do SEMIBREVE, apesar da qualidade técnica dos seus executantes. A espaços, o som dos Mouse on Mars pareceu até algo datado. Talvez noutro contexto, talvez noutro espaço, mas naquela noite esteve sempre muito longe de resultar.

E porque tudo o que é bom acaba rápido, a noite de sábado tratou de fechar as cortinas da segunda edição do SEMIBREVE. A noite começou bem. Aliás, a noite começou de forma fantástica. Durante cerca de uma hora, o japonês Ryoji Ikeda provou porque é que joga num campeonato só seu e sujeitou a sua plateia aos poderes da sua matematrónica, tal o poderia físico das suas composições. Não há um milímetro de som ao acaso: tudo é parte essencial de um plano. Um grande plano: suscitar uma experiência sensorial e física inesquecível. O grande momento do festival aconteceu quando Ryoji Ikeda apresentou, mesmo ao cair do pano, a infalível “data.matrix”, uma epopeia de dez minutos que há-de ser uma das sete maravilhas da música electrónica. Inesquecível.

Na sala secundária do Theatro Circo, Gustavo Costa, o único músico português em prova, apresentou-se enquanto Most People Have Been Trained to be Bored para mostrar como as paisagens electrónicas que compôs casam bem com a percussão em tempo real que explora a seu bel-prazer. Em menos de uma hora, Gustavo Costa preencheu com todo o tipo de instrumentos de percussão paisagens pós-apocalípticas e soube representar bem as cores da sua equipa.

A fechar o SEMIBREVE, Ben Frost trouxe a Braga o mais recente By the throat para entusiasmo satisfação de alguns entusiastas. Mas a verdade é que, apesar da força das suas composições e da intensidade com que as expõe em palco, apesar da qualidade da interpretação, apesar de alguns momentos de interesse, Ben Frost foi sempre mais força que impacto real, mais aparato do que substância, mais fórmula do que resultado. O que não o impediu de receber a maior ovação de todo o festival e de fechar mais um belíssimo SEMIBREVE com o entusiasmo que este merece pelo arrojo da sua programação. Que tenhamos a sorte de ter um destes todos os anos.
· 10 Out 2012 · 16:37 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net

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