THEESatisfaction
Galeria Zé dos Bois, Lisboa
17 Abr 2012
awE naturalE (Sub Pop, 2012) está para 2012 como Black Up (Sub Pop, 2011) esteve para 2011 – duas pedradas no charco lodoso do hip hop, os LP de estreia, respectivamente, das THEESatisfaction e de Shabazz Palaces. Curiosamente, ambos com o selo da mesma Sub Pop que exponenciou o grunge de Seattle nos idos anos 90 e, entretanto, reemergiu através da folk revigorada de Fleet Foxes e afins. Uma editora pautada por sucessivos processos de reinvenção, portanto, desta feita numa tentativa de resgate das raízes profundas do hip hop, toldado pela dialéctica machismo-violência-materialismo do “gangsta rap”.

© Emília Salta

As THEESatisfaction, casal de lésbicas afro-americanas (Stasia Irons e Catherine Harris-White) oriundas de Seattle, assumem-se como uma contraluz feminista e espiritual, na senda da “daisy age” do hip hop (De La Soul, A Tribe Called Quest, etc.). Vão beber inspiração ao funk, à soul e ao jazz, para depois os fusionarem com partículas electrónicas, por vezes naquele caos ordenado à Flying Lotus, tal como Ishmael Butler procura fazer nos Shabazz Palaces (por sua vez, sucedâneos dos Digable Planets, embora mais sofisticados). Não por acaso, as THEESatisfaction colaboraram na feitura de Black Up, dando voz a duas faixas.

© Emília Salta

Na actuação ao vivo a 17 de Abril, na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, as THEESatisfaction passaram em revista todas as pérolas de awE naturalE, com veemência e boa disposição. No entanto, limitaram-se a dançar e cantar por cima de estruturas pré-gravadas num laptop, algo que não deixa de retirar valor ao exercício. Faltou por isso espontaneidade e capacidade de superação. Foi como ouvir o disco em versão “karaoke”, interpretado pelas próprias Stasia e Catherine, é certo, mas com poucas variações relativamente ao material original. Numa sala à pinha, celebrando o groove de “Deeper” ou as batidas quebradas de “Juiced”.

© Emília Salta

Esperávamos mais, para além da mera reprodução do disco. Um excelente disco, sem dúvida, mas que poderia tornar-se ainda mais estimulante através das derivações próprias da interpretação em palco, as pontas soltas, as reconversões e adaptações, no espaço (a sala de espectáculos) e no tempo (a disposição do momento). Ao que se acresce a escassa interacção com o público, apesar de no final nos terem brindado com uma sessão de gira-discagem na cave, polvilhada por muitas das suas referências sonoras. Talvez numa próxima oportunidade as THEESatisfaction estejam à altura das circunstâncias: uma das melhores surpresas de 2012.

© Emília Salta
· 19 Abr 2012 · 00:41 ·
Gustavo Sampaio
gsampaio@hotmail.com

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