Wim Mertens
Casa das Artes, Famalicão
15 Jun 2005
A história diz-nos que é longa a lista de artistas que ao piano maravilharam meio mundo. Uns mais excêntricos, outros mais contidos e reservados. Alguns sozinhos, outros com banda. Muitos usando a voz, outros utilizando somente o piano. As primeiras condições de cada última das três frases anteriores servem na perfeição para que se aponte, em termos gerais, como foi o concerto de Wim Mertens em Famalicão, numa altura em que se celebra os seus 25 anos de carreira. Três anos depois de ter esgotado a Casa das Artes de Famalicão, Wim Mertens, um dos nomes incontornáveis da música contemporânea, voltou ao mesmo local para a mesma sorte de bilheteira. E voltou igualmente a um piano que - diz-se – agrada bastante ao belga, voltou provavelmente a observar algumas das caras que havia observado em 2002, voltou com um disco onde junta a sua execução rápida e quase furiosa ao piano à sua voz ora angelical, ora quase divina: esse disco é Un Respiro, um disco que ameaça fazer parte das listas mais ecléticas de melhores discos de 2005 (ou, geek mode on, quem sabe, das listas de melhores discos do primeiro semestre).

A música de Wim Mertens - é sabido - faz-se das directivas da música minimalista norte-americana, o que fez com que fosse comparado com músicos como Steve Reich ou Michael Nyman. Mas é igualmente sabido que Wim Mertens é mais do que a repetição como processo de construção musical. É invariavelmente emoção, transcendência, metamorfose. A prova disso foi a forma como fez com que as suas composições envergassem novas roupagens e ascendessem a um novo estatuto, a uma dimensão superior. Surgiram então temas redobrados de intensidade, composições mais ou menos aceleradas do que no seu original, mas respeitando sempre os jogos de silêncio, a progressão da intensidade ou os rasgos do momento. Mas o que fica mesmo na memória, em termos puramente técnicos, é a velocidade de execução de Wim Mertens e a perfeição do seu desempenho.
Contudo, há mais na sua música do que essa sua interpretação, digamos, irrepreensível. Há como que um desfilar de sensações à flor da pele, o toque de maresia, um constante atravessar de ar rarefeito, uma paisagem de nevoeiro e demais cenários idílicos, como se a transcendência estivesse a um passo de distância.

Wim Mertens não é homem para falar muito. É, pelo contrário, homem para ficar o concerto todo sem dirigir uma única palavra ao público e foi precisamente aquilo que fez em Famalicão. Entre a apresentação das suas composições, quando não está a tocar, Wim Mertens passeia-se pelo palco, vem até à frente do palco agradecer ao seu público, caminha em volta do seu piano. Quando termina uma composição mais intensa, salta do banco do seu piano como se este tivesse picos e estende os braços no ar. O encore, longo, foi como que um mini best of doseado calmamente para que às canções se pudessem juntar as ovações de uma plateia que, em pé, reconheceu – e por várias vezes – o carinho que nutre por Wim Mertens. Carinho que, pelos vistos, é recíproco.
· 15 Jun 2005 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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