Hype Williams / Niagara
Kolovrat 79, Lisboa
21 Mai 2011
Apesar de uma enorme curiosidade em ver pela primeira vez a maquinaria tropical dos Niagara in loco, motivos alheios impossibilitaram-me de chegar a tempo de conferir se o fluxo da recente mixtape para a Fact teria concordância no sótão do Kolovrat. Podendo apenas recorrer ao notável stalking alheio do nosso mais recente colaborador, Filipe Felizardo, que elogiou a maior rarefacção das primeiras três malhas por oposição a uma densidade mais supérflua nos andamentos conseguentes. Palavras minhas, feitas de uma opinião que merece todo o nosso respeito e leva a concluir que terá sido uma primeira parte digna para preparar a máquina de fumos dos Hype Williams.

Carregados por um hype (era obrigatório) bem mais considerável do que aquele com que se apresentaram no ano transacto em Portugal, foi uma sala cheia que recebeu o duo londrino. Porta estandartes de uma nebulosidade sonora que tem na “performance” o correspondente visual fidedigno, carregado de fumo (como se reivindicasse o everlasting culto à erva) e pautado por um quase niilismo. Marca de que o aparente desnorte referencial em formato mixtape é consequência de uma dinâmica premeditada onde as falhas (poder-se-ia pensar num excesso de zelo digno de “estrela”) vão sendo colmatadas pelo savor faire dos músicos. O reverb e o delay como ferramentas para uma alienação com sentido. Ou um embuste que vale.

O início algo temeroso, com o delay em aterragem tumultuosa, logo deu lugar a uma malha nova onde, pela primeira vez, as conotações com a música de dança britânica aka bass (como se isso não fosse vago o suficiente) tem uma razão de ser factual ao invés de meramente geográficas. Falsa UK Funky nas mãos de dois prevaricadores que recolhem tudo sobre a sua manta de sintetizadores drogados e vozes processadas e fazem das directrizes algo distinto no seu apelo para o escapismo. “Rise Up” continua a ser coisa maior neste ano de 2011, e todo o MO da banda é truncado na medida do possível nessa maravilha transformista que é “The Throning”. Pega em “The Sweetest Taboo” para nunca chegar ao refrão que a tornaria em algo profundamente reconhecível. Antes pairando nessa memória ténue, que se vai revolvendo num trainspotterism dúbio. É tudo isso a música dos Hype Williams, num concerto de pontas soltas e desvios preguiçosos que vive disso mesmo, confundindo os presentes ao ponto da abstracção. Como teria de ser. E com aquele final abrupto por capricho do quadro eléctrico a revelar-se (pela primeira vez?) como dignificante para uma prestação incrível na sua recusa pela realidade, como única via possível.
· 25 Mai 2011 · 23:55 ·
Bruno Silva
celasdeathsquad@gmail.com
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