Camané
Teatro São Luiz, Lisboa
06 Fev 2011
O último disco de Camané, Do Amor e dos Dias foi uma pequena desilusão. Não que fosse mau, é um bom disco, mas ficou um pouco aquém da excessiva perfeição do anterior Sei de um Rio (2008). Afinal, falamos de Camané, o mais brilhante intérprete da canção portuguesa a que chamam “fado†- herdeiro de Marceneiro, Ferreira Rosa e Carmo, Camané atravessa na voz a história do fado, com a sua poesia e a sua modernidade. Durante quatro noites consecutivas no Teatro São Luiz, em Lisboa, Camané mostrou ao vivo o seu disco mais recente e esclareceu as possíveis dúvidas.

No último dos quatro concertos, domingo, dia 6 de Fevereiro, tivemos a oportunidade de confirmar que afinal Do Amor é um disco incrivelmente poético, nas suas inúmeras variações, sempre à volta da temática do título: a impossibilidade do amor perfeito, a necessidade do amor imperfeito. São vários os exemplos, que ao vivo ficam ainda a ganhar mais: “Fado livre†(“se não for livre contigo, vejo-me livre de tiâ€); “Lúbrica†(“teus olhos dizem mais que muitas bibliotecasâ€, versos de Cesário Verde); “Depois que um beijo me deste†(“em cada beijo que deres hás-de lembrar-te de mimâ€); “Tanto me faz†(“quando se acaba o amor não se volta para trásâ€); e a inevitável “Guerra das Rosasâ€, o maior sucesso retirado do disco recente.

Camané aproveitou também para reforçar a sua ligação aos “cantautores†nacionais. Se José Mário Branco esteve ligado de forma próxima à produção de Sei de um Rio, este disco conta com temas de Sérgio Godinho (a belíssima “Emboscadasâ€, desvendada logo no início do espectáculo) e Fausto (“Porque me olhas assimâ€, também revisitada recentemente por Cristina Branco). Embora os temas do recente Do Amor e dos Dias tenham enchido maioritariamente o alinhamento, não faltaram alguns temas mais conhecidos, como o über-clássico “Ela tinha uma amigaâ€. Houve ainda uma improvável passagem por Chico Buarque, “De todas as maneiras†- mais uma vez o amor, pois.

Sempre no seu habitual registo elegante, contido (com pontuais excepções), Camané foi desfolhando as canções com uma impressionante naturalidade, encarnando a personagem de cada canção com grande à-vontade, sentimentalismo q.b., sem excessos. O primeiro encore (foram dois, muito pedidos) arrancou com as palavras “eu sei que esperas por mim, como sempre, como dantes, nos braços da madrugada†- repescagem do clássico de 2oo1, “Mais um fado no fadoâ€. Camané pegou ainda em “Saudades trago comigo†(do primeiro disco) e “Sei de um Rioâ€, do recente disco homónimo. Ovação em pé, sala completamente rendida (e esgotada). Este concerto serviu para nos relembrar que Camané, independentemente de fazer discos bons ou muito bons, já é um dos grandes.
· 08 Fev 2011 · 09:46 ·
Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com

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