Supersuckers / Nashville Pussy
Santiago Alquimista, Lisboa
06 Abr 2009
O rock sem merdas é um pouco como os Flinstones: uma família moderna que reside na idade da pedra (como reza a canção que abre a série de animação). O testemunho disso encontra-se bem vivo nos Supersuckers e Nashville Pussy, nomes da resistência norte-americana que faz do rock uma carolice muito mais propícia ao gozo imediato do que à sofisticação do género. Partilhando a double bill em cordial igualdade (o que ajuda a anular os egos e a pretensão), os Supersuckers e os Nashville Pussy atingem um recorde de que poucos se podem orgulhar: em duas horas percorridas à margem da lei, aludem a drogas e a cenários de promiscuidade sexual suficientes para que o Santiago Alquimista mais pareça o Santiago Alquimitra.

Nashville Pussy © Mauro Mota

Mitra com toda a escola é o melhor que se pode dizer sobre Eddie Spaghetti, o imparável líder dos Supersuckers, que, com chapéu à cowboy e óculos espelhados, parece a versão pistoleira de The Edge, dos U2, na era em que os irlandeses acreditavam ser os Village People. Apesar de serem já muito os anos no activo, os Supersuckers de hoje encontram-se próximos da formação clássica que gravou os discos na Sup Pop, o que ajuda a legitimar as coisas. Melhor do que ninguém, os incríveis guitarristas Ron “Rontrose” Heathman e Dan “Thunder” Bolton (visivelmente intoxicado) sabem com que teias sónicas se coze o “riff” e o devaneio wah wah de “Luck” (música que diz muito sobre o oportunismo punk da banda de Tucson, no Arizona).

Nashville Pussy © Mauro Mota

Com músicos tão rodados, os Supersuckers dão-se ao luxo de dividir o tempo em palco entre duas partes: uma primeira reservada à country (registo em que são igualmente soberbos) e uma outra de aceleração ligada à corrente. Bastou a gloriosa passagem por “Non-addictive Marijuana” para entender por que motivo os Supersuckers foram outrora a banda que acompanhava a lenda Willie Nelson. Ao terminar, o tema deixa a certeza de que a country pode permanecer tradicional, mesmo quando refere o abuso de heroína (e assim era em Must’ve Been High dos Suckers, tal como no cancioneiro mais obscuro de Johnny Cash). Ficamos com um excelente souvenir americano a ressoar nos ouvidos. A mesma América, pertencente aos atalhos e aos anti-heróis, encontra-se escancarada na chancela garage-rock que confirma “Bad, Bad, Bad” e “Pretty Fucked Up” como momentos altos da metade eléctrica do concerto dos Supersuckers. Eles tardaram, mas ainda chegaram a tempo de mostrar como se faz (e bem) nas salas mais refundidas do circuito rock norte-americano.

Supersuckers © Mauro Mota

Sem que ambos os pisos do Alquimistas arrefecessem, a entrada dos Nashville Pussy é anunciada pelo célebre monólogo, pertencente ao série-b From Dusk Till Dawn – Aberto Até de Madrugada, que cita a variedade disponível em certo salão de strip-tease perdido no México. Variedade, que, por sua vez, não é certamente uma das qualidades dos Nashville Pussy, bando de patifes especializado num rock que não perde tempo a regatear com putas. A estratégia é simples e relembra uma fórmula de sucesso no jogo Championship Manager:curto, duro e sim. Com isto, os Nashville Pussy ficam longe da dinâmica dos Supersuckers, mas bem perto do mesmo eixo temático fixado em sexo e drogas. Igualmente inevitável é a sensação de saturação que torna difícil perceber onde termina “I’m So High” (bom relato de “moca”) e começa (mais tarde) “Drunk Driving Man”. Ainda assim, tudo isto poderia ser bem pior, se a imagem de marca dos Nashville Pussy não fosse assegurada por uma baixista (Karen Cuda e todas as suas poses) e uma guitarrista (Ruyter Suys e o diabo no seu generoso corpo), que, na eventualidade de fracassarem no circo rock, podem muito bem continuar perto do seu público agarradas ao varão, nas horas tardias da SIC Radical. Os Nashville Pussy são incondicionais na vulgaridade e deboche que lhes vale o culto. Era isso que se pedia.
· 09 Abr 2009 · 01:36 ·
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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