Micah P. Hinson - Festival Tímpano
Casa das Artes, Famalicão
20 Mai 2005

Apesar da sua curta idade, a história de Micah Paul Hinson é já longa e conturbada. Nasceu em Memphis mas na sua adolescência mudou-se com a família para Abilene, no Texas. Daí a fazer parte da cena musical local foi um passo, para se tornar viciado em narcóticos foi um e meio. Depois de cumprir tempo de prisão e ficar sem praticamente tudo aquilo que tinha, pegou nas canções que gravou durante o período difícil e editou pela Sketchbook Records o seu disco de estreia, Micah P. Hinson and the Gospel of Progress. E é precisamente com os Gospel of Progress que se apresentou naquela que seria a única data em Portugal de uma consideravelmente longa digressão. Apesar de ter um novo registo preparado para ser lançado a 13 de Junho deste ano - The Baby and the Satellite, um conjunto de canções escritas originalmente em 2001 -, a escolha do alinhamento recaiu obrigatoriamente em Micah P. Hinson and the Gospel of Progress.

Os Gospel of Progress não são nem mais nem menos do que dois elementos: um baterista e um baixista. Entraram em palco com Micah Paul Hinson anunciados por uma quantidade indescritível de fumo que surgiu por detrás da bateria e que havia de marcar presença ao longo da actuação – para divertimento de muitos. As canções de Micah Paul Hinson começam quase invariavelmente com a sua voz e a sua guitarra. Quando não se fazem só da sua voz e da sua guitarra, as canções de Micah Paul Hinson contam com o auxílio da instrumentação leve dos Gospel of Progress. Sim, porque do disco para as actuações ao vivo, perdem-se os arranjos quase sumptuosos (os teclados, as cordas, os coros de vozes e até as vozes femininas) e o modo de funcionamento é o da simplicidade, o do menos é mais.

© Rui Ribeiro

Não se pode dizer que Micah Paul Hinson seja um compositor fantástico, fora de série. O que se pode dizer é que a sua voz deixa marca. Primeiro porque é bem mais séria e conhecedora do que aquilo que a sua idade faria prever; e depois porque se assemelha às vozes de Bill Calahan e Kurt Wagner. E se pensarmos bem a sua abordagem musical não é assim tão diferente da de bandas como os (Smog) e principalmente os Lambchop. Em canções como “The Possibilities”, "Don't You Forget (Parts One and Two)" e “On My Way”, apresentadas durante a actuação, Micah P. Hinson traça uma espécie de padrão nas suas canções: os temas sobre o eterno e sincero arrependimento, a perda, o passado, as relações, a dor, a memória das coisas.

Mas de quando em vez, da mansidão inicial da maior parte das canções de Micah P. Hinson irrompem guitarras moderadamente furiosas, percussão borbulhante, frases gritadas, raiva incontida. Mas o caudal é mesmo essencialmente brando e tranquilo. Noutro campeonato completamente diferente, cada vez que o fumo surgia, o baixista dos Gospel of Progress manifestava-se com risadas partilhadas também pelo (pouco) público. Mas a grande surpresa estava mesmo guardada para o fim, para o encore: “This Old Guitar”, uma canção de John Denver. Aí, sozinho em palco, Micah Paul Hinson fecha a noite dizendo: “ This old guitar gave me my life my living all the things you know I love to do / To serenade the stars that shine from a sunny mountainside / and most of all, to sing my songs for you, I love to sing my songs for you / yes I do, you know

· 20 Mai 2005 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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