José González / Sean Riley & the Slowriders
Teatro Sá da Bandeira, Porto
30 Abr 2008
Quando a Sony se lembrou de resgatar “Heartbeats”, a galinha dos ovos de ouro de José González, ao seu relativo anonimato e trazê-la para a ribalta via anúncio televisivo, estava mais do que a promover a qualidade do ecrã Bravia. No momento em que a voz do cantor sueco com origens argentinas irrompia pelo meio dos spots publicitários habituais, a música lo-fi garantia uma visibilidade raras vezes alcançada. E trazia para o conhecimento comum um valor até então praticamente desconhecido. “Heartbeats” conduzia à consagração do álbum Veneer e do seu artífice, ao mesmo tempo que dava a conhecer uma das melhores reciclagens de temas já realizada. De um original dos The Knife (incluído no álbum Deep Cuts), o conterrâneo González construiu uma paisagem despida dos vícios electrónicos originais e conquistou admiradores um pouco por todo o lado. Portugal não foi excepção e, após a passagem do músico pelo festival Sudoeste, em 2006, voltou a recebê-lo no Teatro Sá da Bandeira, no Porto, e na Aula Magna, em Lisboa, um dia antes.

Aparentando viver uma segunda vida, o revitalizado teatro contou com lotação esgotada. A sala portuense recebeu o músico com grandes louvores, contrastantes com a postura recatada que o caracteriza e que o “atirou” para uma cadeira recuada do palco. O arranque deu-se com o álbum de estreia Veneer, cujo tempo de antena foi, ao contrário do que seria expectável, semelhante ao de In Our Nature, o registo mais recente de músico. Volvidos quatro temas, entrariam em cena dois músicos adicionais – Erik Bodin e Yukimi Nagamo -, com instruções para manter o lo-fi e preencher unicamente pequenas brechas de instrumentalização que poderiam carecer de uns pozinhos de percussão. Consoante as necessidades, entraram ou sairam do palco, deixando por vezes González entregue ao dedilhar prodigioso da sua guitarra acústica. É sozinho que oferece, entre outras, a esperada “Heartbeats”e a incisiva “Crosses”, duas das mais reconhecidas e aplaudidas interpretações. E antes de abandonar o palco para a ovação do encore, surgiria “Teardrop”, porventura a menos surpreendente de todas as recuperações que Gonzalés fez de temas alheios. À semelhança de Elizabeth Fraser (dos Cocteau Twins), que empresta a sua voz ao tema original dos Massive Attack, também o sueco possui um registo de voz messiânico que surte um efeito semelhante ao da versão original.

A derradeira interpretação de González antes do acender das luzes seria novamente uma cover, evocando desta feita os anos 80. “Smalltown Boy”, um original dos Bronski Beat de Jimmy Sommerville, que o sueco desconstruiu e editou como lado B dos singles “Killing for Love” e “Down the Line”, surgiu quase irreconhecível, demonstrando a vocação do músico para a transposição de material electrónico para formato acústico. A plateia apreciou e fica certamente à espera de mais reciclagens auspiciosas. Pena que, à conta de querer poupar o público a um certo aborrecimento, o músico tenha recorrido sempre a interpretações curtas, “despachando” o seu alinhamento em menos de uma hora e meia. Foi tempo suficiente, contudo, para impor à audiência uma reflexão: que vantagem comparativa podem ter mil e um recursos sonoros, inventados não amiúde de forma desnecessária, quando o sublime se pode resumir a uma guitarra acústica e a uma voz certeira?

As honras de abertura do serão couberam à formação conimbricense Sean Riley & the Slowriders. À boa tradição de Coimbra, a toada rock impôs-se, mas mais ao nível musical do que performativo. A banda, que integra o ex-Bunnyranch e multi-instrumentista Filipe Costa, não foi muito para além da postura displicente de quem debita conteúdo para cumprir calendário. Os três músicos seguiram pelo caminho esperado, apresentando grande parte do álbum Farewell, que lançaram no ano passado e que têm vindo a promover ao longo dos últimos seis meses. O início da sua prestação fazia antever uma adaptação acústica do set habitual, a pensar talvez no público de González, mas a solução do primeiro tema, acompanhado unicamente à guitarra acústica e harmónica, não seria para durar. Inspirados no guru Bob Dylan e na tradição rockabilly norte-americana, Sean Riley e companhia apresentaram, a espaços, apontamentos rítmicos interessantes, provenientes na sua maioria da boa coordenação instrumental de Filipe Costa (para além deste e de Sean Riley, integra ainda o colectivo o baixista Bruno Simões), que se desdobra na bateria, nos teclados e na percussão, constituindo a força motriz do grupo. Mas força não era bem o que se pretendia de uma noite cujo prato forte era José González.
· 30 Abr 2008 · 08:00 ·
Eugénia Azevedo
eugeniaazevedo@bodyspace.net
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