Manta Rota / Calhau!
Teatro Passos Manuel, Porto
21 Abr 2007
Cedendo ao trocadilho fácil apetece dizer a primeira noite bestiário no Passos Manuel foi bestial. A nova iniciativa que promete tornar o Porto mais interessante uma vez por mês é louvável. Pela primeira vez, o colectivo Manta Rota deslocava-se à cidade invicta para apresentar explorações que têm recebido elogios. Os Manta Rota, de composição variável, vinham ao Porto com Afonso Simões, Nelson Gomes, Quim Albergaria, Natxo Checa e Pedro Gomes, para fazer aquilo que o último descreveu como “estrilho comunal de etno-urbano tuga” numa entrevista à revista Mondo Bizarre.

Chamou primeiramente a atenção a máquina de percussão do colectivo: se não era ela que dava o início das explorações era ela que mais tarde ou mais cedo ganhava especial protagonismo. Natxo Checa e Quim Albergaria foram inexcedíveis na percussão. Enquanto que Afonso Simões deu corpo às explorações sonoras dos Manta Rota com teclados e efeitos vários, Pedro Gomes e Nelson Gomes construíram ou destruíram (elogio) numa lógica perfeita de desenvolvimento das paisagens criadas. Foi assim que funcionaram, foi assim que exploraram terrenos férteis e por vezes excitantes. Foi assim que cumpriram as expectativas que se poderiam criar pela presença de um colectivo formado por gente de projectos como Gala Drop, CAVEIRA, The Vicious 5, Phoebus, Braço, Fish & Sheep.

Apesar de alguma improvisação visível, os Manta Rota desenvolvem parecem partir de uma estrutura minimamente discutida previamente. Algo que lhes permite explorar com legitimidade um imaginário onde pertencem, por exemplo, os Sunburned Hand of the Man e Fela Kuti – a África esteve sempre ali tão perto. Misto de espiritualismo e de psicadelismo. Houve até tempo para momentos bem dispostos como uma espécie de jam liderada por Quim Albergaria que chamava por Pedro Gomes que durante largos minutos saiu de cena para mudar uma corda que se tinha partido. Apesar de um encore que pouco ou nada acrescentou à primeira parte da actuação (não muito longa mas totalmente certeira e adequada em timing), os Manta Rota conseguiram uma excelente estreia no Porto. Entusiasmante.

Na primeira parte actuaram os portuenses Calhau! de João Alves Von Calhauism e Marta Ângela Von Calhauism, que trabalham juntos desde Abril de 2006. Editaram já três discos na sua própria editora e, tal como os Manta Rota, não são ainda um projecto com intensa experiência ao vivo. Apesar disso ofereceram uma surpreendente - e a espaços bela - tela onde cabe a electrónica mais doce e mais rude, falas de indivíduos mais ou menos anónimos, tubos de água, bonecas com olhos vermelhos que piscam e produzem ruído, gira-discos. Durante o tempo em que estiveram em palco exploraram a maquinaria vária que dispunham e trabalharam visivelmente o som na sua maior parte. Numa belíssima actuação os Calhau! mostraram ser mais compactos que em disco (que é como quem diz CD-R) e neste momento fazem já parte do lote das bandas mais interessantes da música portuguesa não convencional.
· 21 Abr 2007 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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