Brad Mehldau
Centro Cultural de Belém, Lisboa
24 Jan 2007
Em Fevereiro de 2006 o Centro Cultural de Belém recebeu Brad Mehldau, acompanhado pelo seu trio - Larry Grenadier (contrabaixo) e Jeff Ballard (bateria). Nessa ocasião o pianista teve uma actuação competente mas sem grande chama, que não chegou para entusiasmar plenamente. Menos de um ano depois Mehldau regressou a Portugal para três apresentações a solo - Theatro Circo em Braga, Alcobaça e CCB em Lisboa. A dúvida estava no ar: repetir-se-ia a impressão mediana do ano passado ou poderíamos voltar a confirmar a genialidade registada no disco Live In Tokyo?

Desta vez Mehldau não desiludiu. Servindo-se de um repertório variado, soube equilibrar a estrutura do concerto, alternando revisitações de temas originais com interpretações muito próprias de temas pop famosos. Pegando na música “Samba e Amor”, de Caetano Veloso, foi-se concentrando na melodia – despindo-a, dissecando-a - até arrebatar o público em picos de sensibilidade, deixando cada uma daquelas almas suspensas na expectativa de cada nota seguinte. Ao tema “Teardrop”, dos Massive Attack, Mehldau deixou a melodia intacta jogando numa repetição constante, enquanto em simultâneo amanhava vagas de constantes crescendos. A interpretação pessoalíssima de “My Favourite Things” foi outra bela surpresa, afastada do fulgor enérgico da interpretação de Coltrane mas concentrada no desdobramento e exploração da melodia - popularizada pelo filme “Música no Coração”.

Além da beleza que transpirava de cada interpretação, a técnica magnífica posta ao serviço de cada tema era evidente. Depois de um bebop executado a velocidade supersónica, numa exibição superlativa, o público já estava mais do que conquistado. Por vezes a mão esquerda trocava de função com a direita - ficando esta na marcação rítmica e harmónica, deixando a canhota a explorar improvisos melódicos (exercício repetido algumas vezes). A passagem pelos Radiohead já era esperada - desta vez o pianista rearquitectou “Exit Music (For A Film)” mantendo a coerência melódica impecável, trabalhando um monumento de improvisação jazzística em seu redor.

A noite estava a ser musicalmente feliz e todos percebiam isso – público e músico. Depois de uma primeira despedida, Mehldau voltou para cinco(!) encores muito pedidos. Um dos mais aplaudidos foi a interpretação intensa de “Still Crazy After All These Years” da dupla Simon & Garfunkel – uma recriação exigente e vagarosa, a amplificar o sentimento exposto na criação original. Houve ainda um clássico dos Beatles, “Mother Nature's Son”. O espectáculo culminou com a interpretação grandiosa de um tema original retirado do disco Elegiac Circle. Se ao início poderia haver dúvidas, estas foram completamente desfeitas. O brilhantismo de Mehldau foi demasiado explícito e só para evitar redundâncias é que não terminamos este pequeno texto com a palavra “génio”. Ah pois não.
· 24 Jan 2007 · 08:00 ·
Nuno Catarino
nunocatarino@gmail.com
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