Tetuzi Akiyama
Maria Vai com as Outras, Porto
30 Nov 2006
O Maria Vai com as Outras é um espaço recentemente inaugurado da cada vez mais enérgica, alternativa, movimentada e bem frequentada Rua do Almada. Além de ser uma loja de livros, vinil, objectos e outras coisas várias, é também um espaço de arte. Foi então em ambiente normal de loja que se deu as boas-vindas a quem chegava, enquanto se punha a conversa em dia na companhia de um copo de vinho ou de cerveja. Com o avançar do tempo a Maria vai com as Outras foi aumentando o seu número de visitantes, a maior parte deles movidos por um motivo especial: o regresso ao Porto de Tetuzi Akiyama, nome fundamental do mundo da música improvisada japonesa. O atraso do músico – que se deveu a problemas no aeroporto – foi bem contornado pelo ambiente acolhedor de convívio que se instalou na loja, apesar da situação um tanto ou quanto curiosa.

© Angela Costa

O concerto acontecia um andar abaixo da loja, numa cave de paredes pretas, com duas ou três lâmpadas e levemente decorada com algumas ilustrações dóceis em forma de quadro. Numa ponta da sala uma cadeira, um amplificador e duas guitarras. Mais à frente uma espécie de manta para os mais expeditos se sentarem. Anunciava-se no início que o concerto ia ser dividido em duas partes: uma primeira boogie, na guitarra eléctrica, e uma segunda na guitarra acústica. De pé, Tetuzi Akiyama, o cowboy que fez jus ao seu nome ao envergar um chapéu negro apresentou num primeiro tomo aquilo que devem ter sido uns três longos temas de riffs duros em loop com a eventual intromissão de solos espaciais. “Don't forget to boogie”, tema que surge em Route 13 to the gates of hell, resumiu na perfeição a primeira parte do japonês.

© Angela Costa

A segunda parte, depois de uma pausa de uns 10 minutos, revelar-se-ia completamente diferente. Sentado e de guitarra acústica na mão, optou pelos sons tranquilos e, por vezes, pelo near silence. Jogou com o silêncio, com as várias formas e técnicas de retirar partido da sua guitarra, mostrou o controlo suficiente para saber com exactidão todos os sons que podia, devia e tinha de extrair do instrumento. Mostrou uma sabedoria identificável a cada momento, fruto dos seus 20 anos de carreira e dos seus mais de 50 discos editados.

Pelo talento natural de Tetuzi Akiyama, o cowboy, e pelas circunstâncias do concerto, a noite teve ares de “happening”. Não da forma como John Cage o definiu (“eventos teatrais espontâneos e sem trama”), mas sim pela espontaneidade e imprevisibilidade, pela componente arty de toda a coisa e pela afluência do público (muito maior, diz-se, do que aquela que se registou aquando da vinda do japonês ao espaço Artes Múltiplas, no ano passado). Além de terem ficado registados na mente e memória de quem os quis receber, os sons de Tetuzi Akiyama ficaram gravados nas paredes da cave da Maria Vai com as Outras, e aparentemente nos arquivos da Esquilo. Para mais tarde recordar.
· 30 Nov 2006 · 08:00 ·
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
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