DISCOS
Deerhoof
Milk Man
· 02 Fev 2005 · 08:00 ·

Deerhoof
Milk Man
2004
Kill Rock Stars
Sítios oficiais:
- Deerhoof
- Kill Rock Stars
Milk Man
2004
Kill Rock Stars
Sítios oficiais:
- Deerhoof
- Kill Rock Stars

Deerhoof
Milk Man
2004
Kill Rock Stars
Sítios oficiais:
- Deerhoof
- Kill Rock Stars
Milk Man
2004
Kill Rock Stars
Sítios oficiais:
- Deerhoof
- Kill Rock Stars
Ao pegar em Milk Man, e olhando atentamente para o artwork superiormente criado por Ken Kagami, é possível de imediato perceber o que a atrevida rodela musical tem para nos oferecer. Milk Man, o próprio, em pose de top-model, sorri de forma quase macabra; o seu corpo, qual copinho de leite à espera dos primeiros raios de sol do ansiado próximo Verão, é atravessado por bananas e morangos que fazem com que irresolutas linhas de sangue escorram incessantemente. Depois do delirante Reveille e do aclamado Apple O', Milk Man mostra que ainda há muitos monstros escondidos dentro do armário, muitos pesadelos e muitas histórias de terror para contar e todo um mundo maravilhoso para descobrir. E ninguém melhor que os Deerhoof para criar uma alegoria onde um homem do leite, essa figura quase paternal, se transforma numa efialta.
Antes de mais, urge dizer que Milk Man é um disco conceptual, uma história com início e fim e que gira em redor de uma personagem malévola que compele e incita a comportamentos bizarros. Essa mesma figura arrasta indefesas crianças para um mundo criado para o efeito para depois as aprisionar. Em segundo plano, o último disco dos Deerhoof é como uma feira popular composta por onze diferentes tipos de diversões. “Milk Man”, o tema inicial, canção superiormente esgalhada, começa por revelar os primeiros pormenores da estranha personagem que representa Milk Man para depois fazer com que o comboio alucinado comece a sua viagem rumo à loucura eterna. Por entre riffs estridentes, ataques furiosos do baixo, percussão corpulenta, pianos açucarados e ruídos vários, a voz de Satomi Matsuzaki's, ainda atormentada pela visualização de O Exorcista, partilha: “Milk Man sleeps on the roof in the moon / Bananana stabbed to the arms / Weird Man / Ooh La La”. As guitarras de Chris Cohen e John Dietriech disparam em todas as direcções, a bateria de Greg Saunier não tem descanso.
“Giga Dance” podia ser muito bem o título de uma cassete de vídeo com os exercícios que sempre quis para perder aqueles quilinhos a mais, mas não, não é. Antes, é um tema que começa forte em percussão para depois se desenvolver num riff diabólico, devedor ao demo e a todas as figuras que descansam no Inferno de uma vida cheia de travessuras. Os teclados ajudam, as vozes também: trata-se de obra de belzebu. No estúdio, as canções foram surgindo sempre de forma distinta. Ora era Satomi que tinha uma ideia que era aproveitada pelo resto da banda para uma canção, ou era Chris Cohen que escrevia quase todo o tema e depois via Satomi a acrescentar-lhe a letra e as melodias. Com os Deerhoof tudo acontece de forma muito orgânica e natural.
“Desapareceré” é uma das canções mais atípicas dos Deerhoof – talvez ficasse perfeita algures no alinhamento de Apple O' - pois começa com batidas electrónicas, teclados cálidos e continua depois com a voz de Satomi, que, desta vez em Espanhol, relata: “Mira! Mira! Piedra cabeza me ve / Mirame, que desapareceré / Busca, busca, bu-su-ca, buscándome / Seres sentientes, oye”.
“Rainbow Silhouette of the Milky Man”, o primeiro tema instrumental de Milk Man, é banda sonora para desenhos animados japoneses, é salada de frutas que dispara a roleta do jogo sujo, potencia tiroteios entre a máfia que dispara de dentro de carros clássicos dos anos 60 por ruas mal iluminadas e ainda tem tempo para impossíveis solos de guitarra em forma de arco-íris, guerra de ferros e parafernália de ruídos e batimentos cardíacos. É o caos, é o caos, como só os Deerhoof sabem fazer. “Dog On The Side Walk” é um curto mas eficaz piscar de olhos a todos os cães que atravessam ruas sem utilizarem a passadeira e à loucura em geral. “C” tem palminhas, tem guinchinhos doces e inocentes, tem comboios e dragões que cospem fogo. E mais palminhas, sempre mais palminhas. Às tantas já não de distingue a loucura da realidade. “Milking” coloca em foco duas vertentes: a construção e destruição, a melodia e a anti melodia. Aqui, a voz fininha do capuchinho vermelho tenta escapar a um ataque foleiro de guitarras enlouquecidas. E não é que consegue?
Das aventuras e desventuras do capuchinho vermelho aos teclados de “Song of Sorn” – sejam eles desencantados em desafinadas audições de órgão de igreja ou no cintilante tilintar e martelar do piano do cabaré mais próximo – é um passo ou uma barriga cheia de pedras. Depende de como cair no estômago de cada um. É estilo, brilhantina no cabelo, o bolso cheio de trocos. São as descargas espalhafatosas do instrumental “That Big Orange Sun Run Over Speed Light”. O início de “New Sneaker” sugere o dia da comunhão solene: teclados ao alto – o padre espera pelas crianças. Mas nem tudo o que parece é, pois no fim já estamos todos numa feira medieval. E na verdade ninguém sabe muito bem o que aconteceu.
Por razões óbvias, tentar comparar Milk Man com Reveille é quase desnecessário. Os Deerhoof de Milk Man já não são - e talvez nunca mais venham a ser - os mesmos de outros tempos. Poliram-se, refinaram-se e deixaram de ver tantos filmes de terror. Para o bem ou para o mal, o campeonato parece ser agora outro - por vezes, parece mesmo que os Deerhoof andaram de ouvido no último disco dos Lightning Bolt. Quem sabe o homem do leite seja o culpado - ele é mau, ele é maligno, ele é malévolo, ele é maldoso. Ele é praticamente toda a árvore genealógica da maldade. E o pior é que pode bater à porta de qualquer um, a qualquer momento, com um os dois morangos na mão.
André GomesAntes de mais, urge dizer que Milk Man é um disco conceptual, uma história com início e fim e que gira em redor de uma personagem malévola que compele e incita a comportamentos bizarros. Essa mesma figura arrasta indefesas crianças para um mundo criado para o efeito para depois as aprisionar. Em segundo plano, o último disco dos Deerhoof é como uma feira popular composta por onze diferentes tipos de diversões. “Milk Man”, o tema inicial, canção superiormente esgalhada, começa por revelar os primeiros pormenores da estranha personagem que representa Milk Man para depois fazer com que o comboio alucinado comece a sua viagem rumo à loucura eterna. Por entre riffs estridentes, ataques furiosos do baixo, percussão corpulenta, pianos açucarados e ruídos vários, a voz de Satomi Matsuzaki's, ainda atormentada pela visualização de O Exorcista, partilha: “Milk Man sleeps on the roof in the moon / Bananana stabbed to the arms / Weird Man / Ooh La La”. As guitarras de Chris Cohen e John Dietriech disparam em todas as direcções, a bateria de Greg Saunier não tem descanso.
“Giga Dance” podia ser muito bem o título de uma cassete de vídeo com os exercícios que sempre quis para perder aqueles quilinhos a mais, mas não, não é. Antes, é um tema que começa forte em percussão para depois se desenvolver num riff diabólico, devedor ao demo e a todas as figuras que descansam no Inferno de uma vida cheia de travessuras. Os teclados ajudam, as vozes também: trata-se de obra de belzebu. No estúdio, as canções foram surgindo sempre de forma distinta. Ora era Satomi que tinha uma ideia que era aproveitada pelo resto da banda para uma canção, ou era Chris Cohen que escrevia quase todo o tema e depois via Satomi a acrescentar-lhe a letra e as melodias. Com os Deerhoof tudo acontece de forma muito orgânica e natural.
“Desapareceré” é uma das canções mais atípicas dos Deerhoof – talvez ficasse perfeita algures no alinhamento de Apple O' - pois começa com batidas electrónicas, teclados cálidos e continua depois com a voz de Satomi, que, desta vez em Espanhol, relata: “Mira! Mira! Piedra cabeza me ve / Mirame, que desapareceré / Busca, busca, bu-su-ca, buscándome / Seres sentientes, oye”.
“Rainbow Silhouette of the Milky Man”, o primeiro tema instrumental de Milk Man, é banda sonora para desenhos animados japoneses, é salada de frutas que dispara a roleta do jogo sujo, potencia tiroteios entre a máfia que dispara de dentro de carros clássicos dos anos 60 por ruas mal iluminadas e ainda tem tempo para impossíveis solos de guitarra em forma de arco-íris, guerra de ferros e parafernália de ruídos e batimentos cardíacos. É o caos, é o caos, como só os Deerhoof sabem fazer. “Dog On The Side Walk” é um curto mas eficaz piscar de olhos a todos os cães que atravessam ruas sem utilizarem a passadeira e à loucura em geral. “C” tem palminhas, tem guinchinhos doces e inocentes, tem comboios e dragões que cospem fogo. E mais palminhas, sempre mais palminhas. Às tantas já não de distingue a loucura da realidade. “Milking” coloca em foco duas vertentes: a construção e destruição, a melodia e a anti melodia. Aqui, a voz fininha do capuchinho vermelho tenta escapar a um ataque foleiro de guitarras enlouquecidas. E não é que consegue?
Das aventuras e desventuras do capuchinho vermelho aos teclados de “Song of Sorn” – sejam eles desencantados em desafinadas audições de órgão de igreja ou no cintilante tilintar e martelar do piano do cabaré mais próximo – é um passo ou uma barriga cheia de pedras. Depende de como cair no estômago de cada um. É estilo, brilhantina no cabelo, o bolso cheio de trocos. São as descargas espalhafatosas do instrumental “That Big Orange Sun Run Over Speed Light”. O início de “New Sneaker” sugere o dia da comunhão solene: teclados ao alto – o padre espera pelas crianças. Mas nem tudo o que parece é, pois no fim já estamos todos numa feira medieval. E na verdade ninguém sabe muito bem o que aconteceu.
Por razões óbvias, tentar comparar Milk Man com Reveille é quase desnecessário. Os Deerhoof de Milk Man já não são - e talvez nunca mais venham a ser - os mesmos de outros tempos. Poliram-se, refinaram-se e deixaram de ver tantos filmes de terror. Para o bem ou para o mal, o campeonato parece ser agora outro - por vezes, parece mesmo que os Deerhoof andaram de ouvido no último disco dos Lightning Bolt. Quem sabe o homem do leite seja o culpado - ele é mau, ele é maligno, ele é malévolo, ele é maldoso. Ele é praticamente toda a árvore genealógica da maldade. E o pior é que pode bater à porta de qualquer um, a qualquer momento, com um os dois morangos na mão.
andregomes@bodyspace.net
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