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Tubitek reabre no Porto este fim-de-semana
· 03 Jul 2014 · 17:27 ·


A Tubitek, mítica loja de discos do Porto, reabre este sábado após 14 anos de silêncio. No mesmo sítio de sempre, na Praça D João I, ali para os lados do Rivoli. Durante o tempo que funcionou, foi como uma universidade que formou centenas ou milhares de melómanos. As memórias desse templo da música andam de boca em boca ainda nos dias de hoje. Mas chegou a altura de escrever novas memórias. A Tubitek está de volta. A pensar nisso, fomos falar com Ricardo Salazar sobre esta coisa de abrir uma loja de discos em pleno 2014.

Uma pergunta logo para abrir: abrir uma loja no Porto em 2014 é um acto de coragem e de um pouco de loucura?

É um acto de devoção, dedicação e profundamente pensado. Foram reunidos os meios, as pessoas, as condições e esperou-se pela altura certa: há pessoas a quererem o objecto físico, a criarem o culto por formatos que, há 20 anos atrás estavam obsoletos – o vinil, por exemplo – há a possibilidade de os nossos preços se aproximarem em muitos casos dos preços mais baratos dos mercado. Há uma estrutura, criada pelo Abílio Silva, que permite que ele seja a pessoa certa para ser o proprietário desta renovada Tubitek, a par da cadeia de Lojas, a CDV e das vendas online, a www.cdgo.pt. Somos uma loja especializada, dirigimo-nos a uma clientela exigente, conhecedora e que pretende raridades, novidades, bons preços e vários formatos, para além de querer voltar a ter ou começar a ter um ponto de encontro onde se “vive música”.

Como eram os tempos da Tubitek original?

Uma alegria imensa de se fazer parte de um grupo de privilegiados que faziam o que mais gostavam. Que eram reconhecidos, acarinhados e respeitados por venderem discos. Por partilharem canções, álbuns, estórias que criavam amizades que ainda hoje se mantém. Eu fui crescendo – tinha 9 anos quando a Tubitek abriu – e quando ia ter com o meu Pai, que trabalhava na Caixa Geral de Depósitos na Praça D. João I, passava horas a olhar para os discos. E os meus heróis eram os homens que lá trabalhavam. No dia em que fui contratado, os meus joelhos tremeram quando passei para o lado de lá do balcão. Era um sonho ser pago para salvar o rock’n’roll.

Como se vivia a música e a compra da mesma comparando com os dias de hoje?

Eram dias antes da crise da indústria fonográfica. Eram dias em que o saber e o conhecimento marcavam a diferença. O acesso e a audácia em arriscar em títulos que eram desconhecidos permitia granjear respeito e criar um nome. Depois vieram as grandes superfícies e o negócio perdeu o carácter pessoal. O vendedor de discos deixou de ser alguém de confiança, que nos conhecia e conhecia os nossos gostos e passou a ser alguém que faz trocos e ensaca o material. E com o declínio da indústria, com o decréscimo das vendas, com a concorrências internacional de sites ou da usurpação de direitos, as grandes superfícies começaram a reduzir o seu espaço de venda, sendo esta a altura certa para a CDV Tubitek voltar, para preencher um vazio, para ser um local de encontro, com características próprias, com um conhecimento do seu passado, mas a querer voltar a ser algo relevante no futuro.

Há algum disco ou discos especiais na loja que agora reabre?

A CDV Tubitek vai ter um stock magnífico de vinil, com títulos imprescindíveis e com uma qualidade melhor que as edições originais, desde o “Berlin” do Lou Reed ao “Live at San Quentin” do Johnny Cash, do “A Kind of Blue” do Miles Davis a títulos de Sam Cooke, Hendrix, heavy metal, funk, clássica e portuguesa. Vamos ter várias caixas, uma secção considerável de DVD Musical e uma extensa oferta de compact-discs. Vamos ter surpresas, vamos ter raridades, vamos ter valores seguros. E aí entra o nosso conhecimento e vontade, destacando as novas reedições em caixa dos primeiros três discos dos Led Zeppelin ou a caixa com os quatro primeiros discos dos The Sound, com vários inéditos. Mas o melhor é mesmo aparecer.

Alguma coisa da qual custará abrir mão?

O de ter um sonho antigo realizado. Agora é preciso sonhar mais e sonhar coisas que complementem esta aventura. É tempo de prestar homenagem a Homens grandes que fizeram a loja, de passar o testemunho ao Abílio Silva como pessoa capaz de devolver a loja à Cidade e ao mundo e de celebrar. E de todos os dias, depois da estreia procurar manter as expectativas, pois como diria o escritor Delmore Scharwtz: “nos sonhos começam responsabilidades”. E a fasquia é alta.

Ter uma loja de discos é algo próximo daquilo que vemos ou lemos no Alta Fidelidade?

É um santuário para a música falada, dançada e ouvida. É algo que fica para a vida toda, com um romantismo e loucura, com todas as pessoas e histórias e referências e relacionamentos que se vão criando, fortalecendo e mantendo. Somos “rockers por procuração”. E acho que respondo melhor se disser que o Alta Fidelidade é um dos filmes da minha vida.

Qual será a tendência da loja, se é que terá alguma especifica?

A loja será, como sempre, ecléctica. E sem ideias de que há estilos ou ramos melhores que outros: o lixo de um homem é o luxo do outro.

Pensam abrir a loja a outras iniciativas, como concertos? Pensam envolver-se na comunidade musical da cidade de outras formas?

A loja vai ser dinâmica, vai ser da Cidade e para a Cidade, com uma interacção neste novo Porto, dos bares, restaurantes e hostels. É preciso música do Porto para o mundo, é preciso música portuguesa para turistas, é preciso falar sobre música, não ensinar mas aprender sobre música, são precisas conferências, trocas de ideias, eventos, tertúlias, concertos e a ponte entre artista e o seu público. E a loja é o local ideal.

Quem gostaria que entrasse na loja um dia destes?

Capicua. Porque é do Porto e é genial, talentosa e uma loja de discos é o lugar onde uma grande escritora de canções está presente. Quer pelos seus trabalhos, quer pela importância da sua obra. E o Tom Waits, porque o Lou Reed já não está cá e Tom Waits é deus.
André Gomes
andregomes@bodyspace.net

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