ENTREVISTAS
@c
Centro de Estudos
· 01 Fev 2007 · 08:00 ·
Diz-se num texto acerca do vosso novo disco que este é o primeiro registo de estúdio. Enquanto que os outros discos nasceram a partir de actuações ao vivo, este foi inteiramente concebido no estúdio, digamos assim. Que diferenças apontam entre os dois processos?
A principal diferença processual decorre dos tempos necessariamente diferentes entre uma performance improvisada ou semi-improvisada e a composição em estúdio, que se desenvolve ao longo de várias semanas (ou meses em alguns casos) para cada peça e que permite que as diferentes peças se contaminem entre si à medida que vão evoluindo. Os nossos CD anteriores foram produzidos a partir de gravações de concertos, gravações em que as diferentes fontes já se encontravam pré-misturadas, sendo portanto a nossa capacidade de intervenção e pós-produção muito mais limitada. Entre os dois discos fomos editando já algumas peças onde agora conseguimos perceber a inflexão do processo, por exemplo o tema 36, 10" com o Marc Behrens e o Paulo Raposo editado na Crónica, a nossa participação na compilação Untitled Songs na Sirr ou as edições nas netlabels Silence is not Empty e Alg-a. Algumas destas peças chegaram em diferentes pontos do processo a fazer parte dos alinhamentos provisórios do Study mas por diversas razões, acabaram por encontrar o seu lugar noutras edições e não nesta.
Apesar de ter sido gravado em estúdio, este é um disco que reflecte de certa maneira os @c das actuações ao vivo?
Sem dúvida, e por mais do que uma razão: se por um lado as nossas actuações ao vivo sofreram também uma evolução ao longo do período entre o lançamento de v3, em 2004 e agora de Study, evolução esta que creio ter sido muito influenciada pelos processos de trabalho entretanto desenvolvidos, por outro lado, as gravações ao vivo continuam apesar de tudo presentes neste disco. Durante os dois últimos anos colaboramos ao vivo com diferentes músicos - Joe Giardullo, Vitor Joaquim, João Hora, Pure, Fried Dähn, Emídio Buchinho, Carlos Santos, Carlos Zíngaro, Álvaro Barbosa, Stephan Mathieu, Victor Gama, Albrecht Loops, Gustavo Costa, Américo Rodrigues, Nuno Rebelo, Ulrich Mitzlaf, Colleen, Raymond MacDonald, Joshua Abrams, etc - e algumas das gravações feitas no decurso dessas performances acabaram por ser usadas como matéria-prima para a construção de partes destes temas. Estas performances foram realizadas como @c ou noutros contextos e ensembles, mas têm todas em comum a nossa participação. Não estou aqui a falar de uma gravação "live" como nos discos anteriores, mas na utilização do som gravado durante concertos em que processamos ou "samplamos" os músicos com quem tocamos, como ponto de partida para a composição de um tema, ou como parte dessa composição. Gostamos da forma como assim conseguimos ter vestígios desses momentos presentes no disco, sem termos as gravações de concerto propriamente ditas, e gostamos também muito da forma como este trabalho desenvolvido à posteriori e não em directo, nos permite dissecar e transformar os diferentes registos, bem como os integrar em contextos com origens e cronologias muito contrastantes.
Que tipo de estudo é aquele que efectuam neste novo disco? De que forma difere daquele executado nos registos anteriores?
Creio que em primeiro lugar nos estudamos a nós: à música que queremos fazer e o que significa para nós compor e fazer música. Esse foi o principal objectivo. Por outro lado, tentamos também perceber em que sentido é que uma música produzida digitalmente pode ou deve caminhar: numa altura em que a tecnologia é ubíqua, em que o adjectivo "electrónico" aplicado à música normalmente se refere a "dançável" e em que todos os produtores usam meios digitais (queiram ou não, saibam ou não que os estão a utilizar!), o que será então a música digital, ou a música feita com o computador? Queríamos estudar as características intrínsecas da prática digital da produção musical.
Este registo foi gravado entre 2003 e 2006. Foi um disco difícil ou foi um disco pensado ao pormenor?
Foi pensado ao pormenor e desenvolvido calmamente. Com a inversão ou evolução do processo de trabalho não nos interessava ter que acelerar soluções, mas antes poder calma e atempadamente desenvolver cada uma das peças e trabalhar a configuração final das peças e do disco. Não foi no entanto um processo "difícil", muito pelo contrário foi um processo que nos manteve motivados e empenhados durante todo este tempo. As peças neste disco, ao cruzarem temporal e espacialmente o seu desenvolvimento com outros projectos do @c - performances, vídeo, instalação - acabaram por não só beneficiar de todos estes outros projectos como de os influenciar também.
Que tipo de dinâmica existe entre ti e o Pedro Tudela na criação musical? Como é o processo de produção dos @c?
Não temos um processo de trabalho formatado ou estanque. Ambos desenvolvemos partes das peças ou esboços para peças quer em conjunto quer individualmente. A composição final é normalmente feita em conjunto mas até chegarmos a uma versão final, ouvimos cada uma das peças dezenas (ou centenas) de vezes, e passamos por fases evolutivas paralelas, mais uma vez individualmente ou em conjunto. Creio que em média as peças passaram por entre 30 e 50 fases semi-finais de mistura e composição...
Quanta pesquisa existe neste disco e quanta improvisação? Existem em quantidades iguais ou a balança pende para algum dos lados?
Creio que actualmente a balança pende mais para o trabalho de campo, de estúdio, para a pesquisa e descoberta bem como para o desenvolvimento estratégico de composições para nós ou para terceiros (temos por exemplo trabalhado bastante com o grupo de percussão Drumming, compondo para ensemble de percussão ou para grupos mistos). A improvisação continua a desempenhar um papel importante em determinadas fases do processo de trabalho e na reconversão "ao vivo" das peças, mas já não é o principal eixo do processo criativo como em foi em tempos.
Pessoalmente falando, que retrato farias da música electrónica feita em Portugal hoje em dia? Existem alguns projectos que sigas atentamente?
Temos seguido com bastante atenção alguns músicos e projectos, quer pela sua proximidade (porque tocamos juntos, desenvolvemos projectos colaborativos ou os editamos na crónica) quer pelo interesse que a sua produção nos desperta. A "cena" portuguesa é pequena, mas não nos parece que seja desproporcionadamente pequena em relação à escala do país. Paulo Raposo, Vitor Joaquim, The Beautiful Schizophonic, Carlos Zíngaro, André Gonçalves, Autodigest, são todos autores que tentamos acompanhar de perto na chamada "música electrónica experimental", bem como uma série de músicos interessantíssimos na "cena" lisboeta da música improvisada e experimental.
Como acompanhas o fenómeno das netlabels e das editoras em CD-R? Qual é a tua ligação com esses formatos?
Enquanto @c temos um par de edições feitas em netlabels e em editoras de CD-R. Gosto muito do formato digital (e acho, em geral, que o futuro da distribuição passa justamente por aqui) mas creio que o modelo das netlabels ainda não atingiu a maturidade, sobretudo no que diz respeito quer à promoção que fazem das edições quer à visibilidade pública que conseguem quer para as edições quer para as netlabels.
Que ligações traçarias entre as várias funções artísticas que desempenhas? Como é que se contemplam?
É difícil sistematizar isto. O Pedro Tudela é artista plástico, músico, cenógrafo e professor. Eu sou designer de comunicação, músico e professor também. Ambos trabalhamos frequentemente em bastantes projectos paralelamente e todas estas actividades acabam por influenciar directa ou indirectamente a música que produzimos. A colaboração contínua com a Lia também surte efeitos na música...
Em que momento se encontra a Crónica? Parece-te que o reconhecimento do trabalho da editora vem mais de fora do que de dentro?
Sem dúvida. O "reconhecimento" nacional, para além do círculo mais ou menos restrito de músicos e alguns seguidores mais atentos da nossa actividade é, creio, diminuto. Não será talvez estranho a isto estarmos baseados no Porto, embora não seja esse o único factor, claro. Já não me recordo qual foi a última vez que um media nacional (jornal, rádio, televisão, etc) criticou uma das nossas edições... Mesmo a distribuição em lojas é escassa... Fora de Portugal, e não só na Europa, o panorama é felizmente bastante diferente!
Como é operar a partir do Porto? Como é viver na cidade do Porto para os @c e para a Crónica? O que é que está a mudar na cidade e o que é devia mudar na cidade?
Nesta como em qualquer outra cidade, há sempre um grande conjunto de factores que deveriam (ou poderiam mudar) mas, felizmente, actualmente e cidade é um bom sítio para se viver e trabalhar. Em primeiro lugar, a nossa actividade passa muito pela Faculdade de Belas Artes, onde ambos leccionamos e onde diariamente somos confrontados com uma dinâmica intelectual e de produção que é não só animadora como desafiadora. As poucas instituições e agentes culturais da cidade com actividade regular são na sua maioria bastante atentas e vão conseguindo propor programas muito interessantes (embora menos do que seria desejável ou do que é "normal" noutras cidades de maior dimensão). Desde há alguns anos a mobilidade foi bastante facilitada, não só com o novo aeroporto como com as novas companhias aéreas que para ele operam, por isso sentimo-nos cada vez menos isolados ou "remotos" e, finalmente, muita da nossa actividade e comunicação passa por meios de comunicação digitais, o que nos permite desenvolver o mesmo trabalho aqui ou em qualquer outro lugar do mundo... Quando à outra questão que está aqui implícita, relativa às diferenças entre operar a partir do Porto ou a partir de Lisboa, pela minha parte creio que as diferenças não são tão substanciais quanto isso. Estamos obviamente mais longe dos agentes culturais da "capital" e naturalmente sentimos que isso tem um efeito relativo nas oportunidades que nos são oferecidas e nas propostas que nos são feitas. Estamos também (e talvez acima de tudo) longe dos media, como já referi na resposta à questão anterior.
Há alguma razão para este disco ter sido editado na Grain of Sound e não na Crónica?
Não existe nenhuma razão especial, para além da simpatia que nós temos pelo trabalho que a Grain of Sound tem desenvolvido e a vontade que tínhamos em também contribuir para o seu catálogo. Temos um trabalho em preparação para edição na Crónica e outro para edição pela Feld, de Frankfurt. Creio que é inevitável que se associe sempre o @c à Crónica, afinal ambos colaboramos com a editora, mas não sentimos que isso nos obrigue a realizar todas as edições do @c na Crónica. Talvez nos seja benéfico distribuir algum do nosso trabalho por outras editoras, que naturalmente trabalharão noutros canais de distribuição e promoção.
Que esperam os @c da actuação na Casa da Música no próximo dia 3 de Fevereiro? Que vos parece a ideia do Clubbing e como se sentem ao lado de projectos tão distintos?
Em relação ao Clubbing, sentimo-nos tão integrados como desintegrados. A nossa performance é promovida com os restantes concertos mas é simultaneamente realizada noutro espaço, mais cedo e com entrada gratuita. Gosto bastante da ideia de a Casa da Música tentar integrar sempre músicos portugueses na programação do Clubbing, embora creio que o @c estará cada vez menos próximo das estéticas que motivam estes eventos. E esta diversidade na programação do evento é em si mesma um aspecto positivo! Em relação a expectativas: vamos apresentar pela primeira vez uma das peças em que estamos a trabalhar para o novo disco e não só nos vamos poder apresentar ao vivo com a Lia, como o vamos fazer num espaço com características muito interessantes para o trabalho que fazemos. Por isso elas são altas...
No sábado acontece também no corredor poente da Casa da Música a inauguração da instalação "30x1.2" creditada a Pedro Tudela, Miguel Carvalhais e Lia. O que é que nos podes dizer acerca disto?
"30x1.2" é uma instalação baseada no sistema audiovisual modular que desenvolvemos para a exposição na Solar, Galeria de Arte Cinemática, em Vila do Conde, em Setembro de 2005. Essa exposição intitulava-se "30x1" e sempre pretendemos desenvolver outras peças a partir do mesmo sistema. Um vídeo linear com o título "30x1.1" foi a primeira (já foi projectado entretanto em festivais em Madrid, Hamburgo, Lausanne, Porto e Viena) e esta peça será montada agora em regime de instalação na Casa da Música. Temos em preparação um projecto de edição também desenvolvido a partir deste sistema, mas ainda não conseguimos prever quando o terminaremos.
André GomesA principal diferença processual decorre dos tempos necessariamente diferentes entre uma performance improvisada ou semi-improvisada e a composição em estúdio, que se desenvolve ao longo de várias semanas (ou meses em alguns casos) para cada peça e que permite que as diferentes peças se contaminem entre si à medida que vão evoluindo. Os nossos CD anteriores foram produzidos a partir de gravações de concertos, gravações em que as diferentes fontes já se encontravam pré-misturadas, sendo portanto a nossa capacidade de intervenção e pós-produção muito mais limitada. Entre os dois discos fomos editando já algumas peças onde agora conseguimos perceber a inflexão do processo, por exemplo o tema 36, 10" com o Marc Behrens e o Paulo Raposo editado na Crónica, a nossa participação na compilação Untitled Songs na Sirr ou as edições nas netlabels Silence is not Empty e Alg-a. Algumas destas peças chegaram em diferentes pontos do processo a fazer parte dos alinhamentos provisórios do Study mas por diversas razões, acabaram por encontrar o seu lugar noutras edições e não nesta.
Apesar de ter sido gravado em estúdio, este é um disco que reflecte de certa maneira os @c das actuações ao vivo?
Sem dúvida, e por mais do que uma razão: se por um lado as nossas actuações ao vivo sofreram também uma evolução ao longo do período entre o lançamento de v3, em 2004 e agora de Study, evolução esta que creio ter sido muito influenciada pelos processos de trabalho entretanto desenvolvidos, por outro lado, as gravações ao vivo continuam apesar de tudo presentes neste disco. Durante os dois últimos anos colaboramos ao vivo com diferentes músicos - Joe Giardullo, Vitor Joaquim, João Hora, Pure, Fried Dähn, Emídio Buchinho, Carlos Santos, Carlos Zíngaro, Álvaro Barbosa, Stephan Mathieu, Victor Gama, Albrecht Loops, Gustavo Costa, Américo Rodrigues, Nuno Rebelo, Ulrich Mitzlaf, Colleen, Raymond MacDonald, Joshua Abrams, etc - e algumas das gravações feitas no decurso dessas performances acabaram por ser usadas como matéria-prima para a construção de partes destes temas. Estas performances foram realizadas como @c ou noutros contextos e ensembles, mas têm todas em comum a nossa participação. Não estou aqui a falar de uma gravação "live" como nos discos anteriores, mas na utilização do som gravado durante concertos em que processamos ou "samplamos" os músicos com quem tocamos, como ponto de partida para a composição de um tema, ou como parte dessa composição. Gostamos da forma como assim conseguimos ter vestígios desses momentos presentes no disco, sem termos as gravações de concerto propriamente ditas, e gostamos também muito da forma como este trabalho desenvolvido à posteriori e não em directo, nos permite dissecar e transformar os diferentes registos, bem como os integrar em contextos com origens e cronologias muito contrastantes.
Que tipo de estudo é aquele que efectuam neste novo disco? De que forma difere daquele executado nos registos anteriores?
Creio que em primeiro lugar nos estudamos a nós: à música que queremos fazer e o que significa para nós compor e fazer música. Esse foi o principal objectivo. Por outro lado, tentamos também perceber em que sentido é que uma música produzida digitalmente pode ou deve caminhar: numa altura em que a tecnologia é ubíqua, em que o adjectivo "electrónico" aplicado à música normalmente se refere a "dançável" e em que todos os produtores usam meios digitais (queiram ou não, saibam ou não que os estão a utilizar!), o que será então a música digital, ou a música feita com o computador? Queríamos estudar as características intrínsecas da prática digital da produção musical.
Este registo foi gravado entre 2003 e 2006. Foi um disco difícil ou foi um disco pensado ao pormenor?
Foi pensado ao pormenor e desenvolvido calmamente. Com a inversão ou evolução do processo de trabalho não nos interessava ter que acelerar soluções, mas antes poder calma e atempadamente desenvolver cada uma das peças e trabalhar a configuração final das peças e do disco. Não foi no entanto um processo "difícil", muito pelo contrário foi um processo que nos manteve motivados e empenhados durante todo este tempo. As peças neste disco, ao cruzarem temporal e espacialmente o seu desenvolvimento com outros projectos do @c - performances, vídeo, instalação - acabaram por não só beneficiar de todos estes outros projectos como de os influenciar também.
Que tipo de dinâmica existe entre ti e o Pedro Tudela na criação musical? Como é o processo de produção dos @c?
Não temos um processo de trabalho formatado ou estanque. Ambos desenvolvemos partes das peças ou esboços para peças quer em conjunto quer individualmente. A composição final é normalmente feita em conjunto mas até chegarmos a uma versão final, ouvimos cada uma das peças dezenas (ou centenas) de vezes, e passamos por fases evolutivas paralelas, mais uma vez individualmente ou em conjunto. Creio que em média as peças passaram por entre 30 e 50 fases semi-finais de mistura e composição...
Quanta pesquisa existe neste disco e quanta improvisação? Existem em quantidades iguais ou a balança pende para algum dos lados?
Creio que actualmente a balança pende mais para o trabalho de campo, de estúdio, para a pesquisa e descoberta bem como para o desenvolvimento estratégico de composições para nós ou para terceiros (temos por exemplo trabalhado bastante com o grupo de percussão Drumming, compondo para ensemble de percussão ou para grupos mistos). A improvisação continua a desempenhar um papel importante em determinadas fases do processo de trabalho e na reconversão "ao vivo" das peças, mas já não é o principal eixo do processo criativo como em foi em tempos.
Pessoalmente falando, que retrato farias da música electrónica feita em Portugal hoje em dia? Existem alguns projectos que sigas atentamente?
Temos seguido com bastante atenção alguns músicos e projectos, quer pela sua proximidade (porque tocamos juntos, desenvolvemos projectos colaborativos ou os editamos na crónica) quer pelo interesse que a sua produção nos desperta. A "cena" portuguesa é pequena, mas não nos parece que seja desproporcionadamente pequena em relação à escala do país. Paulo Raposo, Vitor Joaquim, The Beautiful Schizophonic, Carlos Zíngaro, André Gonçalves, Autodigest, são todos autores que tentamos acompanhar de perto na chamada "música electrónica experimental", bem como uma série de músicos interessantíssimos na "cena" lisboeta da música improvisada e experimental.
Como acompanhas o fenómeno das netlabels e das editoras em CD-R? Qual é a tua ligação com esses formatos?
Enquanto @c temos um par de edições feitas em netlabels e em editoras de CD-R. Gosto muito do formato digital (e acho, em geral, que o futuro da distribuição passa justamente por aqui) mas creio que o modelo das netlabels ainda não atingiu a maturidade, sobretudo no que diz respeito quer à promoção que fazem das edições quer à visibilidade pública que conseguem quer para as edições quer para as netlabels.
Que ligações traçarias entre as várias funções artísticas que desempenhas? Como é que se contemplam?
É difícil sistematizar isto. O Pedro Tudela é artista plástico, músico, cenógrafo e professor. Eu sou designer de comunicação, músico e professor também. Ambos trabalhamos frequentemente em bastantes projectos paralelamente e todas estas actividades acabam por influenciar directa ou indirectamente a música que produzimos. A colaboração contínua com a Lia também surte efeitos na música...
Em que momento se encontra a Crónica? Parece-te que o reconhecimento do trabalho da editora vem mais de fora do que de dentro?
Sem dúvida. O "reconhecimento" nacional, para além do círculo mais ou menos restrito de músicos e alguns seguidores mais atentos da nossa actividade é, creio, diminuto. Não será talvez estranho a isto estarmos baseados no Porto, embora não seja esse o único factor, claro. Já não me recordo qual foi a última vez que um media nacional (jornal, rádio, televisão, etc) criticou uma das nossas edições... Mesmo a distribuição em lojas é escassa... Fora de Portugal, e não só na Europa, o panorama é felizmente bastante diferente!
Como é operar a partir do Porto? Como é viver na cidade do Porto para os @c e para a Crónica? O que é que está a mudar na cidade e o que é devia mudar na cidade?
Nesta como em qualquer outra cidade, há sempre um grande conjunto de factores que deveriam (ou poderiam mudar) mas, felizmente, actualmente e cidade é um bom sítio para se viver e trabalhar. Em primeiro lugar, a nossa actividade passa muito pela Faculdade de Belas Artes, onde ambos leccionamos e onde diariamente somos confrontados com uma dinâmica intelectual e de produção que é não só animadora como desafiadora. As poucas instituições e agentes culturais da cidade com actividade regular são na sua maioria bastante atentas e vão conseguindo propor programas muito interessantes (embora menos do que seria desejável ou do que é "normal" noutras cidades de maior dimensão). Desde há alguns anos a mobilidade foi bastante facilitada, não só com o novo aeroporto como com as novas companhias aéreas que para ele operam, por isso sentimo-nos cada vez menos isolados ou "remotos" e, finalmente, muita da nossa actividade e comunicação passa por meios de comunicação digitais, o que nos permite desenvolver o mesmo trabalho aqui ou em qualquer outro lugar do mundo... Quando à outra questão que está aqui implícita, relativa às diferenças entre operar a partir do Porto ou a partir de Lisboa, pela minha parte creio que as diferenças não são tão substanciais quanto isso. Estamos obviamente mais longe dos agentes culturais da "capital" e naturalmente sentimos que isso tem um efeito relativo nas oportunidades que nos são oferecidas e nas propostas que nos são feitas. Estamos também (e talvez acima de tudo) longe dos media, como já referi na resposta à questão anterior.
Há alguma razão para este disco ter sido editado na Grain of Sound e não na Crónica?
Não existe nenhuma razão especial, para além da simpatia que nós temos pelo trabalho que a Grain of Sound tem desenvolvido e a vontade que tínhamos em também contribuir para o seu catálogo. Temos um trabalho em preparação para edição na Crónica e outro para edição pela Feld, de Frankfurt. Creio que é inevitável que se associe sempre o @c à Crónica, afinal ambos colaboramos com a editora, mas não sentimos que isso nos obrigue a realizar todas as edições do @c na Crónica. Talvez nos seja benéfico distribuir algum do nosso trabalho por outras editoras, que naturalmente trabalharão noutros canais de distribuição e promoção.
Que esperam os @c da actuação na Casa da Música no próximo dia 3 de Fevereiro? Que vos parece a ideia do Clubbing e como se sentem ao lado de projectos tão distintos?
Em relação ao Clubbing, sentimo-nos tão integrados como desintegrados. A nossa performance é promovida com os restantes concertos mas é simultaneamente realizada noutro espaço, mais cedo e com entrada gratuita. Gosto bastante da ideia de a Casa da Música tentar integrar sempre músicos portugueses na programação do Clubbing, embora creio que o @c estará cada vez menos próximo das estéticas que motivam estes eventos. E esta diversidade na programação do evento é em si mesma um aspecto positivo! Em relação a expectativas: vamos apresentar pela primeira vez uma das peças em que estamos a trabalhar para o novo disco e não só nos vamos poder apresentar ao vivo com a Lia, como o vamos fazer num espaço com características muito interessantes para o trabalho que fazemos. Por isso elas são altas...
No sábado acontece também no corredor poente da Casa da Música a inauguração da instalação "30x1.2" creditada a Pedro Tudela, Miguel Carvalhais e Lia. O que é que nos podes dizer acerca disto?
"30x1.2" é uma instalação baseada no sistema audiovisual modular que desenvolvemos para a exposição na Solar, Galeria de Arte Cinemática, em Vila do Conde, em Setembro de 2005. Essa exposição intitulava-se "30x1" e sempre pretendemos desenvolver outras peças a partir do mesmo sistema. Um vídeo linear com o título "30x1.1" foi a primeira (já foi projectado entretanto em festivais em Madrid, Hamburgo, Lausanne, Porto e Viena) e esta peça será montada agora em regime de instalação na Casa da Música. Temos em preparação um projecto de edição também desenvolvido a partir deste sistema, mas ainda não conseguimos prever quando o terminaremos.
andregomes@bodyspace.net
RELACIONADO / @c