ENTREVISTAS
AbztraQt Sir Q
A Oriente tudo de novo
· 06 Abr 2009 · 19:12 ·
© Laura Ramos
No felizmente agora fervente panorama musical português, os AbztraQt Sir Q são um caso sério. Envoltos numa capa misteriosa de alter-egos e ficções, contribuiram e de que maneira para que 2008, o ano negro da crise mundial, ficasse para a história também como um dos melhores anos de sempre da música portuguesa. Mas a sua contribuição foi mais pela sua própria nacionalidade, porque nem cantam em português, nem o seu som reflecte Portugal de alguma forma especial. Mas também não são uma variante portuguesa de sons marcadamente anglo-saxónicos (que também houve em 2008 e bons). Pelo contrário, o seu som é absolutamente global, cosmopolita, sem nacionalidade aparente. Aliás, se reflecte algo português, é a alma lusa intemporal que há mais de 5 séculos se lançou por esse mar fora, rumo ao Oriente, ao desconhecido, numa das mais fabulosas experimentações de que há memória. Os Descobrimentos. Termo que tão bem se aplica a estes senhores e senhora, de seu nome Mundina Moruniq, uma senhora Senhora Voz que descobre novas latitudes e longitudes ao sabor dos navegadores sónicos da banda. Foi com um deles, Egon Crippa, que conseguimos falar. Isto apesar de se auto-intitular o baixista esquivo dos AbztraQt Sir Q. Esquivo ou não, teve a amabilidade de se deixar apanhar por uns instantes na ilha Xing Xu, não longe dos jardins do seu Xing Palace Place, e por momentos ser o porta-voz dos enigmáticos responsáveis por um dos melhores discos portugueses do ano passado.
Como se conheceram e como chegaram ao nome AbztraQt Sir Q? E o que pretendem dizer com as letras em maiúsculas no meio da palavra?

Conhecemo-nos todos através de anúncios. A Mundina inicialmente respondeu a um anúncio de uma banda do Peter Shuy chamada Abstract Circle. Uma vez que ambos não estavam satisfeitos com o caminho que a banda estava a tomar resolveram sair e criar um novo projecto apelidado AbztraQt Sir Q. Começaram então a procurar novos elementos para completar a formação e encontraram o Andy Newman e, por último, a mim. O nome da banda é obviamente uma derivação fonética da banda anterior, algo que a Mundina faz recorrentemente nas suas letras. A “deturpação” ortográfica, assim como o uso de Qs maíusculos, está também ligada a forma como ela escreve. A forma como o nome surge na capa do álbum, AbZTRAQT SiR Q, foi uma opção gráfica do Bruno Roda, autor de todo o grafismo.

E a origem dos vossos alter-egos? Têm algum significado especial ou nem por isso?

Desde o início que nos propusemos a fazer uma música diferente e achámos que um bom ponto de partida seria transportarmo-nos para uma realidade diferente. Daí termos criado estas quatro personagens que vivem num universo imaginário. Cada um de nós definiu a biografia do seu alter-ego, usando, ou não, traços da sua própria personalidade. O facto de nos distanciarmos da vida quotidiana facilita-nos a criação de um universo musical muito próprio.

Quem vos ouve sente uma grande aproximação a terras do Extremo Oriente. Já viajaram por lá, juntos ou pessoalmente?

Nunca lá estivemos em conjunto e apenas alguns membros já lá foram. Decidimos situar as nossas personagens no extremo oriente precisamente por termos algum fascínio por essa zona do planeta. A forma como isso se reflecte na nossa música é completamente intuitiva, até porque não fizemos qualquer tipo de recolha etnográfica.

E a vossa experiência em digressão no Reino Unido, como foi? Deu-vos outro calo para tocar ao vivo, certo?

Sem dúvida. Por um lado o circuito de concertos é extremamente dinâmico, tocámos em condições e com bandas o mais diversas possível, e por outro lado o público revelou-se muito interessado e disponível relativamente a uma banda que desconhecia totalmente. É definitivamente uma experiência a repetir.

Quanto ao Qorn Pop Garden, estão contentes com a divulgação do disco?

Não fazemos uma música de massas, por isso não faz muito sentido uma divulgação generalista, nem temos meios para isso, mas sim orientada para meios específicos. Temos conseguido chegar aos orgãos mais importantes da imprensa escrita e da web, às rádios locais e mesmo algumas nacionais, o que tem sido muito positivo.

© Laura Ramos

Denotam-se várias (e boas) influências musicais em Qorn Pop Garden. Assim de repente, três ou cinco discos que vos acompanharam nas gravações?

O disco foi gravado há mais de dois anos por isso não me recordo exactamente o que andávamos a ouvir nessa altura. Apenas me lembro de alguns episódios pontuais em que ouvimos outra música que não a nossa. Lembro-me do nosso produtor, o Zé Nando Pimenta nos ter mostrado o disco da banda dele, a Zany Dislexic Band, lembro me numa das noites ter ficado até às tantas a ver um concerto do Marc Ribot no canal Mezzo e lembro-me de uma manhã, antes de irmos para o estúdio, termos ficado a ver o Top10 dos Blondie na Mtv. E não sei se isso teve algum reflexo na gravação do disco. Vocês o dirão.

Diria que Blonde Redhead e Deerhoof são bandas que têm bastante em comum com vocês. Concordam? Gostam deles em particular?

Gosto bastante das duas. Ambas tem uma faceta mais experimental sem nunca perderem a sensibilidade pop (ou vice-versa), o que, de facto, também procuramos na nossa música. Não são, no entanto, os primeiros nomes que me ocorreriam como referências pessoais. E estou certo de que alguns membros da banda nem sequer conhecem os discos deles.

OK, voltando aos AbztraQt, dos vossos concertos ao vivo, até agora qual foi o mais marcante?

Há vários concertos, por razões diversas, que nos deixaram boas recordações e não é fácil salientar um. Talvez o último concerto da digressão em Inglaterra, em Nottingham. Íamos fechar a noite, depois de outras três bandas que andavam em digressão juntas, e que tinham uma sonoridade bastante mais mainstream do que a nossa. A maior parte do público estava claramente lá para os ver, e nós receávamos que assim que começássemos a tocar se desse a debandada geral. Surpreendentemente, não só isso não aconteceu como a reacção foi entusiástica, começando precisamente pelos membros das outras bandas. Foi uma boa maneira de acabar a digressão.

Planos para 2009?

Vamos tentar tocar o máximo possível, dentro e fora de Portugal. Temos alguns temas novos que queremos gravar brevemente embora ainda não estejam definidos em que moldes vão ser editados.

O vosso som é uma espécie de som “cidadão do Mundo”, multicultural e desenraízado. Já vos passou pela cabeça sair de Portugal definitivamente, Nova Iorque, Londres, ou pensam ficar por cá?

Ainda não considerámos essa hipótese até porque temos vidas (e profissões) paralelas à música, o que torna tudo mais complicado. Por outro lado, com o desenvolvimento dos meios de comunicação, em particular da internet e dos formatos digitais, é cada vez menos condicionante o sítio onde vives. A informação que recebes e até onde consegues fazer chegar a tua “informação” depende cada vez menos disso.

Para acabar, uma pergunta Loja do Cidadão. Vá lá, os vossos nomes no B.I.?

André Novo, Gonçalo Castro, Mundina MoruniQ, Pedro Evaristo.
Nuno Leal
nunleal@gmail.com
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