Top 2010 · Top Portugueses 2010 · Topes Individuais · Momentos 2010 · Topes Ilustres
Até prova em contrário, os !!! não são capazes de fazer um disco mau. Mais: até prova em contrário os !!! não são capazes de fazer um disco abaixo de muito bom. Strange Weather, Isn't It? é mais um tornado cheio de funk, sexo, guitarras libidinosas e ganchos capazes de incendiar a mais mortiça das pistas de dança. Uma canção como "Jamie, My Intentions Are Bass" carrega anos e anos de pura sensualidade e poderá muito bem vir a ser usada daqui a alguns anos como alternativa natural ao Cialis e ao Viagra no combate à impotência ou à disfunção eréctil. Nenhuma banda como os !!! (ou os LCD Soundsystem), saída daquela vaga de novo rock, conseguiu aguentar-se assim: tão profícuos e interessantes. Não é Louden Up Now, nem tem de ser: mas é mesmo assim verdadeiramente entusiasmante. Vejam lá: este disco pode ser muito bem aquele argumento final para convencerem a vossa cara-metade a tentar qualquer coisinha com aquele casal giro com quem se andam a dar ultimamente. AG
Se Rifts cristalizou um passado mais ou menos recente para um reconhecimento mais generalizado, Returnal foi a constatação óbvia da importância de Daniel Lopatin num já saturado meio onde os sintetizadores em devoção à Kösmische imperam. Memória, pré-cognição, retro-futurismo, pardais ao ninho. Em Returnal a nostalgia não é imposta, antes sugerida (Chillwave? Não me fodam), força de um conhecimento quase enciclopédico das potencialidades da electrónica num contexto pré-computorizado e de um talento para as recontextualizar numa actualidade premente. Menos coerente do que a trilogia que o precedeu, Returnal incide com bons resultados num som já reconhecível, ao mesmo tempo que abre naturalmente diversas portas que apontam para um futuro prenhe de possibilidades. Porque é nesse limbo entre possibilidade e concretização que reside o verdadeiro valor de uma música sempre aberta a novas leituras, onde o tempo é apenas mais uma variável. BS
É o disco mais conservador dos Emeralds, mas deles não esperamos desafios estéticos. É certo que são conotados com a música experimental e presença regular em publicações como a Wire, mas os Emeralds fazem música que, a bem da verdade, tanto satisfaz as necessidades de voos psicadélicos da geração pós-Wolf Eyes, como as dos pais, que cresceram a ouvir Tangerine Dream (e que, às escondidas, ainda fumam umas ganzas enquanto metem Phaedra a rodar). Com sorte até a vossa tia é capaz de gostar, se lhe mostrarem isto na noite de Natal. A receita é a mesma de sempre - camadas e camadas de sintetizadores, com a guitarra de Mark Mcguire a planar sobre tudo isto -, mas os resultados são mais directos, mais… pop. Belos, como sempre. Ouçam "Candy Shoppe", espécie de balada para andróides, ou "Genetic", com arpejos tão fortes que parecem riffs amigos do headbanging. Bem, ouçam tudo. PR
Em primeiro lugar: dou grande valor ao que o “super-quinteto” de Sam the Kid, Fred Ferreira, Francisco Rebelo, João Gomes e DJ Cruzfader fez neste capítulo inicial duma história que espero venha a ser de aprofundamento e abertura. “Aprofundamento” das raízes presentes nas composições e da vontade em investir na vertente live, quase rock n’ roll – que não cabe na rodela analógica ou no ficheiro digital. Abertura – a novos horizontes e sonoridades que façam deste um projecto (ainda) mais original, não só no panorama interno como eventualmente internacional. Não é por acaso que este disco e o do (subvalorizado) Rocky Marsiano entram nas minhas preferências de 2010. Vão ambos beber, em boa medida, às mesmas fonte, reciclando-as com novas e sedutoras vestes. E são compostos por músicos invejáveis. A estreia da Orelha Negra foi bastante auspiciosa. Talvez não seja a tal viagem ao futuro anunciada na faixa 7… mas Roma e Pavia também não se fizeram num dia. HRP
Íamos a meio do ano e ao antecipar o verão apostamos muitas fichas neste disco. Ao lado de Crazy for You, da sua Best Coast, fez a melhor dupla solarenga da classe de '10 e tornou-se a banda sonora ideal para quem vai a caminho da praia sob o sol a queimar. Nathan Williams mostrou-se aqui, ao terceiro disco, impecavelmente certeiro: canções de três minutos, guitarras abrasivas, energia e eficiência punk. Bem mais directo e acessível que o anterior Wavvves, este King of the Beach é um compêndio de simplicidade rock, uma incrível sequência de canções que nos engatam sem grandes conversas. Da tábua do skate passamos para a prancha de surf e, não haja dúvidas, ele é o novo rei da praia. Minha querida Bethany Cosentino, deixa que te diga: o teu gajo é qualquer coisa! NC
Não foi uma história de amor à primeira vista, daí a perseverança da coisa: tantos meses depois continuamos a ouvir Causers of This como se tivesse sido lançado na semana anterior. A música inventiva de Chaz Bundick soava demasiado indie-pop aos nossos ouvidos enfadados com apontamentos de produção replicados a partir de Animal Collective (talvez a maior fonte de usurpação criativa da última década). Só à terceira ou quarta audição é que começámos a entrar no disco, a pactuar com a hiper-sensibilidade mas, simultaneamente, a saber descobrir-lhe a acidez escondida, os ritmos gordurosos, em suma, uma sua dupla face, num momento Beach House ou Real Estate e noutro logo a seguir Mocky ou Jamie Lidell. E quem o acusar de demasiada pureza computacional de estúdio é porque não o apanhou ao vivo em Barcelos ou Lisboa: é que em palco Toro Y Mai ganha espontaneidade e parece tocar e cantar com o diabo no corpo. Ora esperemos que o segundo disco anunciado para 2011 pela Carpark não nos deixe ficar mal. GS
Maravilhoso, maravilhoso! Canções indie a flutuar num cocktail lisérgico, com tudo no sítio. Brilhante súmula de canções pop perfeitas de outras eras, filtradas por uma nuvem de reverb e a voz de outsider frágil de Bradford Cox a voar sobre tudo isto. É algo irreal a forma como os Deerhunter fizeram um disco destes, concentrando os bons sinais dos álbuns anteriores para fazer a sua obra maior. "Revival"? Ai mamã, que cançãozinha tão bonita, a lembrar aqueles tempos áureos em que o rock'n'roll eram quatro acordes dispostos de forma alquimicamente perfeita. "Helicopter"? Maravilha a borbulhar sobre um beat estilo Casio, música algo irreal na forma como se coloca entre a canção e a sonoplastia (desculpem a verborreia, não consigo descrever a coisa sem ela). "Desire Lines"? Inacreditáveis crescendos de guitarras em cima de crescendos, mas sem incomodar o suave torpor que habita quase tudo o que Cox faz? Música indie? Que se lixe isso: isto é música do coração. PR
Não há muitas piadas em One Life Stand e talvez seja isso que faz deste disco o melhor dos Hot Chip. É que é tudo relativamente sincero, da melodia de "I Feel Better", pilhada a "La Isla Bonita" de Madonna, ao hino à amizade em que jogar X-Box é visto como uma das actividades mais bonitas que bros podem partilhar (nunca o fiz, devia experimentar), passando pelo facto de não uma, mas duas das canções terem steel drums (o que é sempre, sempre bom em canções pop). Mas isso não fez com que se tornassem chatos: sempre na fronteira entre o que é foleiro e o que não é, ninguém escreve canções que divirtam como estes gajos, nem que sejam tão memoráveis ou soem tão bem cantadas por aquelas duas vozes. E nem sequer esqueceram a comédia: "I Feel Better" tem um vídeo óptimo realizado pelo genial Peter Serafinowicz, que é, basicamente, um boss, a sério, e quem a ele se associa é automaticamente boa gente. RN
Kieran Hebden. Até podia estar tudo dito, mas duas palavras não bastam para descrever o tipo que melhor samplou em 2010. There Is Love In You foi um dos grandes discos deste ano, onde a electrónica se cruza com ambientes mais acústicos e o sampling é, de facto, um ingrediente maior. É também de lá que retiramos soberbos temas como “Love Cry”, “Angel Echoes” ou “Sing”, momentos de dança lo-fi que teimam em não cair no esquecimento, ao contrário do que tantas alminhas anti-indie costumam apregoar. Aqui, encontramos todo um mundo de micro-texturas processadas a partir de maquinarias analógicas mirabolantes, sintetizadores tanto pujantes como perspicazes, ao ritmo de batidas bem comprimidas. Four Tet já era um tipo bem referenciado, mas agora entrou definitivamente na liga dos campeões do sampling. E é tão fácil de ser barrado à entrada… SM
Se passarmos muito tempo a racionalizar a música, acabamos por, emocionalmente, não entender quem é Flying Lotus e o que tem para dizer. FlyLo não produz por produzir e talvez nem produza para satisfazer o comum mortal. Quando se fala da sua música, e cuspindo fora a boa linhagem que lhe corre no sangue – que por vezes se torna num estigma –, Fyling Lotus é um manipulador de estados de espírito que converte a matéria-prima (hip-hop, pop, electrónica, soul, jazz) como poucos. E isso transformou-o num dos estetas do momento que quer manter a linhagem jazz na sua gramática, mas não quer ficar dependente dos clássicos, preferindo a total liberdade criativa para erguer o seu próprio universo, pessoal, apoteótico (mas sem se tornar num deus). Quer também, porque o espaço (aquele em que cintilam as verdadeiras estrelas) existe para isso mesmo, olhar para o infinito do cosmos como profeta sonoro que quer contemplar as maravilhas naturais sem ser preconceitoso, de as transcrever em forma de sons lúdicos; ser um livre pensador, acreditar numa força transcendente que movimente o universo num único sentido. Flying Lotus volta no fundo, com este belíssimoCosmogramma, a estudar metafísica que faça sentido, pelo menos para ele. As ciências matemáticas, essas, que se fodam. RS |
Topes 2010
· 14 Dez 2010 · 00:48 ·







