Monotonix / Cangarra
Galeria Zé dos Bois, Lisboa
27 Fev 2011
A tristeza é inevitável, ainda que as razões dadas sejam perfeitamente compreensíveis e aceitáveis; esta é a última tour dos Monotonix, a banda sem a qual não existiria metade da mística que permeou (e ainda permeia) o Milhões de Festa de 2010. O trio israelita vai agora dedicar-se à família, ao crescimento dos filhos, para que "possam vir a ser pessoas quase normais". Para trás ficam dois discos, dezenas de concertos excelentes e um culto invejável; que possam voltar, um dia, e apesar da já avançada idade (quarenta e seis!) do vocalista e mestre de cerimónias Ami Shalev, é o que todos os que marcaram presença na Galeria Zé dos Bois, ou aqueles que o fizeram um dia antes, no Hard Club, certamente desejarão. A banda despediu-se em grande de um Portugal que os acolheu - literalmente - em braços, mas promete voltar, quanto mais não seja enquanto turistas.

Um concerto dos Monotonix não é para toda a gente - que o diga o jovem que por duas vezes cedeu às pernas e possivelmente ao álcool ainda antes de uma enorme descarga eléctrica eclodir dos amplificadores. É demasiado rock n´roll para caber num palco, e é por isso que se passeiam de um lado para o outro, empunhando a bateria, erguendo os próprios fãs, lançando ao ar tudo o que esteja à mão, líquidos especialmente. Não importa, neste caso, falar da música em si. Não são as raízes no punk de garagem que merecem elogios, mas a sua atitude, a sua energia, o facto de, a meio do concerto, ficarmos sem saber se foi o som que foi à vida ou se foram os nossos tímpanos. Praticamente banidos de tocar em Israel, e impedidos hoje de saírem à rua e fazerem a festa, o trio não se fez rogado e usou e abusou do espaço que tinha à disposição na ZdB, contando claro está com o apoio dos mais fiéis que raras vezes se afastavam das proximidades do baterista, que era na verdade Cristiano Ronaldo, mas mais pobre e barbudo. Cómico por vezes, animalesco sempre, sério quando teve de o ser, um concerto assim pecará sempre por escasso, mesmo que tenha durado pouco mais de uma hora e ainda tenha havido improvisação na bateria de quem ficou com baquetas para contar a história.

Melhor que no Milhões? Não é comparável, nem pela novidade (ainda que vários não soubessem hoje ao que vinham), nem pela diferença no espaço. Mas que os Monotonix continuam a mostrar ao mundo o que faz uma banda rock ser gigante, o que faz com que a liberdade seja um bem essencial e o que faz com que levar os óculos para um concerto assim seja uma péssima ideia, disso ninguém duvida. Estão os muitos sorrisos e os muitos ouvidos a zunir aí para o confirmar. Podem ter acabado por tempo indeterminado, mas deixaram muito boa gente convertida.

Antes de tudo isto o duo Cangarra, composto por Cláudio Fernandes e Ricardo Martins, apresentou um rock ruidoso não muito diferente daquilo que o baterista faz nos Lobster, com o riff enquanto ovni imenso descendo sobre os presentes e anunciando querer a guerra e não a paz. Foi muito bom, sim, e destacamos a fúria com que tocam a sua música, mas não é deles que nos lembraremos quando falarmos desta noite. Desde já pedimos desculpa, mas com a convição de que um dia será o duo a ficar na memória colectiva dos concert-goers. Barukh atah Adonai, Eloheinu, melekh ha´olam...
· 28 Fev 2011 · 11:00 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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