DISCOS
Mark McGuire
Living with Yourself
· 05 Nov 2010 · 10:36 ·
Mark McGuire
Living with Yourself
2010
eMego


Sítios oficiais:
- Mark McGuire
- eMego
Mark McGuire
Living with Yourself
2010
eMego


Sítios oficiais:
- Mark McGuire
- eMego
O conforto do lar pelas mãos do guitarrista dos Emeralds.
Um olhar em retrospectiva, imbuído na devida dose de nostalgia, faz sempre da infância um local mágico, onde a coabitação do seio familiar perde todas as picardias de outrora. Até aqueles passeios domingueiros, que na altura tanta birra originavam no banco de trás do Peugeot 504, são relembrados com um carinho difuso, onde mesmo o choro se reveste de um estranho conforto. Não há forgive and forget, antes um espaço mental onde todas as memórias apontam para dias felizes. Uma tendência recente (pense-se naquilo a que chamam de chillwave) preferível à catarse sofredora de infâncias melindradas, que descambavam no tédio confessional.

Living with Yourself é uma homenagem sentida de Mark McGuire à sua família e amigos, e como qualquer artefacto bonito, transporta-se para o passado. Como se o crescimento viesse a toldar o sentimento por via de uma racionalidade austera, e tudo aquilo que passou fosse mais sincero. Instala-se aquele conforto que apenas o tempo permite. Conforto é a palavra mais adequada para esta estreia do guitarrista dos Emeralds na editora austríaca. De certo modo, num paralelo com a obra da sua banda principal, cujo mais recente Does It Look Like I'm Here? apontava também caminho a um som cada vez menos exigente.

Deixando de lado as tendências mais fosforescentes de discos como Must Not Have Meant That Much, ou a volatilidade de Tidings, Living With Yourself é um disco deliberadamente construído, de temas relativamente curtos assentes numa determinada ideia melódica simples que vai florescendo numa sequência interna lógica, sem grandes desvios e atropelos. Apesar dessa atenção ao detalhe, não deixa de soar convenientemente descomprometido, como seria de esperar de um álbum com objectivos tão naturalmente definidos. Exemplificados de modo perfeito num arranjo gráfico que deixa, desde logo, antever a ambiência geral de Living With Yourself.

Abate-se uma ténue melancolia, como aquele suspiro back in the old days, de quem sabe que esses dias nunca poderão ser revividos mas, acima de tudo, é uma felicidade apaziguadora que se deixa transparecer. Composto em guitarra eléctrica e acústica, mas sempre filtrado pela ressonância do eco e do delay, Living With Yourself é o álbum mais coerente de Mark McGuire até hoje, claro exemplo de maturação de um guitarrista conhecedor das suas virtudes, mas pouco disposto a arriscar. É neste ponto que Living With Yourself falha primordialmente, com a sua atmosfera agradável a impor-se constantemente, acercando-se de algo formulaico. Dada a incapacidade de deslumbramento das melodias (apesar de se lhes reconhecer alguma beleza), Living With Yourself incorre facilmente na mediania.

Com os temas a crescerem de um modo previsível (mesmo que subsistam boas ideias), são as faixas mais pequenas que se safam melhor no capítulo de polaroids de infância, pela sua incapacidade de aborrecerem com tanta fofura. Como contraponto, o final com “Brothers (For Matt)” almeja o épico através de um crescendo grandiloquente (com bateria de Nate Scheibel), mas resvala para o mastigar preguiçoso de algum post-rock (facção Explosions in the Sky e quejandos), numa demonstração de amor inusitada.

Disco demasiado confortável na sua falta de ambição (o que não seria necessariamente mau), será uma aposta segura para os dias de Outono que se avizinham. Todos aqueles que facilmente se aborrecem com reuniões familiares onde não há confusão soltarão um bocejo tranquilo.
Bruno Silva
celasdeathsquad@gmail.com
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