bodyspace.net


World’s End Girlfriend
A terra dos sonhos


Em Lost in Translation, Sofia Coppola juntou Scarlett Johansson e Bill Murray (ambos perdidos e à deriva) numa história de amor e amizade que se desenrola em Tokyo, no Japão. Ambos estão insatisfeitos com as suas próprias vidas e encontram ali, naquela fervilhante cidade, uma escapatória à vida real, à rotina. Da banda sonora constam nomes como os Jesus & Mary Chain, My Bloody Valentine, Squarepusher ou os Air mas tivesse Sofia Coppola apostado na prata da casa (o Japão), World’s end Girlfriend podia muito bem ser um dos nomes a ilustrar sonoramente Lost in Translation. O seu perfil é omitido no cantinho que lhe é dedicado na página da Noble Records por isso não há muito a contar acerca de World’s End Girlfriend a não ser sobre a música que criou nos últimos anos. O último disco, The Lie Lay Land é mais um passo em frente no seguimento de discos como Farewell Kingdom e Dream's End Come True (discos-pérolas vindos diectamente do Japão). Um passo de imprevisibilidade e encanto. Junji Kubo da Noble Records (editora que tem servido de poiso aos maravilhosos sons de World’s End Girlfriend) serviu de interlocutor numa entrevista que começou em inglês, transformou-se em japonês e voltou ao inglês. Sofia Coppola havia de gostar disto.

Quando é que começaste a fazer música?

Quando eu tinha uns 12 anos.

Algumas pessoas dizem que o reconhecimento de World’s End Girlfriend se deu quando da actuação no festival Sonar em Barcelona no ano de 2002. Vês esse concerto como um momento especial? Achas que te deu um reconhecimento especial?


Pessoalmente não acho que o Sonar 2002 me tenha dado mais reconhecimento do que outros concertos. Não vejo o evento como algo mais especial que qualquer outro dos meus concertos. Ainda hoje acho que o meu trabalho precisava de muita ajuda em termos de distribuição na Europa.

O que é que usas para fazer música? Como é que concilias os elementos orgânicos com os elementos não orgânicos?

Primeiro faço uma demo utilizando o meu computador, piano e guitarra. Depois faço uma partitura se necessário. Depois gravo e se for necessário faço alguma edição no meu PC. No que diz respeito à conciliação de diferentes sons, por vezes tento balança-los e outras vezes deixo-os chocar intencionalmente. Acho que isso depende primeiramente daquilo que a canção dita.

Como é que sabes quando é que os teus discos estão prontos, quando eles estão finalizados?


As canções ficam acabadas quando elas estão completas. Desculpa não conseguir explicar melhor, mas nunca tive de ponderar quando parar de trabalhar numa canção.

Quando ouço a tua música, penso em forças da natureza, coisas como vulcões, tempestades, tremores de terra. Concordas? A tua música é de alguma forma inspirada pela natureza?


É naturalíssimo ser-se inspirado pela natureza quando se cria arte. No entanto, não penso literalmente em vulcões ou tremores de terra quando escrevo as minhas peças. Apesar, se quiseres tomar isso como uma metáfora, acho que pode-se dizer que eu tento exprimir os vulcões ou tremores de terra que ocorrem no seio da alma humana. Visto que o mundo para lá da carne e da alma não está muitas vezes em estado de calma. Sou inspirada pela natureza continuamente. Nasci numa pequena ilha no campo que não tinha comboios, salas de cinema ou lojas de discos. Tudo aquilo que tínhamos era o mar, as montanhas e os tufões que matava pessoas anualmente. Por isso por estas razões acho que tenho uma grande união com o meio ambiente e aprendi igualmente que ninguém é mais esperto do que a natureza.

O som dos teus discos parece sempre tão universal. Temos pós-rock, jazz, electrónica, música ambiente e techno. Como é conciliar todos estes mundos?

Se pensares na música como uma grande árvore, verás que com a passagem do tempo ela cresce continuamente e divide-se em imensos ramos. A minha música e os diferentes estilos que mencionas são ainda parte dos ramos finos e jovens. Se te centrares nestes ramos eles podem todos parecer sem qualquer relação, mas se deres um passo atrás e observares a imagem mais ampla verás que todos estes ramos finos se ligam ao tronco principal.

Ao mesmo tempo os teus discos parecem mostrar alguns elementos da música japonesa. Sentes esses elementos, é intencional?

Sim, eu sinto esses elementos japoneses porque sou do Japão. Ouço comentários destes vindos de japoneses nativos também. Não, não é intencional.

A tua música é igualmente muito cinemática. Crês existir alguma relação possível entre a tua música e o cinema? Já pensaste alguma vez escrever música para bandas sonoras?

Quando escrevo, nunca uso bandas sonoras como tema. Por outro lado, o meu método pode ser próximo ao fazer de um filme ou a escrever-se uma novela. Estes últimos anos tenho-me inspirado em filmes e livros em vez de música.

O teu perfil aparece escondido na página da Noble. Por que razão decidiste esconder a tua personalidade e separa-la da música que fazes?

No mundo em que vivemos não te podes ver a ti mesmo e acho que o mesmo se aplica à minha música. Mesmo que te pudesses ver a ti mesmo, alguém pode discutir que isso seja apenas um reflexo.

Fazes igualmente música como World’s End Boyfriend. Quais são as principais diferenças entre a música feita sob a alcunha dos dois diferentes nicknames?

A raiz é a mesma, mas acho que podes compara-lo à forma como alguém age quando está sozinho e quando essa pessoa está com outras pessoas. Eu não diferencio conscientemente entre WEG e WEB mas vejo o que queres dizer quando dizes que notas as diferenças.

Farewell Kingdom é, na minha opinião, o teu trabalho mais coeso até aos dias de hoje. Parece quase um bilhete de identidade da tua música. Concordas com isto. É um disco especial para ti?

Lamento mas vou ter de discordar, Farewell Kingdom é apenas um ponto de vantagem para mim. Por exemplo, é como um pensamento em que eu estou a concentrar-me num castelo que existe num mundo imaginário. Mas à volta deste castelo existe todo um outro ambiente com muitos tipos diferentes de pessoas que lá vivem. Concentrar-se nisso contaria outra história.

The Lie Lay Land é o teu disco mais recente. Parece um pouco mais negro que os outros discos e introduz alguns novos elementos na tua música – parece ser o teu disco mais diverso até aos dias de hoje. O que é que nos podes contar sobe isto?

Antes de mais não o acho assim tão negro. Acho que esta assim chamada escuridão é uma parte do dia a dia comum. E esta escuridão existiu sempre na minha música. Por outro lado, o disco que lancei com os Mono em Dezembro tem uma expressão de luz e escuridão mais profunda e menos vulgar. Pessoalmente acho que Ending Story é o meu disco mais diverso até agora.

Tens usualmente outras pessoas a tocar nos teus discos. Que papel é que essas pessoas representam nos teus discos? Dás-lhes a liberdade de criação ou comanda-los para que alcancem os resultados que desejas alcançar?

Basicamente, tudo é-lhes dado em forma de partitura por isso nada é improvisado.

Como é a tua relação com a Noble, a editora em que confias o lançamento dos teus discos?

Eles dão-me predomínio absolutamente livre o que eu aprecio bastante.

Como é viver no Japão?


Sinto que o Japão apanhou uma grande doença agora. É uma terrível condição que tantas crianças estejam a ser assassinadas aqui. Muitos problemas estão a brotar, mas continuo a viver e a fazer música no Japão.

Dás muitos concertos no Japão? Qual é a reacção das pessoas à tua música quando em comparação com a Europa?

Não, não toco muito no Japão. As pessoas que me vêm ver aqui já me conhecem, enquanto que na Europa há muitas pessoas que não conhecem WEG e isso é bastante entusiasmante. O feedback é sempre simpático independentemente do país.

Como é a cena musical japonesa? Existem grupos identificáveis de pessoas fazendo música interligados por algum elemento em comum?

Acho que a cena musical japonesa é muito interessante neste momento.

Aprecias a música que é feita no Japão neste momento? Podes indicar-nos alguns projectos japoneses que aprecies?

Eu aprecio ouvir imensa música japonesa tal como Mono, Envy, Cornelius, Joseph Nothing, com.a, Otomo Yoshihide, Kikuchi Naruyoshi, Nanao Tavito, Origami, Minamo, Piana, Kazumi Nikaido, Tujiko Noriko, Hashimoto Kazumasa, Milch of Source, Eel, P-Shirts, Akainu, Yoshihiro Hanno, Goth-trad, Takeo Toyama e outros.

O que é que esperas fazer no futuro? Estás a preparar algum novo lançamento?

Vou começar a fazer faixas demo para o próximo álbum a partir de agora.


André Gomes
andregomes@bodyspace.net
23/01/2006