bodyspace.net


Daily Misconceptions
Viagem onírica


João Santos é Daily Misconceptions, um projeto musical em formato one man band que aproveita o trabalho videográfico de Sara Esteves para completar o caleidoscópio de paisagens e emoções transmitidas por onda sonora. Desde 2002 que tem trabalhado em EP's, compilações, remixes e outras coisas que tal, chegando agora ao primeiro álbum, “Our Little Sequence Of Dreams”. O senhor dos títulos longos falou ao Bodyspace sobre a viagem que levou a este registo de estúdio, bem como a carreira até aqui, o Um Ao Molhe e até com uma participação especial de Sara Esteves, que aprofunda o conceito por detrás do lado visual nas atuações ao vivo.

Ao Bodyspace, explica que o novo álbum aproxima quem ouve de “uma atmosfera irreal” e parte de momentos pessoais numa viagem onírica num caminho novo que considera estar a ser bem recebido. Mas o projeto não para por aqui e João já começa a levantar a ponta do véu para 2017, embora 2016 ainda tenha várias novidades reservadas para os fãs do projeto.
“Our Little Sequence Of Dreams” nasce de onde? Qual a história, a narrativa (ou narrativas) por detrás deste novo álbum?

“Our Little Sequence of Dreams” nasce da necessidade de partilhar ideias, sentimentos, experiências e vivências relacionadas com um período específico da minha vida. É baseado em momentos pessoais, não sendo auto-biográfico. Traz-nos uma história sobre o indefinido, a falta de “casa” e a procura do conforto. Tudo em “Our Little Sequence of Dreams” é mais orgânico e manual, no entanto, aproxima-nos de uma atmosfera irreal.

Há aqui uma ideia de viagem (não no sentido exterior), não?

Sim, essa ideia está presente. Sem narrativa cronológica mas evolutiva. Os momentos presentes nesta viagem foram vividos e interiorizados, para depois serem escolhidos, adaptados e recriados, com o intuito de serem partilhados.

É neste espaço onírico que melhor se posiciona a música que fazes há dez anos?

Penso que sim. E dentro desse espaço, tem vindo a evoluir autonomamente, com uma identidade muito característica.

© Patrícia Pinto

Normalmente os títulos são muito falados pela sua extensão. Desta vez, com o primeiro single, volta a não ser exceção. Qual é o peso e o simbolismo dos títulos no trabalho de Daily Misconceptions?

Como a música é maioritariamente instrumental e a voz se encontra ausente ou em segundo plano, acabo por sentir necessidade de por vezes deixar bem claro o que quero dizer. Ultimamente tenho vindo a utilizar os títulos como uma extensão do tema da música. “LOP” foi inspirado num conto escrito ao som de Daily Misconceptions, pela Arina Wagner. Em “LOP”, todos os títulos são frases retiradas desse mesmo conto. O nome de “Little Grains Of Rice Running Away From A Plate In Fear Of The Chopsticks” acaba por ser uma piada que vem do tempo do myspace. E numa altura em que tudo tem de ser imediato e sucinto, achei irónico que o primeiro single tivesse um nome gigante, só para ver como seriam as reacções. Não existe um simbolismo pré-determinado, depende muito da situação, do tema ou de uma piada.

É o primeiro LP da carreira. Como tem sido a receção?

Tem sido positiva. Parece-me que o público está a receber “Our Little Sequence of Dreams” com simpatia e sinceridade. Tenho recebido muito feedback positivo de músicos e colegas dos quais sou grande admirador, e isso para mim tem sido incrível. Estou curioso para ver como é que o público reage quando ouvir “Our Little Sequence of Dreams” ao vivo.

Porquê agora, o lançamento de um longa-duração?

Porque tinha uma história para contar, que não cabia num EP.

Pode dizer-se que resulta da experiência acumulada do trabalho que Daily Misconceptions foi lançando até agora?

Nem por isso. É preciso ter em conta que o “LOP” foi editado mais cedo mas gravado depois de “Our Little Sequence of Dreams”, assim como o hiato presente entre “If i hug your sweaters will they get their colour back?” e este primeiro álbum. Não me parece que seja um resultado de experiência acumulada mas sim uma reflexão sobre o trabalho anteriormente criado, que acaba por desenvolver um certo interesse numa nova visão e, por sua vez, uma necessidade de experimentação na composição. Musicalmente, este álbum aproxima-me mais de um formato de canção onde a voz ganha algum protagonismo, um caminho bastante novo para mim.

Como é que o público reage ao espetáculo audiovisual em que se transforma um concerto com a Sara?

Sara Esteves: A música é o foco e a razão principal pela qual o público vai aos concertos de Daily Misconceptions, por isso a maior parte das reacções e comentários são dirigidos ao João enquanto eu arrumo o meu material e vou relaxar (risos). Mas as reacções são normalmente positivas. Apenas dependem muito de eu estar, ou não, em palco. Se não estou, como é o caso dos concertos no Um Ao Molhe (dado o carácter de one man band só o João está em palco), o público não sabe que há outra pessoa exclusivamente responsável pela parte visual - não percebem que há ali uma relação próxima e reactiva - e julgam ser o João ou um vj "da casa” a passar vídeos. Se estou em palco, depois de algum tempo percebem mais ou menos o que eu lá estou a fazer e vêm por vezes falar comigo sobre o concerto. Nestes casos as reacções são bastante positivas ou também carregadas de perguntas.

© Patrícia Pinto

Vai estar em três atuações do Um ao Molhe, em que já participou em edições anteriores. A one man band começa a ter mais visibilidade (e público) em Portugal?

Hoje em dia parece-me que o público e Portugal já estão muito habituados ao conceito de “one man/woman band”. Não é novidade ver artistas sozinhos em palco. A evolução da tecnologia e, subsequentemente, dos instrumentos musicais permite a uma pessoa ter um projecto musical sozinha, sem grandes problemas. O que o Um ao Molhe faz muito bem, é criar uma estrutura para que esses projectos, que por vezes não têm hipótese de tocar em determinadas salas, consigam lá chegar. Assim como, atingir um determinado público. Público novo que não conhece estes projectos, não por serem projectos de “one man/woman band” mas por serem projectos novos com pouca dimensão. O Um ao Molhe dá-lhes a mão e leva-os até ao público.

Que planos há para próximos lançamentos?

Neste momento estou a colaborar com a artista brasileira Bárbara Eugênia para um tema de uma compilação com selo da Bodyspace. Estou também a gravar e misturar uma re-interpretação da peça “Oraison” do Olivier Messiaen que apresentei nas New Old Electronic Sessions da Digitópia Casa da Música, trabalhos brevemente editados em CD. Finalmente, existe um plano ultra-secreto a que apenas cinco ou seis pessoas têm acesso. Este consiste numa nova edição, para o final de 2017, num formato físico e um pouco invulgar… mais não digo.


Simão Freitas
spfreitas25@gmail.com
07/07/2016