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CAXADE
Luzes, Câmara, Acção!


CAXADE é projecto pessoal de Alonso Caxade, um música galego com um olho atento à música da Europa de Leste. Nasceu como um projecto a solo mas depois foi recebendo a contribuição de outros músicos. Manu Paino (trompete e carrilhão), Manu Espinho (bombardino), Xosé Tunhas (bateria) juntaram-se a Alonso Caxade (voz e acordeão) para o lançamento do disco de estreia de CAXADE. A Dança dos Moscas, editado em Novembro de 2013 com o selo da cooperativo Discos da Máquina, é um disco com uma mensagem política, é um grito à acção, um convite à resistência. E um casamento perfeito entre músicas com coordenadas geográficas bastante distintas; uma celebração da diversidade e da universalidade da música. Para saber um pouco melhor como começou a aventura CAXADE, fomos falar com Alonso Caxade e o galego respondeu a todas as nossas perguntas.
Sendo que CAXADE é o teu projecto, fala-me de como começou a tua relação com a música…

O meu primeiro contacto com a música foi graças a tradição musical galega, através da gaita-de-foles. Depois estudei acordeão no conservatório, ainda que a minha maior escola foram os grupos nos que eu tive a sorte de tocar até agora.

Como é que daí chegaste a este projecto?

Há tempo que pensava em fazer algo pessoal, em dar saída a ideias, musicas e letras que tinha guardadas, em construir um projecto diferente pouco a pouco, e que me permitisse desfrutar da responsabilidade do processo que criação em solitário. Com humildade, gosto da ideia de pensar em contribuir a modificar a música folk da Galiza, abrindo uma pequena fenda e criando um novo espaço onde possa chegar novo público.

© Ariel Ninas

Como situarias musicalmente CAXADE?

Acho que CAXADE é folk, mas não no mesmo sentido que essa palavra tem geralmente. Na Galiza o folk está conectado com a música celta e eu acho que deve estar ligada à canção de autor ou canção de protesto, canção do povo e para o povo, como foi na origem. É por isso que as letras falam do que a sociedade actual lhe acontece mas também mantendo um aroma a música popular ou tradicional, para as pessoas que o saibam perceber. Essa mistura e experimentação fazem com que alguma gente nos considere também indie ou pop, e em parte estou de acordo.

O projecto acabou por se tornar numa banda. Foi algo perfeitamente orgânico, foi algo pensado desde o início?

Foi sonhado desde o princípio, mas foi perfeitamente orgânico. Quando eu pensava e criava as musicas, gostava da ideia de apresentar o projecto ao vivo, mas naquela altura ainda não era o momento de o pensar. Apresentou-se a oportunidade de fazer um pequeno show, com umas poucas músicas, as pessoas pediam isso e eu não duvidei que era o momento.

A forma como mostraste os primeiros passos de CAXADE foi algo curiosa. Queres contar-nos como foi?

Pois tudo começou com a publicação no Youtube e mais Vimeo de um videoclipe intitulado "Dança dos Moscas". Os meios técnicos eram diminutos mas a ânsia era grande. Gravei a música tocando eu todos os instrumentos no meu quarto e depois fiz um vídeo com a câmara fotográfica. A seguir vieram outros vídeos "Gente Pota" e "Sr. Xorda", já com a ajuda do câmara profissional Javier Antelo Seoane, ainda que o áudio continuasse a ser o que eu gravava no quarto.

Olhando para trás, e apesar de não ter sido há muito tempo atrás, A Dança dos Moscas era o disco que imaginavas que viesse a ser?

Com certeza. É que não mudaria nada, pois a gravação foi melhor ainda do que eu tinha na minha cabeça. É a sorte de estar acompanhado pelos melhores músicos como são o Manu Paino, Manu Espinho e José Tunhas. Só passaram uns meses desde que estivemos a gravar no estúdio, mas acho que seguirei pensando o mesmo dentro de uns anos.

De onde vem o título?

"A Dança dos Moscas" é uma figura metafórica do que vejo que acontece na sociedade hoje em dia. É tempo de uma crise intelectual (a única que existe, pois a económica é só uma golpada do capital) e isso promove que haja mais pessoas travestidas, moscas a dançar ao redor do seu manjar favorito. Mas, na verdade, esse manjar não é tal, é só para insectos.

© Tânia Ameneiro

Mudando de assunto, achas que hoje em dia, apesar de todas as novas tecnologias e formas de comunicar, e paradoxalmente, é preciso ser-se ainda mais original para fazer a música chegar às pessoas?

Sem dúvida. Na sociedade da informação, é difícil topá-la. A maior quantidade de dados, maior deve ser a selecção que tem que fazer o público, e maior tem que ser o esforço dos músicos por chegar ao público.

Como se pode comprar o disco em Espanha? E noutros locais?

Nesta altura só é possível comprar o disco nas lojas da Galiza, mas estamos a tentar a distribuição fora de aqui. As pessoas de Espanha ou de Portugal, ou de qualquer outra parte do mundo que desejem ter o disco, podem fazer como outras já fizeram, encomendando na internet através do site http://www.alonsocaxade.com.

Sentes que existe dificuldade das bandas espanholas em afirmarem-se noutras regiões? Ou seja, achas que existem de facto várias Espanhas dentro da Espanha e cada uma com a sua linguagem própria – no sentido não literal - e que isso por vezes dificuldade o espalhar da mensagem?

Espanha é um estado com várias nações, entre elas, a galega. A dificuldade vem por ser um estado ferozmente centralizado no qual não se aceitam com facilidade as diferenças e critérios díspares próprios de cada região, não só a nível governamental, infelizmente também no popular. Por exemplo: um grupo da Galiza, que cante na sua língua própria, o galego, tem muito pouca hipótese de sucesso na Espanha. O galego não se ouve no rádio ou na TV espanhola. Além da Galiza, na Península Ibérica só se ouve falar galego em Portugal.

Quanto da Galiza tem este disco?

Acho que muito, tanto que penso que um disco assim não podia ter acontecido noutro lugar. Tem aroma a música popular e tradicional galega, as letras que falam de coisas que acontecem às galegas e aos galegos e usando instrumentos que muitas pessoas identificam como parte da música popular galega.

Li algures que este era também um projecto reivindicativo. O que querem os CAXADE?

Que a gente saia feliz dos nossos concertos, pensando que um outro mundo é possível, com ânsia de conseguir um contexto mais justo e ajustado aos interesses da cidadania e não só aos de uns poucos poderosos aos que chamo "Gente Pota", quem pretendem que percamos a esperança para assim facilitar-lhes o seu interesse pessoal. O trabalho é de formigas, pouco a pouco, em equipa e com tempo por diante. Fazer sempre é mais difícil de desfazer. A "Gente Pota" só pensa em desfazer, por isso obtêm resultados visíveis de modo mais imediato.


André Gomes
andregomes@bodyspace.net
15/04/2014