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Savanna
Metal cósmico


O EP pode conter apenas sete canções, mas a sua ambição é enorme: guitarras às quais se arranca o mais metaleiro dos riffs, sintetizadores antigos nos quais se procura o espaço sideral, uma aura (ou será aurora?) de "estádio" que não é costume encontrar numa banda de cariz independente e uma história inteira - nascer, viver, morrer - que cabe em cerca de vinte minutos. Conclui-se portanto que os lisboetas Savanna não estão com meias medidas; uma vez aqui chegados o intuito é conquistar. Aurora, EP de estreia editado em 2012, consegue para já prender-nos sobremaneira a atenção - como se uma "Magic Fly" entrasse numa "Silver Machine" e sofresse uma mutação genético-musical. Ao Bodyspace, os Savanna - na voz de Miguel Vilhena - falaram sobre esta Aurora e sobre o que se poderá esperar do quarteto para 2013.
Como surgiram os Savanna? Em que momento das vossas vidas se deu o clic e pensaram formar uma banda juntos?

Eu e o Pedro somos amigos desde miúdos, e já desde essa altura que tínhamos vontade de tocar juntos - a verdade é que, sabe-se lá porquê, nunca nos demos bem a compor. Desta vez eu tinha ideias muito específicas relativamente ao conceito e musicalidade que queria para esta banda e achei que tendo um ponto de partida as coisas poderiam finalmente funcionar: dito e feito! Compusemos este EP em tempo recorde em minha casa e fomos para o estúdio refinar o material que tínhamos. Com o disco na mão e vontade de o tocar fomos à procura de um baterista e de um baixista. Eu e o Jimi tínhamos falado várias vezes sobre tocar juntos nuns projectos que tenho arrumados no disco rígido que nunca chegaram a ver a luz; Savanna estava pronto, e era a oportunidade perfeita para colaborarmos. Relativamente ao baixista, fartei-me de procurar até que me lembrei que tinha a pessoa ideal em casa - o Tiago é meu irmão, partilhamos muitos gostos e vivemos juntos, o que facilita as coisas... para além disso é um gajo super talentoso.

Intitular o EP de Aurora, que incita à ideia de “frio” por contraste com Savanna, foi propositado ou nem pensaram nisso?

Não foi bem essa a analogia. O disco fala do percurso de uma vida, sendo que a primeira música representa a origem ou o princípio. "Aurora" significa o crepúsculo matinal; a primeira luz que antecede o dia. No fundo é uma metáfora para o nascimento que é abordado no disco, e também o nascimento da banda, que surge com este trabalho.

Qual foi o segredo para terem conseguido misturar riffs metaleiros com sintetizadores sem que tal soasse a azeiteirada dos anos 80?

As maiores referências musicais que temos datam dos 70's e acho que as nossas melodias vão beber mais a essa década do que à seguinte. Penso que as guitarras mais "metaleiras" de que falas estejam inseridas num ambiente em que não nos habituámos a ouvi-las, daí o todo soar a algo, a meu ver, diferente. Penso que os anos 80, musicalmente, se caracterizam bastante por marcarem o início da era digital, o que não é propriamente a nossa praça. Somos colados em sintetizadores e efeitos analógicos e a minha opinião é que os anos 70 foram a década em que o material técnico era mais carismático. O meu pai às vezes entra no meu quarto e pergunta-me: "para que é que compras esses lixos?", a apontar para um delay de fita ou uma mesa que me ocupa quase o quarto todo... mal sabe ele que estas velharias são maravilhosas! Apesar de tudo não quero tirar crédito ao que foi feito nos anos 80, até porque não deixamos de ter referências dessa década, principalmente de soundtracks fabulosas de filmes lançados na altura. E até te posso dizer que uma das músicas de Savanna, antes de ter nome, se chamava "Azeite"!



No EP as faixas “desaguam” todas umas nas outras, por oposição a serem simplesmente canções soltas que foram posteriormente alinhadas. Deveremos encarar Aurora como uma espécie de álbum conceptual? O processo de gravação foi mais moroso por causa disto?

O objectivo deste EP é contar uma história: começa com o nascimento que precede o vazio e acaba com uma espécie de hino da morte. Queríamos que o percurso entre estes dois acontecimentos fluísse continuamente. Assim, como num livro, existem capítulos marcados mas que nunca são independentes uns dos outros. O processo de gravação foi realmente mais complicado por causa disto. Eu quis gravar o EP sem ter um projecto para cada faixa para poder sentir uma maior fluidez no disco e conseguir entrosar melhor as músicas; acontece que, a certa altura, tínhamos cerca de 150 faixas, o que é bastante pesado para qualquer processador.

Como é que o Moullinex acabou a produzir o vosso EP e, posteriormente, a Pontiaq a editá-lo?

O Luís (Moullinex) tem um talento indiscutível, material invejável, já tínhamos tido uma banda juntos (e agora temos outra vez - The Discotexas Band) e eu tinha vontade de voltar a trabalhar com ele. Com todos estes factores, pareceu-me a escolha acertada, e realmente foi - as sessões de gravação foram super desafiantes e inspiradoras, o Luís é grande BOSS. O Miguel Coelho, que na altura trabalhava na Amplificasom, e eu andávamos a conversar, na altura em que Savanna andava a gravar, sobre nos juntarmos para criar uma plataforma que nos permitisse trazer a nossa visão para a indústria musical; Savanna precisava de uma editora e assim formámos a pontiaq que hoje, para além de editora, é também uma agência e promotora - e em 2013 vai ser muito mais coisas.

Gravaram recentemente um vídeo para “Rise”. Quem teve a ideia do mesmo e como foram acompanhando esse processo? Acham que um videoclip ainda pode ter o mesmo impacto que tinha quando estava praticamente consignado à MTV ou, para todos os efeitos, hoje existe o Youtube?

Eu sempre quis que Savanna tivesse uma forte componente de vídeo - aliás, cheguei a escrever, enquanto ainda estávamos a compor, um argumento de um vídeo para o EP todo mas ficou algo tão complexo que não havia tempo nem dinheiro para dar forma à ideia. Entretanto eu e o Tiago pegámos nas ideias que tinha e fizemos uma espécie de resumo "com os pés na terra". O Tiago estudou cinema e tem noções técnicas muito mais avançadas do que eu, o que nos permitiu conceber um vídeo arrojado mas praticável. Quando andávamos à procura de um actor para assumir o papel do protagonista do vídeo encontrámos o Welket, que tinha todos os elementos que procurávamos, e assim deitámos mãos à obra. Deu uma trabalheira do caraças dar vida a este vídeo... enterrámos um gajo nu, à chuva, durante o inverno, enquanto construíamos abrigos com paus e plásticos para proteger os projectores, e passámos noites no cume da serra do Caramulo e no mato, ao frio, para fazer os time lapses das estrelas, mas no fundo foi tudo muito gratificante e estamos cheios de ideias para outros vídeos. Penso que um clip de uma banda não poderá ter o mesmo impacto que teria na tal "época MTV". Há vinte anos conseguias conhecer quase todos os vídeos que a TV ia passando, ao passo que hoje em dia és bombardeado com tanta coisa nova que é impossível dedicares-te a fundo a conhecer todos os vídeos novos, ainda por cima misturados com "Partobas" e colectâneas de fails com gajos a malhar que te distraem. Apesar de tudo esta é uma época muito mais democrática em que as ferramentas de divulgação estão aí para todos e as oportunidades só dependem da vontade de mostrar. No fundo o que se passa no video é muito semelhante ao que se passa na música. Se me apetecer fazer uma banda de Crust-Pimba, prefiro poder mostrar o clip a um mar de gente que vê e deita fora se quiser do que não poder mostrar a ninguém por não preencher os critérios dum canal de televisão.

Já que uma vez de definiram como nerds do cinema, para que filme gostariam de criar ou ter criado uma banda-sonora?

É uma pergunta difícil, já que a maioria dos meus filmes favoritos têm as minhas bandas-sonoras favoritas e não queria nada substituir o que está tão genial, mas se me pedissem para compor para algo tipo Escape From New York ou o Blade Runner acho que me dava uma embolia de tão feliz que ficava.



Ainda são uma banda relativamente recente. Sentem que após os vários concertos que deram ainda há muito que olear? Existe uma ideia bastante definida daquilo que querem fazer enquanto Savanna, ou limitam-se a seguir o flow?

Há, sem dúvida, muito a fazer. Temos montes de ideias para coisas que queremos mostrar. Penso que temos evoluído bastante desde que começámos a tocar e queremos continuar a crescer. Como a banda ainda é muito nova, aprendemos muito a cada passo que damos. Temos tentado estar atentos ao que é necessário corrigir para conseguirmos definir o que devemos fazer. A verdade é que como gostamos do que estamos a fazer, trabalhar ideias novas e definir caminhos muitas vezes é simplesmente estar a "seguir o flow". Quando acordo a pensar em Savanna não é só por ser necessário estruturar o nosso futuro mas também porque me é algo natural.

O que é que nos preparam para 2013? Alguma informação que possam anunciar em primeira mão?

Posso adiantar que estamos a compor o nosso primeiro álbum, temos montes de ideias para um novo vídeo, e estamos também a preparar uma primeira tour fora de Portugal. Há outras surpresas que para já são segredo mas garanto que vão ser óptimas. Queremos que 2013 seja um ano de alegrias para a banda e para quem gosta da nossa música, e estamos a trabalhar para isso.


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
14/01/2013