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Jibóia
King of Snake


Sssssssssss... nem dá tempo para escutar ao longe o chocalhar da cobra; mal nos damos conta já estamos de tronco nu, a gingar a anca, entregues à mistura de sons que Óscar Silva, sob a designação Jibóia, tem tocado ao vivo um pouco por todo o lado, conquistando um público fiel ainda sem ter editado nada (o que por si só diz muito da força desta nova etapa na carreira do músico, após umas boas temporadas com os Suchi Rukara, I Had Plans e Adorno). Mas isso está para breve: o primeiro EP está quase a chegar, e por enquanto pode-se picar a colaboração com RA na compilação que o Bodyspace elaborou em parceria com a Optimus Discos, bem como o tema único presente no Soundcloud do projecto. Fora isso, terão mesmo de se aventurar pelas selvas fora para ter uma ideia. Mas cautela - uma vez mordidos não terão vontade de outra coisa.
Porquê Jibóia e não Anaconda?

Acho que é por ser mais difícil de escrever. Muita malta pensa que tem um "g". Curto do "j" e do acento no "ó". Anaconda começa com "Ana", não sei... Jibóia é mais forte. Enche mais a boca.

Que podes avançar desde já acerca do EP que está para sair em breve?

O EP vai ser uma coisa muito fiel ao que tenho tocado ao vivo. A ideia era mesmo essa e também sabia que o tempo que iria ter para gravar ia ser curto, por isso o objectivo foi mesmo registar o que se tem andado a passar por aí para poder parar um bocado e organizar/estruturar com mais afinco as novas músicas e ideias que têm surgido enquanto estas andaram a rodar. São quatro músicas, mais uma, que de certo modo é um aperitivo do que vai acontecer a seguir.

© Cláudio Fernandes

É interessante, porque tu tens conquistado público essencialmente através dos teus concertos, não tendo ainda editado nada, quando costuma acontecer ao contrário – banda lança EP/LP, concertos sucedem-se. Pensas em Jibóia mais como um projecto para se dançar ao vivo e não tanto para se ouvir em casa?

Completamente. Aliás, o projecto começou depois de um convite dos amigos Cangarra para ir abrir um concerto deles, não para gravar um disco ou o que fosse. As músicas foram feitas para aquele concerto, nem pensei na altura como é que as ia gravar... Quando gravei o EP cada música tinha perto dos seis, sete minutos. Na gravação a coisa vai andando e não tens noção do tempo que está a demorar até a música chegar a algum lado e por fim morrer. Depois, ao ouvir, percebi que tinha de cortar muito do que ali estava. Acho que as músicas foram feitas para serem ouvidas, sentidas, dançadas ao vivo. Até porque foi mesmo aí que elas se foram construindo, e não tanto na sala de ensaios. Aí faz sentido que as camadas se vão fazendo, que as músicas vão crescendo. Nesta gravação o que está é como se fosse um radio edit. O suficiente para alguém entrar no mood e, se gostar, dançar um bocado. Mas depois acaba logo, tipo coito interrompido. Quem gostou mesmo quer ouvir outra vez. Quem não gostou também não foi massacrado. Mas isto sou eu a divagar, desta vez aconteceu assim, não quer dizer que da próxima não seja um álbum duplo com o mesmo riff repetido à exaustão. Se calhar até é fixe para ouvires em casa a limpar o pó.

Jibóia vai beber a sítios diferentes – ao rock, ao acid, ao noise, até ao kuduro... - sendo praticamente impossível englobá-la num género apenas. Qual considerarias a raiz da tua música, o som que te levou em primeira instância a querer formar algo assim?

Acho que não existe uma raiz única, tal como dizes. O primeiro ímpeto surgiu em conversa com amigos, quando por acaso estávamos numa viagem a ouvir o Omar Souleyman. Pensámos que aquilo era brutal para dançar, e que misturava bem uma data de sons tão díspares que se sente ser uma coisa nova, de certa maneira. O meu caminho na composição das músicas de Jibóia está a ser paralelo ao caminho de descobrir uma data de novos géneros musicais que nunca antes tentei ouvir com atenção. E ao mesmo tempo que estou fascinado com eles e me deixo influenciar pelo que descubro, junto essa busca ao que já cá tinha de bandas por onde passei, sítios que visitei, etc.. É um misto de uma busca por qualquer coisa da qual ainda não se tem todas as peças; então, as peças novas que se vão colocando para tapar os buracos dessas, são as que já cá estão dentro a viver há muito. Uma confusão do caraças, vá.

Quando é que ouviste a Ana Miró pela primeira vez e pensaste «esta miúda tem uma voz incrível»? Tens noção de que essa cover da Gal se tornou basicamente no teu cartão de visita?

Já conheço a Ana Miró há bastante tempo e é verdade que a primeira vez que a ouvi, mais do que achar que tinha uma voz incrível e bastante versátil, disse para mim: «finalmente conheço uma miúda com uma granda voz, e sem medo de cantar só porque sim, até com alguém que nunca tenha visto antes». Desde aí que andamos para fazer qualquer coisa. Não posso falar por ela, mas acho que a experimentação e o caminho de que te falei acima está a ser para mim como está para ela. Estamos os dois a descobrir o que podemos fazer, cada um à sua maneira. E isso é mais que suficiente para às vezes nem ser preciso falar nem decidir nada em concreto. Fazemos sem medos e depois logo se vê. A cover da Gal foi a primeira dessas experimentações: uma cover, de música brasileira (sabia/sei lá eu a fundo o que é música brasileira), a Miró a cantar em brasileiro... foi um ponto de partida. Cartão de visita? Pois, não sei, mas é engraçado: quando os teus pais ou amigos deles te pedem para mostrar a música que fazes mostras esse vídeo, e normalmente resulta bem. Ou não resulta tão mal como se mostrares uma música de Suchi Rukara ou I Had Plans.

© Jorge Vieira

Qual é o teu papel dentro do colectivo Coronado, e quão difícil foi inventar uma malha com o Ricardo Remédio para a nossa compilação?

Na Coronado neste momento sou oficialmente "o empecilho", porque estão à espera que grave uma cover (não posso dizer de quem) há meses e parece que precisam muito disso para uma grande mixtape que vai sair em breve. Vai ser bem bonito, só gente boa a fazer muito que muito boa gente espera que se faça sozinho. Eu gosto muito deles. Tenho pena que estejam muito chateados comigo porque ainda não gravei a música... mas no final vai ficar tudo bem. O Remédio? Não foi fácil, não... o rapaz ainda é mais esquisito do que eu. Mas no fim gostámos tanto que se espera uma colaboração à séria entre os dois. Eu gosto muito dele. Tenho pena que ele esteja muito chateado comigo porque acha que eu não gostei de trabalhar com ele... mas no final vai ficar tudo bem, também.

Qual é o futuro próximo de Jibóia? Que planeias fazer após editar o EP?

Está tudo aí nas entrelinhas. Muita gente com quem vai ser um prazer trabalhar. A seu tempo – um tempo rápido, é essa a ideia – vão aparecer mais gravações, mais colaborações ao vivo e mais gente envolvida. Eu sozinho não consigo. Custa-me muito a carregar os amplificadores.

Para quando uma jam em Hellverca com o grupo de jazz que se tem dedicado a assaltos sonoros no meio da rua?

Não conheço esse grupo dos assaltos sonoros, só o dos assaltos fiscais. Mas a jam é quando quiseres. Também pode ser em Boba Deli. Diz-me qualquer coisa. Queres o meu número?


Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
23/11/2012