Surgidos há vinte anos, a premissa inicial dos Bohrem & Der Club Of Gore era bastante simples: criar uma espécie de "
doom das tabernas", como os próprios assumem, que fosse tanto beber ao peso do metal como à suavidade da música
lounge. Desta união resultaram sete discos e três EPs, o apoio - e a colaboração com - fãs de renome como o é Mike Patton, e a aclamação generalizada da crítica, especialmente em relação a
Sunset Mission, o mais conhecido, e porventura o melhor, dos seus discos. Mas os Bohren não são banda que se escute ignorando, como o parece ser a premissa do som
lounge; é impossível não sentir o medo a trepar-nos pelo pescoço, imagens mentais de uma cidade nocturna a atravessarem-se-nos à frente, um saxofone a puxar-nos para o centro da acção, um assassinato, um jogo de cartas num bar sombrio, uma mulher perdida por bairros desaconselháveis. Antes de actuar pela primeira vez em Portugal, Morten Gass respondeu às perguntas do Bodyspace.
Já deviam ter tocado em Portugal há três anos, mas esse concerto foi, infelizmente, cancelado. Que expectativas têm para o Amplifest, considerando que vai ser a vossa primeira vez por cá?
Para lá do bom tempo? Bem, como disseste será a nossa primeira vez em Portugal, por isso não temos expectativas algumas. Tal como com qualquer outro lugar em que tenhamos tocado. Até na Alemanha acontece o mesmo. Quando tocas num sítio novo, não sabes o que esperar, mas, entre nós, desenvolvemos um pequeno truque: assumimos sempre o pior e, em 99,5% dos casos, acabámos agradavelmente surpreendidos.
A vossa música é tipicamente definida como lounge noir jazz, ou como uma banda-sonora perdida para o Twin Peaks. Que pensam da forma como as pessoas encaram a vossa sonoridade? Que esperavam alcançar quando a banda começou, há vinte anos? Como avaliariam tudo o que fizeram até agora?
Acertaste em cheio. É
lounge/
easy listening, decerto. Mas não temos qualquer problema com isso. Posso dizer, com algum orgulho, que estamos bastante perto da noção de "
doom das tabernas" que nos ocorreu em 1991. A única diferença ou desenvolvimento está no recurso a mais instrumentos e equipamento. Além de que estamos mais treinados, tocamos mais lenta e precisamente. E sim, estamos bastante satisfeitos com o trabalho até agora.
Desde a reedição do Black Earth, em 2004, e excluindo o Geisterfaust, que têm trabalhado com o Mike Patton e com a Ipecac. Que têm retirado deste trabalho com uma figura mundialmente conhecida - e musicalmente eclética - como ele o é? Esta ligação à Ipecac é para continuar?
Isso aconteceu simplesmente porque ele foi uma das primeiras pessoas seriamente interessada em nós. De tempos a tempos convida-nos para tocar em festivais ou concertos que ele organiza com uma das suas muitas bandas, o que também é fixe. E claro, gostaríamos de continuar a trabalhar com a Ipecac. Porque não? Esperemos para ver.
Ele canta numa faixa do vosso novo disco, Beileid (2001), que é igualmente a primeira vez que uma canção num disco vosso tem vocais. Que tal foi esta experiência - não porque era o Mike a cantar, mas porque era a primeira vez que alguém o fazia? Foi uma oportunidade para sair da vossa zona de conforto, por assim dizer, e tentar novas coisas com a vossa música?
A canção de que falas é uma versão, ou, melhor, uma reinterpretação de uma balada
heavy metal antiga de uma banda alemã chamada Warlock. Só isso a torna bastante invulgar no que a nós diz respeito. Os vocais foram necessários porque não queríamos que a canção ficasse completamente irreconhecível. O maior problema foi encontrar alguém capaz de cantar os versos num andamento tão lento, mas isso é outra história...
O Beileid também se distingue porque, com 37 minutos, é substancialmente mais curto que os vossos outros discos, a maioria dos quais vai além de uma hora de duração. O que me leva a duas questões: qual é a história por detrás do Beileid? E, acham que um LP deve ser mais que uma mera "compilação", que deve ter uma história, um tema principal onde se erga, e conter música suficiente para que o público sinta que gastou bem o seu dinheiro?
Chamamos ao
Beileid um mini-álbum ou EP e sempre pensámos que, obviamente, o era. Mas sim, todos os nossos discos têm um tema figurativo. Iria mais longe, diria que todas as canções num disco de Bohren soam ao mesmo. Uma hora de um embalo lento. O que pode ser um grande desafio, pois precisamos de nos restringir e conter tanto. Sob estas circunstâncias, tínhamos algumas canções, ou ideias, que ficariam bem no nosso disco anterior, ou num futuro. Mas tínhamos uma enorme vontade de gravar as que estão no
Beileid. Que deveríamos fazer? Lançámos este mini-álbum para encurtar o tempo até ao próximo disco.
Os Bohren são uma banda muito visual - à medida que se ouve, existe toda uma série de imagens, como uma cidade à noite, ou cenas de assassínios, a surgir-nos na mente, dependendo da imaginação de cada um. Têm algum lugar em particular onde se inspiram, como um bar na Alemanha, ou uma rua, ou até mesmo o vosso estúdio? Como é o vosso processo criativo?
Temos muitos bares na Alemanha que estimulam a nossa imaginação, verdade. E existe uma velha série alemã dos anos sessenta,
Der Kommissar, que nos inspira bastante. Desde que surgiram as leis anti-fumo que comprámos uma máquina de fumo, separadamente, para tentar trazer de volta aquele sentimento de se estar num velho bar com um piano.
Que planos têm para o futuro imediato? Irá haver um disco novo de Bohren brevemente? Em que têm andado a trabalhar?
De momento estamos a trabalhar no disco novo. Já compusemos bastantes coisas, mas ainda não tivemos tempo de as gravar com cuidado. Não sei dizer quando irá estar completo.
Os vossos concertos ao vivo consistem, basicamente, da banda a tocar no escuro. Têm algum conselho para quem tem medo dele?
Ir até ao bar e começar a beber, fumar se for permitido. Isso deve ajudar essas pessoas durante o restante da noite...