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Buraka Som Sistema
A caminho dum som tipo Buraka
Após Black Diamond ter sido objecto de garimpeiros um pouco por todo o mundo, é tempo de Komba (ritual religioso angolano que tem tanto de celebração como de tristeza) abrir um novo capÃtulo e alargar horizontes para aquela que será já a mais internacional das bandas portuguesas da actualidade. São de Lisboa, mas o som que praticam é para todos os que gostam de fazer a festa, em clubes de Luanda ou Budapeste, em concertos no Brasil ou nos Estados Unidos. Com os Coliseus de Lisboa e do Porto a servirem de arranque à apresentação do novo álbum, durante este mês de Novembro, apanhámos os Buraka Som Sistema a meio de intensa actividade promocional. A palavra ao mestre-de-cerimónias Kalaf sobre o presente momento de um grupo que não cria música com o intuito de representar as Nações Unidas da música electrónica, mas sim com a vontade de encontrar algo que seja genuinamente um som Buraka Som Sistema. Fazendo música livremente.
Como correram as recentes datas nos EUA e no Rock in Rio? Houve boa reacção aos temas de Komba?
Os concertos correram bem, é sempre estimulante tocar nos Estados Unidos. A primeira data foi especial porque foi um concerto só nosso, no Echoplex, uma sala emblemática no universo das indie bands . O Treasure Island foi muito bom, tocámos ao fim da tarde, e tivemos um público participativo, como, aliás, tem sido hábito sempre que passamos por São Francisco. O Rock in Rio foi menos memorável mas ainda assim motivo de celebração, dividimos o palco com um dos nossos projectos favoritos, os MixHell, do casal Laima e Igor Cavalera. Mas fomos a primeira banda do dia, abrimos o Palco Sunset às 14:30 da tarde e não tivemos tantas pessoas, mas as que lá estiveram conheciam os temas e foi o suficiente para se fazer a festa. Em todos estes concertos, tocámos quatro temas do novo disco e a reacção foi boa.
Costuma dizer-se que é complicado furar no mercado brasileiro. Vocês gostariam de apostar forte nesse mercado, sendo que têm reforçado a vossa exposição internacional?
Nos adorarÃamos ter uma presença mais forte no mercado brasileiro, mas somos realistas e sabemos o quão difÃcil isso é, logo vai depender dos parceiros que encontrarmos naquele território, para os discos e concertos. O Black Diamond acabou de ser editado no Brasil pela Music Brokers Argentina e vamos ver como as coisas se desenvolvem a partir daqui.
O tÃtulo do novo disco faz alusão a um ritual religioso angolano, celebrado sete dias após o falecimento de uma pessoa. Os Buraka homenageiam ou velam por alguém neste álbum?
Nos créditos do disco manifestámos por escrito os nossos agradecimentos a todos os que estiveram fÃsica e espiritualmente envolvidos na produção do Komba e, claro, dedicamos o disco a todas as pessoas importantes que faleceram durante a nossa existência.
Em que medida as diversas colaborações, vindas de tantos continentes, contribuÃram para o resultado final do disco?
As nossas colaborações respeitam um critério muito simples. Todos os intervenientes estão aqui para completar a canção, para contar uma história e agregar valor de forma estética ou emocional a determinada canção. Não criamos música com o intuito de representar as Nações Unidas da música electrónica, se isso acontecer será sempre mera coincidência. Ao contrário do que aconteceu com o Black Diamond , as pessoas que convidámos para este Komba funcionaram como personagens num guião, escrito e realizado por nós. SabÃamos o que querÃamos de cada uma e fomos buscar, dentro do nosso universo de relações, alguns amigos que pudessem entrar nessa dinâmica.
Colaboração com Mixhell, em “Macumbaâ€; neste tema colaboraram com Igor Cavallera, que fez parte de Sepultura e agora pratica um som de base electrónica. Antes havia um nÃtido fosso entre músicos e públicos de som pesado/metal e de electrónica/dança. Mas cada vez mais isto perde sentido, não é?
Penso que a grande diferença é que a informação circula de forma rápida - sendo assim, quem é curioso consegue beber influências em vários géneros e aplicar naquilo que estiver a desenvolver sem receio de perder identidade. Hoje fazemos zapping com quarenta e tal canais de televisão no nosso televisor lá de casa, ouvimos música em shuffle e temos o mundo à distância de um clique no nosso computador. Acreditamos que isso são os sinais dos tempos.
Existe a presença de um certo triângulo Portugal – Angola – Brasil em Buraka Som Sistema. Pensam que a partir daqui (e também dos restantes paÃses lusófonos) se pode formar uma forte aliança cultural, a dar cartas ao nÃvel musical e não só?
Tudo é possÃvel, desde que haja pessoas – não se fazem revoluções sem pessoas! Em relação a Portugal precisamos pelo menos de mais um milhão de jovens entre os 18 e os 35 anos a viverem activamente aquilo que se cultiva culturalmente nesse espaço.
Angola é um terreno fértil para inspiração? Que músicos destacam em Angola ou são os vossos preferidos? Destacam algumas influências musicais vindas de Angola para lá do kuduro?
Não é simples identificar quais são os músicos favoritos, mas ouvimos sempre os clássicos do Semba, assim como a nova geração que impôs um toque urbano àquilo que consideramos ser a música popular angolana.
Como olham para os tempos que se vivem actualmente em Angola?
Olhamos com atenção e até uma certa apreensão; o progresso é sempre positivo, mas há que fazer com cuidado e não esquecer que existem pessoas e algumas delas não conseguem correr tão depressa. Angola é uma jovem nação, com um passado conturbado, é preciso dar tempo para que se encontre o equilÃbrio desejado.
Voltaste a Angola em 2007, após uma ausência de doze anos. Que diferenças ou principais traços de evolução tens sentido desde que saÃste de lá até aos dias de hoje?
A minha relação com Angola é umbilical. Poderia estar aqui a desfilar uma série de aspectos negativos e positivos, mas no final do dia isso pouco interessa porque para mim as nações são feitas de pessoas e naquele lugar estão algumas de que gosto muito. Dificilmente faria uma análise objectiva sem cair em lamechices. Prefiro apenas dizer que estamos a caminhar para uma situação melhor.
O som do single “Hangover†retoma o impulso quase primordial de outras músicas, como “Yah†e “Kalembaâ€. Os álbuns de Buraka apresentam muito este balanço entre uma certa sofisticação (tecnológica e não só) e um apelo primitivo, mais cru…
O tema “Hangover†não foi criado para resgatar nada que tenhamos feito no passado. Há em nós a vontade de caminhar para o futuro e encontrar algo que seja genuinamente um som Buraka Som Sistema. Com este tema querÃamos voltar aos clubes; quem esteve presente no Clube Mercado e nos viu a tocar naquela cave sabe que existe um lado cru e visceral no nosso som – esta canção vai buscar a essas emoções e claro, aponta para o futuro.
Neste disco ouve-se uma panóplia enorme de ritmos – o kuduro é cada vez mais uma base para vocês partirem tudo, avançando por outros caminhos?
Muito dos nossos temas não começam com um loop de Kuduro; hoje preocupamo-nos mais em dar aquilo que a canção precisa, independentemente do género em que depois se vá arrumar ou classificar determinada canção. Não tentamos “kudurizar†os nossos temas só porque sim - fazemos música livremente.
Em “Hypnotized†ouve-se um excerto, digamos, “adulteradoâ€, do actual hino português. Por alguma razão em especial?
O hino está ali para servir de intro ao tema “Lol & Popâ€, que é a música que fizemos a reflectir sobre a forma como somos vistos em Portugal. É uma sátira aos comentários que ouvimos sobre o conteúdo das nossas letras, sobre as sonoridades que abraçamos. Achamos piada a algumas coisas, outras sentimos que não têm graça nenhuma e decidimos manifestarmo-nos sobre o assunto.
Vi-vos dizer numa entrevista que criam música para o público que mais downloads faz na internet e que actualmente o disco serve principalmente para promover o trabalho dos artistas, ou seja, que não é por aà que se faz dinheiro. Como é que olham para todas estas mudanças que a indústria musical atravessa, muito devido à internet?
Tentamos viver com isso da forma mais saudável possÃvel. A internet é benéfica e nociva ao mesmo tempo. Penso que o que precisamos ter ou alimentar nas pessoas é um pouco mais de bom senso.
Podem dar alguns pormenores sobre a after party que vai acontecer após os concertos dos Coliseus?
Muita festa e celebração!!
Hugo Rocha Pereira hrochapereira@bodyspace.net
07/11/2011