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Oneohtrix Point Never
Interstellar reverb
Se, por um lado, não deixa de ser verdade que esta tendência recente para o aparecimento de cada vez mais projectos interessados em filtrar a sonoridade dos sintetizadores analógicos através da estética DIY vingente começa já a trazer alguns dissabores, não deixa de ser também facilmente constatável o papel de esteta de Daniel Lopatin em tudo isso. Longe do mero pastiche , Lopatin tem vindo enquanto Oneohtrix Point Never a musicar os sonhos difusos de qualquer pessoa que tenha crescido na década de 80. Entre referências subliminares à cultura popular, a conceitos pré-cognitivos ou ao conceptualismo low cost , tem vindo a trilhar um percurso personalizado cada vez mais notório. Numa pausa da tese de mestrado, conseguiu responder-nos a algumas perguntas, agora que se prepara para a estreia em palcos portugueses no próximo dia 24 de Abril na Galeria Zé dos Bois.
A tua música está definitivamente impregnada em sentimentos de nostalgia e evoca memórias refractadas da cultura popular dos anos 80. Tendo em conta esta ideia, qual a tua posição em relação à definição de Hypnagogic Pop?
Julgo que os crÃticos musicais são calados por fãs e músicos, mas não vejo necessariamente nada de hipócrita na música, está sempre ligado a modos de a pensar. Basta olhar para o design da tua loja de discos habitual. Os anos 80 foram um Renascimento tecnológico para as artes; tudo aquilo que a música de dança e pop é hoje reflecte as mudanças paradigmáticas dessa altura. O meu interesse na música dos anos 80 é bem menos nostálgico do que se poderia pensar; é mais antropológico. Aquilo que me entusiasma acerca da Hypnagogic Pop é o modo como ilustra que toda a música tem um potencial psicadélico, não apenas a “música psicadélicaâ€
Quais são, então, as tuas influências principais? O que te levou até música inspirada pela kösmiche / new age / sci-fi?
Algumas das coisas de que gosto são discos de Jazz fusão com grande predominância de sintetizadores dos anos 70 e 80, Bach, DJ Premier, Sun Ra, Alice Coltrane, RZA, Peter Gabriel, JD Emmanuel, Nuno Canavarro, Cocteau Twins, Nic Raicevic, Oval, Sunn 0))), Haroumi Hosono. Adoro sintetizadores, por isso é natural que gravite em torno de discos orientados para eles.
A tua música é conscientemente desenhada para reflectir as ligações subliminares que se estabelecem entra a cultura popular e a mais underground.
Por vezes. Por outras tento fazê-lo propositadamente e falhei. É como tudo na verdade; tentas ao máximo fazer algo de que te possas orgulhar. Intelectualizá-la é usualmente um ponto de partida ou um um pensamento à posteriori , e pode frequentemente iludir. Mas, enquanto a estás a fazer, está apenas a fazê-la.
O teu projecto Games é particularmente enfático nessa ligação e mais próximo da estrutura de uma canção. Qual a motivação por detrás disto?
Games é uma equipa de produção. Queremos trabalhar com estrelas pop dar-lhes o tratamento Games. A motivação primordial é fazer a música mais viciante possÃvel.
O que acreditas que levou a uma mudança de paradigma de projectos de noise sem referências à cultura popular (e grande parte das vezes insurgindo-se contra esta) para toda esta celebração do seu lado mais trashy ? Acreditas que poderá ser uma questão geracional?
Existia muito em jogo nos anos formativos do noise. Era uma guerra. Talvez ainda o seja, não faço ideia. Julgo que se deve ao aborrecimento. Muitos dos meus amigos cansaram-se de erguer o punho cerrado ao som de noise O TEMPO TODO. É agradável de modo doseado ou quando és um adolescente reprimido fÃsica e sexualmente. Mas a partir de um determinado ponto olhas em volta e vês que existem outras opções. Tecnicamente, não existe nada de errado com um género musical, mas o noise torna-se estranho para mim no seu modo didáctico de excluir tudo o resto. Incluir tudo é muito mais divertido.
Uma das definição que usei para a tua música foi pré-IBM, na medida em que parece preceder a construção em computadores, mas sendo ao mesmo obcecado com as suas possibilidades. Acreditas num vazio latente entre música mais analógica e aquela gerada por computadores?
Essa é uma bela definição, especialmente quando penso em faixas como “Pshysical Memoryâ€, que é uma referência directa ao armazenamento de um disco rÃgido...mas, sim, mesmo quando estou “fora da rede†/ a não usar sequenciadores mas, ainda assim, a trabalhar elementos de ritmo no tempo, sinto que estou a sugerir automatização sem que esta seja concretizada. Gosto de potencial e espaços intermédios e momentos de confusão dialéctica. Gosto de tudo aquilo que tem que ver com salas de espera ou purgatórios.
No processo de composição, tendes a procurar por um lado mais cerebral ou procuras uma certa ressonância emocional? Sentes que esta, está firmemente enraizada numa determinada conjectura?
Acho que são uma e a mesma coisa. Não sei onde um começa e o outro acaba. Não consigo discernir claramente aquilo que se está a passar comigo enquanto estou a compor. Estou apenas a experimentar e a divertir-me a ver se coisa resulta.
Betrayed in the Octagon , Russian Mind e Zones Without People parecem estar subordinados a um conceito particular. Poderias clarificar os conceitos de cada uma?
O primeiro disco (Betrayed in the Octagon era sobre o meu afastamento de música composta com a ajuda de muita edição de computador e começar a tomar contacto com a música de sintetizadores analógica enquanto experiência holÃstica. Não queria que as tecnologias modernas mitigassem. Queria voltar atrás no tempo e entrar em contacto com os meus instrumentos antiquados como um modo de fazer reset a mim próprio. Os sintetizadores pelos sintetizadores. Octagon é uma suite de noise espacial que consiste em duas longas peças drone e alguns temas estranhos para a depressão cósmica. É também um álbum tributo ao John Carpenter e ao Danny Wolfers, que ambos uma grande influência.
Zones Without People continua onde Octagon acabou (tipo o segundo Halloween a dar seguimento ao primeiro), mas para mim é mais terreno. Utilizei conscientemente influências new age, noise e formatos mais académicos de música sintetizada como que para contar uma história pan-canónica da música de sintetizadores. ZWP ainda está algo entranhado no sentimento dos “sintetizadores pelos sintetizadoresâ€, mas já luta para fazer colapsar todos esses géneros de música de sintetizadores numa só super viagem.
Russian Mind é acerca de integrar tudo aquilo que aprendi nas minhas viagens pelo tempo, e trazer de volta a edição em computador como um modo de chegar a termos depois de seis anos a fazer música. Para mim, é o mais pessoal, e surgiu de forma orgânica.
Sentes que estes discos podem ser unidos de modo coerente em Rifts ? Como se partilhassem algum tipo de ligação?
Acho que essa ligação sou eu, o meu gosto e o modo como componho e edito.
Quais os teus próximos lançamentos?
Tenho álbum para sair na eMego em Junho chamado Returnal . E estou a compilar uma antologia de echo jams em CDR na Upstairs. Também devem sair entretanto dois splits de 7†e 12†com Gatekeeper e The Magic State.
Bruno Silva celasdeathsquad@gmail.com
12/04/2010