Os Bildmeister, formados em 1997, estão de volta com o lançamento do single
Here Alone, que antecede o primeiro álbum de originais que será lançado ainda este ano.
Explay deu-nos a conhecer a banda de Vila do Conde e deixou ficar uma espécie de promessa rock. Seguiram-se os concertos (muitos, mais de trinta) e a cada vez mais segura definição do caminho a seguir, a preparação das rotativas pois dizem que "
as paragens servem apenas para recomeçar". Os
manos Hugo e Gil Ramos falaram-nos dos primeiros tempos da banda, da ligação ao cinema, do processo de criação, de
Explay e dos planos futuros. Tudo em nome do
live act with analog rock.
Da
gravação de cassetes até aos dias de hoje, como cresceram
os Bildmeister?
Acima
de tudo, cresceram...nunca tivémos muitos apoios: a família olhava sempre
com desconfiança para estas coisas; tudo o que temos e fizemos sempre
dependeu do esforço da banda, colectivo e individual. Por exemplo, todo
o material que temos foi comprado com o dinheiro dos concertos e com o investimento
pessoal que cada um, à sua medida... podia. Os concertos também
nunca davam muito dinheiro... mas mesmo assim fomos acumulando material e acima
de tudo... experiência. Quando começámos quisemos logo gravar:
como não tínhamos dinheiro para estúdios, gravámos
dois temas com um gravador de cassetes no meio da sala de ensaios, e como continuávamos
a não ter dinheiro, utilizámos a colecção de jogos
spectrum como suporte! E foi assim; dois temas e um jogo spectrum do lado B
da cassete!... Desde então fomos crescendo, tornando o nosso som mais
consistente e agressivo, mais experimental e menos pop e menos disperso. Com
o acumular de anos a tocar juntos, começámos a definir metas –
mesmo que com prazos alargados – e a tentar chegar lá: mais concertos,
mais discos, e acima de tudo, um prazer enorme a tocar.
Acho que nos estamos a divertir mais do que nunca, se bem que com a consciência
de que as coisas são para ser levadas a sério.
As
comparações a Sonic Youth, Ride ou My Bloody Valentine são
habituais por toda a imprensa. Foram estas bandas que ajudaram a definir o tipo
de som que praticam?
As
referências surgem sempre. É uma forma de ver as coisas. Para nós
é irrelevante pois nunca pensamos em recriar o som de alguém.
No entanto, ouvimos muita música, fomos crescendo a ouvir certas bandas e podíamos
mencionar dezenas delas... acho engraçado nunca ninguém ter falado
dos Ramones, pois já tocamos dezenas de temas deles!... O som ‘Bildmeister’
surge quando estamos os quatro a tocar; se falta alguém deixa de ser
a mesma coisa. Criamos de forma democrática, que rapidamente se torna
anarquista, com golpes de estado, pois quando não chegamos a um consenso
o melhor é fazer como o tema do
Explay “Only Stop To Start Again”
... Pára-se e começa-se de novo para não nos chatearmos muito.
Mas sobre influências na nossa música, as coisas tornam-se divertidamente
interessantes quando nos apontam influências de bandas que desconhecemos
por completo! É sempre um bom motivo para descobrir coisas novas...
As
vossas canções alternam entre faixas instrumentais e temas com
voz. Como é que acontece o processo de decisão da estrutura dessas
mesmas canções?
Bem,
tudo começa sempre pelo lado instrumental... alguém que traz alguma
coisa de casa... Ã s vezes acontece quando estamos a ensaiar e um desvio
qualquer leva-nos até coisas novas... quando algo se precipita e ganha
forma de um tema mais elaborado, então trabalhamos a parte instrumental;
se ficarmos satisfeitos apenas com a intensidade melódica da composição,
a voz torna-se redundante ou desnecessária... mas temo-nos esforçado
por colocar vozes nos temas. Quanto mais não seja para dizer o que não
conseguimos dizer com guitarras...
Os
Bildmeister são mesmo os "Mestres da imagem"?
Mestres
da Imagem... o nome da banda tem origem numa televisão de uma marca
conhecida (Siemens), que era muito popular nos anos setenta, oitenta... acho que quase toda
a gente já teve (ou tem) uma Bildmeister em casa... nós fazemos
colecção! As imagens e os seus mestres sempre foram fonte de inspiração:
o cinema, a televisão, o próprio objecto que é a televisão
foram motivos significativos no processo de criação sonora, visual
e estética... não seremos os “mestres da imagem”...
tentamos, através da nossa acção, criar espirais sonoras
que suportem as imagens que cada um poderá ver ao ouvir-nos...
A
música dos Bildmeister esteve, desde sempre, relacionada com o cinema.
Acham que a música dos Bildmeister é cinematográfica? Como
surgiram essas ligações?
O
festival de curtas de Vila do Conde é um dos responsáveis pela
aproximação real ao cinema; quase todos os ‘Bildmeister’
já colaboraram (ou colaboram) com a organização do Festival.
Assim, em 2001 surgiu o convite para sonorizar uma curta de Charles Bowers.
Chama-se “Egged On” e foi realizada em 1926, um filme mudo. Era
um filme com muita piada, e fomos colando-lhe pedaços sonoros do nosso
universo e colorindo as cenas com intervenções muito livres. Por
vezes estávamos a fazer algo que podia ser rock, pós-rock, pop,
jazz, surf, tudo! Fomos criando em função das emoções
que o filme reflectia.
Em 2002, repetimos a experiência com o projecto “Vintage Heroes,
Analogue Monsters”: é um conjunto de quatro curtas que exploram um universo
de monstros, dinossauros, tarântulas mutantes, louva-a-deus gigantes...
muito serie B, muito divertido. Neste filme-concerto fomos muito mais rock,
mais Bildmeister. É uma oportunidade para ver a Rachel Welch vestida
com peles minúsculas e presenciar a primeira aparição de
sempre de Clint Eastwood no cinema!
A nossa música pode funcionar como banda sonora pois tocamos coisas mais ou
menos simples, mas intensas, o que colocando essa carga sonora ao lado de determinado
contexto visual poderá resultar num boa conjugação.
Existe
em Portugal, cada vez mais, mercado para bandas como os Bildmeister. Acreditam
na existência de uma cena indie no nosso país?
Acho
que sim. A Bor Land é o expoente dessa nova cena. Sem dúvida alguma.
Veio preencher um espaço que se esvaziou... e que fazia falta. Um bocado
como quando começámos – e ainda numa fase mesmo embrionária
– existiam bandas e editoras que ocupavam esse lugar: do Algarve à
Póvoa de Varzim, havia pólos de actividade indie, que se foram
esgotando, provavelmente por cansaço face às dificuldades de edição
e distribuição. Hoje parece que a cena, ou melhor, a actividade
indie está retomada. A facilidade de meios para produzir coisas - discos,
revistas, fanzines, sites, blogs, etc. – torna a criação
mais acessível e directa.
Participaram,
várias vezes, em festivais organizados pela câmara de Vila do Conde.
Sentem apoio da cidade onde os nasceram?
Sim,
temos contado com o apoio da câmara. Tem sido importante... mas também
porque temos correspondido com seis/sete anos de actividade constante e crescente.
Gostávamos de ver mais bandas e pessoas de Vila do Conde a fazer mais;
valor pensamos que existe, falta talvez um pouco mais de perseverança
e paciência. Vamos tentar ajudar outras bandas – através
da Switch On Records – e estamos a começar a fazê-lo com
os The Brights e The Electric Vulva... desde que os projectos sejam interessantes,
vamos tentar ajudar.
Explay
é, obviamente, um marco importante na carreira da banda. O que mudou
com o EP de estreia?
Muita
coisa. Muito mais exposição que até então, para
começar; muitos mais concertos; uma resposta real ao nosso trabalho com
as pessoas a comentarem o disco e o nosso som; ouvir crÃticas; ouvir bocas;
ouvir elogios; ouvir tudo; assumir o nosso trabalho e tocando muitas vezes com
cachets que não cobrem despesas de deslocação mas mesmo
assim tocar, mostrar o nosso trabalho e tentar atender a todas as solicitações.
Nós também mudámos: tornámo-nos mais livres e seguros, mais soltos,
mas também conscientes das responsabilidades que a edição
de um disco implica.
Mais
recentemente, a banda foi apoiada pelo Rodrigo Cardoso. Como é a relação
com a Bor Land?
É,
acima de tudo, uma relação apoiada na vontade de fazermos coisas.
A Bor Land foi um exemplo e ajudou-nos de forma crucial no crescimento que tivémos
como banda nos últimos dois anos. Quando entregámos o “I only stop
to start again” para a colectânea
Your Imagination não fazíamos a mínima ideia do que ia acontecer. A reacção
ao tema foi muito boa e isso criou uma motivação acrescida para
criarmos e arriscar mais. Sobre o
Explay quisémos ser nós
a fazer, mas penso que a Bor Land também o poderia ter editado. Mas quisemos
experimentar tudo o que é editar um disco. Tratar de estúdios,
licenças, fábricas, CDs e fotolitos, tudo! ...Cometer erros e aprender,
para que no futuro soubéssemos tudo o que é isso de editar, sem
falhas de linguagem. Contámos com o apoio ilimitado da Bor Land e do Rodrigo,
bem como de outras pessoas que nos ajudaram imenso em todas essas questões.
A Bor land é co-editora do novo single
Here alone, vamos
editar o álbum e temos ainda para este ano outros projectos de colaboração.
Em
que condições surge a criação da Switch On Records?
Foi
como já disse sobre o
Explay: a vontade de editar o nosso
primeiro disco, de aprender a fazer esse processo.
Explay surge
da ideia de
experimental play, ou seja a nossa primeira experiência mais
séria de edição (para além das cassetes e edições
caseiras) e todo o gozo em o fazê-lo. Em montar capas de discos e colar um autocolante
a dizer “
Switch On Records proudly presents: Bildmeister. Explay”.
Foi gratificante experimentar todas essas coisas. Agora, a Switch On Records
pensa em alargar essa experiência a outras bandas, provavelmente aquelas
mais locais (de Vila do Conde) desde que as propostas sejam boas e que encontremos
motivos de interesse.
O
que é, então, para vocês um "live act with analog rock"?
Hum...
é um concerto dos Bildmeister!
Acabam
de lançar o single "Here Alone". O que é que podemos
esperar em termos de sonoridade?
As
guitarras dominam, agora de forma ainda mais expressiva e agressiva. Não
vamos mudar muito na nossa forma de criar, mas as últimas experiências
tornaram-nos mais confiantes, mais soltos.
Esta
é inevitável. Quais são os planos para o futuro?
Para
já, o álbum!
Estão
em fase de gravação desse mesmo álbum de estreia. Como é
que está a decorrer o processo?
Estamos
a gravar: temos um conjunto de temas já definidos e gravados e outros
que estão numa forma mais básica, que vão conhecer desenvolvimentos
à medida que as coisas ficam prontas. Como temos o nosso próprio
estúdio, temos liberdade para experimentar. Mas achamos também
que estamos à espera de que tudo esteja mais próximo do resultado
final para pensar no título do álbum, na sua orientação
gráfica e esses detalhes todos... não podemos fazer as coisas
de forma desassociada; estamos a apurar o trabalho para que o disco tenha significado
e não seja apenas um conjunto de temas.