ENTREVISTAS
Território
Plano de ordenamento sonoro
· 16 Ago 2007 · 08:00 ·
Com pouco tempo de vida, os Território são um dos novos projectos nascidos e criados na área do Porto. Pelas faces que demonstram, pertencem também ao lado mais periférico da música portuguesa. Tiago Ferreira (ex-Veados Com fome, entretanto extintos) e Rafael Oliveira uniram esforços para criar um duo explorador de electrónicas fugidias que recebem depois elementos vários (guitarras, percussão, ente outras coisas). Do concerto que deram na Casa Viva, no Porto, ficou a gravação que funciona como aperitivo das explorações da dupla, mas existe já a vontade de avançar para um registo de "estúdio". Em entrevista Tiago Ferreira e Rafael Oliveira revelam essas e outras intenções.
Uma pergunta básica mas necessária. Como é que começaram os Território? Tiago, tu já tens os Veados com Fome, mas o Rafael, tanto quanto sei, não tinha nenhum projecto musical… Estou certo?

Tiago Ferreira: Pequeno à parte, os Veados com Fome já não existem.

Rafael Oliveira: Mas enquanto existiram foram grandes. Eu nunca tive nada sério enquanto membro de um projecto musical mas há alguns anos comecei a actividade de DJ e desde então, umas vezes mais regularmente que outras, é o que tenho feito.

Estes territórios por onde vocês se movem foram alvo de muita pesquisa e muitas sessões de improvisação ou foi algo que saiu naturalmente?

T.F.: Bem, nós tivemos uma primeira tentativa ainda com um outro elemento, o Carlos de DOPO, mas as coisas não estavam a sair lá muito bem e entretanto ele teve de deixar de ensaiar connosco. Por isso decidimos fazer a coisa mais livre que conseguíssemos, e começamos a improvisar, foi mais ou menos assim que nasceu o som que andamos a fazer agora. É muito mais confortável chegar à sala de ensaios e decidir na altura o que vou fazer nesse dia, não estar preso a um instrumento, a um ritmo, a um som.

R.O.: Depois de estarmos reduzidos a dois elementos os ensaios tornaram-se bastante mais descomprometidos, às vezes a única coisa que dizíamos um ao outro era “olá” quando chegávamos e a seguir começávamos logo a tocar. Mais natural do que dois ensaios antes do primeiro concerto não pode haver acho eu.

Como foi o concerto de estreia na Casa Viva? Ficaram contentes com o resultado dessa actuação, que colocaram posteriormente na vossa página?

R.O.: Por acaso já tínhamos tocado antes, na Galeria Imerge em Sta. Catarina. Ambas as actuações foram bastante satisfatórias, correram como os ensaios, as coisas saíam naturalmente, íamos experimentando sonoridades que se encaixavam umas nas outras e se algo soava bem aguentávamos um bocado esse ritmo e trabalhávamos a partir daí.

Por aquilo que têm tido a ocasião de perceber, os Território serão sobretudo uma banda de tocar ao vivo ou um projecto para lançar discos? Têm já essa noção?

T.F.: Espero bem que seja uma banda para tocar ao vivo, quantas mais vezes melhor.

R.O.: Gostava de tocar ao vivo tanto quanto fosse possível. Se pudermos também captar em disco o que estamos a fazer num dado momento e essa gravação for fiel, óptimo.


Li no texto que foi escrito para esse concerto que o som faz-se de “faixas longas e diferentes” que “nascem e morrem numa batalha de texturas e camadas”. Existe realmente esse “confronto” quando fazem música?

R.O.: Creio que sim, o Tiago dedica-se mais à parte analógica e eu estou atrás do computador. Existe uma complementaridade entre as bases electrónicas e o que depois lhe adicionamos, quer seja percussão, guitarra ou voz. É engraçado ver como é que uma batida 4/4 construída num computador interage com um loop de voz ou uma guitarra cheia de efeitos.

Que tipo de discos ou de bandas podem ter influenciado directamente os Território?

T.F.: Temos falado recorrentemente disso, eu ouço cada vez menos música, ou melhor ouço o que me passam para a mão ou coisas antigas que tinha, música nova é demasiado requisitante para mim.

R.O.: Tecno. Essencialmente é isso que eu ouço. Desde há dois anos para cá que desenvolvi um fascínio pelo Tecno e tenho ouvido e coleccionado tudo o que posso dentro desse género musical.

Outra pergunta inevitável. Há algum lançamento em CD-R ou numa netlabel na calha ou pretendem que o “disco” do concerto da Casa Viva seja o vosso disco de estreia?

R.O.: Para já não há nada em concreto. Apenas a “vontade de”. A gravação da Casa Viva que está na internet é apenas isso, uma gravação ao vivo que serviu para dar a conhecer um bocado da nossa sonoridade aos mais curiosos.

Esta é uma boa altura para se criar uma banda deste tipo no Porto e em Portugal?

T.F.: Nós na verdade agora até somos de Santo Tirso, mas talvez haja neste momento uma maior abertura às coisas que fazemos, mas mesmo assim, qualquer altura é uma boa altura para fazeres o que gostas, acho que é mais essa a nossa postura.

R.O.: Existe sem dúvida uma movimentação maior de pessoas disponíveis, quer para organizar concertos, quer para criar coisas mais desalinhadas.

Eu sinto isso mas pergunto-vos. Sendo os Território uma banda do Porto, é melhor viver na cidade agora do que há, digamos, 3 anos atrás?

T.F.: Lá está, há mais gente a sair com os projectos para concertos, e talvez a trazer mais luz para abordagens menos convencionais da música, isso só pode ser positivo.

R.O.: Em termos de novos projectos acho que agora há uma maior disponibilidade para experimentar novas abordagens, quer por parte de quem cria quer por parte de quem consome e daí só podem sair coisas boas.

Actuaram recentemente na Galeria Zé dos Bois, em Lisboa. A ZDB é realmente uma espécie de casa de baptismo para o tipo de bandas que em Portugal fazem este tipo de som? Sentiram alguma espécie de pressão extra?

T.F.: Eu não, felizmente tenho podido tocar muito, diverti-me bastante como sempre, apesar de que em Lisboa sinto sempre o público gelado, calculista, avaliador, as pessoas não se deixam muito ir, ou eu é que sou da província…

R.O.: A ZDB é o ponto nacional de passagem obrigatória para as bandas que se movem pelas mesmas sonoridades que nós. Até porque ainda não existem assim tantos sítios para tocar e havendo um que se dedique quase exclusivamente a estas abordagens é sempre simpático poder lá ir tocar. Quanto a pressão, nem por isso, bastante tranquilo.
André Gomes
andregomes@bodyspace.net

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